A história do motor mundialmente conhecido e respeitado de quatro cilindros horizontais contrapostos (boxer), e arrefecido a ar, coincide com a história do Fusca. É uma história confusa e repleta de obstáculos que culminou com o lançamento do KdF-wagen, hoje nosso conhecido e querido Fusca. Em 1930, o Prof.. Dr. Engenheiro honoris causa Ferdinand Porsche começou as suasatividades no seu escritório de consultoria e projetos automobilísticos na cidade de Stuttgart, na Alemanha. Em 1931 recebeu uma encomenda da fábrica de motocicletas da Zündapp, interessada na fabricação de um carro popular de grande produção. Porsche, admirador dos carros checos Tatra, desenvolveu um projeto semelhante: linhas aerodinâmicas e compactas e motor traseiro arrefecido a ar.
Mas por falta de dinheiro, a Zundapp logo desistiu do projeto e imediatamente depois a NSU fez a mesma proposta. Porsche aproveitou a mesma ideia que foi alterada, principalmente, no motor: em vez do cinco-cilindros radial oriundo de aviões proposto pela Zündapp, pediu uma motorização mais simples para o carro popular. Da mesma forma que a fábrica de motocicletas, a NSU também não tinha capital para a produção do tal carro, que assim como Zündapp, o NSU não passou da fase de protótipo. É importante salientar que a depressão econômica havia passado de americana, iniciada com a quebra da Bolsa de Nova York em 24 de outubro de 1929, a mundial.
Em 1934 surgiu a proposta do governo alemão: Hitler queria um carro popular que fosse acessível ao trabalhador alemão. E, para isso, colocou alguns objetivos que o carro deveria alcançar: transportar dois adultos e três crianças, deveria ter velocidade máxima e permanente 100 km/h e seu consumo de combustível em condições favoráveis deveria ser de pelo menos 13 km/l.
Nesse momento, foi fundamental a criatividade do engenheiro Franz Xaver Reimspiess: para atingir os objetivos exigidos por Hitler, ele concebeu um motor de um litro (985 cm³, 70 x 64 mm), 4 cilindros horizontais contrapostos, arrefecido a ar de 20 cv baseado em um motor aeronáutico simples e resistente criado pelo próprio Porsche em 1909. Esse foi o ponto de partida do valente motor que conhecemos hoje e que fez história mundialmente. Primeiro foi nos veículos de movimentação de tropas na Segunda Guerra Mundial, um terrestre e outro anfíbio, depois nos valentes Fuscas do pós-guerra.
Mas esse motor começou sua vida, de fato, com 1,1 litro e 25 cv (1.131 cm³, 75 x 64 mm), para em 1954 passar a 1.2-litro e 30 cv (1.192 cm³, 77 x 64 mm).
E esse mesmo conceito do motor assombrou o mundo nas pistas de corrida propulsionando os esportivos que levavam a marca Porsche a partir de 1948, começando por um motor reduzido para 1.086 cm³ (73,5 x 64 mm) para se enquadrar na classe de cilindrada 701-1.100 cm³ nas corridas e ralis. Como dois carburadores, desenvolvia 40 cv. Esses famosos esportivos, começando pelo 356, foram criados pelo seu único filho homem, Ferry Porsche, que iniciou sua vida profissional no escritório do pai aos 21 anos..
O sucesso dos motores “a ar” deve-se principalmente a sua simplicidade construtiva, grande resistência mecânica e também a flexibilidade de tudo que é possível fazer a partir de sua ideia básica dos cilindros contrapostos arrefecidos a ar. Aqui no Brasil, esses motores começaram a chegar nos primeiros Fuscas em 1950 e logo ganharam a simpatia popular principalmente pela manutenção fácil e de baixo custo. Mas desde a chegada das primeiras unidades e com o passar dos anos, se enaltecia muito o fato do carro não quebrar e que seu pequeno motor ser econômico e durável, além de não possuir radiador, bomba d’água, mangueiras e outros equipamentos que davam dores de cabeça aos carros americanos e europeus que compunham nossa frota de veículos.
Depois de 24 anos de produção (1940-1964) o motor foi substituído por uma nova geração, com várias mudanças sendo a mais visível o suporte do dínamo ser aparafusado à carcaça em vez de integrado à metade direita dela. Não havia nenhuma peça em comum com o motor anterior. Continuou a cilindrada de 1.192 cm³, mas com 34 cv em vez de 30 cv, mas se abriu a possibilidade de cilindrada mais altas como 1300/38 cv (1.285 cm³ , 77 x 69 mm), 1500/44 cv (1.493 cm³, 83 x 69 mm), 1600/50 a 54 cv (1.584 cm³, 85,5 x 69 mm) e 1700/68 cv (1.679 cm³ , 88 x 69 mm).
O novo motor 1300 foi lançado no Fusca 1967, batizado na época de Tigre e que em sua propaganda se apresentava como um comportado Fusca que visto por trás tinha um rabo do felino. Essa nova família de motores foi utilizada em diversos modelos, inclusive no esportivo SP2 (1700) e na Kombi., chegando a ter injeção eletrônica no ano-modelo 1998, necessária para atender aos novos limites de emissões da Fase 3 do Programa de Controle de Emissões por Veículos Automotores (Proconve). Sua potência era de 58 cv a gasolina e 67 cv a álcool, ainda não havia o motor flex.
Seu último local de produção foi o Brasil, no final de 2005, quando a Kombi passou a ser propulsionada pelo motor EA-111 1,4-litro de quatro cilindros em linha, necessário pelos novos limites de emissões.
Mas, sem dúvida, esse motor boxer arrefecido a ar pode ser considerado como uma das joias raras da engenharia, graças à sua versatilidade, resistência e pelo quanto se manteve ao longo das décadas equipando desde o Fusca à vasta família de modelos VW, a veículos militares, motocicletas, aeronaves ultraleves, bugues, picapes, peruas, barcos e uma infinidade de veículos automotores. Sem dúvida um exemplo a ser seguido.
DM
A coluna “Perfume de carro” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.
Visite o site do Douglas: www.carrosegaragem.com.br
Não deixe de ler a Newsletter AutoTalk, que fala sobre a anatomia de um carro e de tudo que gira ao redor dele. A inscrição é gratuita e você recebe semanalmente. Cadastre-se em: www.autotalk.com.br