Após um ano do lançamento do Nissan Leaf no Brasil, onde fiz uma avaliação de impressões ao dirigir bem completa, chegou o momento de fazer uma avaliação nos moldes do AE para verificar seus principais atributos no uso diário. Nos últimos meses tive a oportunidade de avaliar outros carros elétricos e híbridos de várias categorias, portanto a comparação acaba sendo inevitável, apesar desta não ser uma avaliação comparativa.

Se preferir, assista ao vídeo primeiro:

Bateria e a temida autonomia

Autonomia — essa é a primeira palavra que vem à cabeça quando o tema é carro elétrico. Ao retirar o carro na concessionária Carrera em São Paulo, SP, onde a Nissan entrega os carros para os jornalistas, já teve consumidor perguntando isso. Não lembrava o número correto, mas veio à cabeça o Chevrolet Bolt que chega a 350-400 km e o Audi e-tron 300-350 km. Ao entrar no carro e zerar o computador de bordo, confirmei que 250 km era a autonomia do Leaf.

O Nissan Leaf utiliza bateria de íons de lítio de 40 kW·h, portanto menor do que os outros dois citados, explicando assim sua menor autonomia. Consequentemente, o tempo de recarga para atingir 80% ou 100% é menor.

No compartimento frontal de carga há dois tipos de tomada (CHAdeMO e Type1). A primeira é para cargas rápidas diretamente com corrente contínua. A segunda para cargas mais lentas com corrente alternada. O carregador de emergência utiliza o conector Type1.

Primeira surpresa foi consultar o aplicativo PlugShare e descobrir que na região onde eu resido não há carregadores com plug desse modelo. O mais perto de casa está 40 km distante, no aeroporto de Viracopos. Pesquisando um pouco mais descobri que há um adaptador Type 1 para Type 2 e vice-versa, porém esse acessório não estava no porta-malas do carro.

A segunda surpresa foi no posto Graal no km 67 da Anhanguera, no trajeto de São Paulo até Campinas. O PlugShare indica que há o carregador rápido de 50 kW·h com plug 1. Como já havia consumido 70 km da autonomia inicial, resolvi fazer uma parada para recarregar a bateria e pela indicação do painel em 15~20 minutos teria 100% novamente. Tudo estava indo bem — até descobrir que o carregador estava com defeito e inoperante. Por sorte a autonomia era suficiente para chegar no meu destino. Neste momento dei razão ao Bob Sharp que defende a tese da necessidade de “plano de voo” para carros elétricos. Quanto mais que a infraestrutura brasileira ainda não está adequada a esse novo tempo.

Passada essa apreensão e surpresas iniciais, fiz todas as cargas de bateria com o carregador de emergência de 2 kW.h de capacidade, fornecido com o veículo, e conectado à tomada de 220 V com aterramento que tenho na garagem. O mesmo carregador pode ser conectado à tomada de 127 V, mas o tempo de carga é praticamente dobrado.

Não deixei de fazer nenhuma atividade do dia a dia por medo de ficar sem bateria. Fiz até a extravagância, para tempos de quarentena, de ir até Holambra, SP para acompanhar um encontro do Porsche Club, e chegando lá, vi que a cidade estava muito movimentada. Estiquei o passeio até Mogi-Guaçu, onde pude almoçar com maior segurança e tranquilidade. Foi um dia de maior rodagem com cerca de 180 km.

Em 6 dias rodei 665 km, e o consumo médio foi 6,41 km/kW·h, traduzido em cerca de 15 centavos por km rodado. Resultado melhor do que o obtido com o Chevrolet Bolt que rodei 610 km e consumo médio de 5,55 km/kW·h. Neste caso a comparação direta é válida, pois os dois carros tem tamanhos compatíveis, porém o Bolt tem motor de 203 cv, contra 149 cv do Leaf.

O quadro de instrumento do Nissan Leaf tem várias opções de configuração. Para autonomia e tempo de recarga há uma tela específica. Ao selecionar essa função é possível definir a capacidade do carregador em uso, tendo assim uma projeção de tempo de recarga para atingir 25/50/80/100%. Isso facilita muito para o uso diário.

Desempenho prazeroso

Acelerar carro elétrico, ou até mesmo híbrido, é sempre prazeroso. A resposta é imediata pois o motor elétrico assíncrono está conectado diretamente a um redutor de rotação e não há uma caixa de câmbio tradicional. Não há embreagem tampouco conversor de torque. O redutor do Nissan Leaf tem redução total de 8,19:1 e o motor tem rotação máxima de 9.250 rpm. Combinado com os pneus 215/50R17 a velocidade máxima fica limitada em 144 km/h, mas em compensação a aceleração 0-100 km/h é feita em 7,9 segundos. E as retomadas de velocidade acontecem com a mesma agilidade.

A curva de resposta do pedal de acelerador pode ser comutada entre o modo Normal e Eco. A diferença de desempenho é sensível, assim como o consumo de bateria em uma condição e na outra. Fica a dica de dirigir sempre em modo Eco e utilizar o modo Normal apenas quando estiver tranquilo quanto a autonomia e próximo ao ponto de recarga.

O modo e-Pedal presente no Nissan Leaf é aquele sistema que deverá aparecer em todos os carros elétricos no futuro. É muito útil para trajetos urbanos onde o anda e para é constante. Após alguns minutos dirigindo nesse modo já é possível ter domínio do carro e da modulação de aceleração e desaceleração.

Há ainda o modo de condução B (Brake – freio), ideal para descida de serra, onde o freio regenerativo atua com maior intensidade, tendo melhor aproveitamento da energia cinética do veículo para carregar a bateria. Em todos os modos de condução, ao aliviar o pé do acelerador, o freio regenerativo entra em ação, sendo a condição B, com e-Pedal, a de maior recuperação de energia.

Comportamento dinâmico

A calibração da suspensão do Nissan Leaf deixa uma mistura de emoções. Ao mesmo tempo que o carro é firme e confortável no asfalto liso, quando chega no piso deteriorado vem a decepção. A aspereza de rodagem é acentuada em paralelepípedo e a absorção de impacto é sofrível nas emendas de asfalto. Nas curvas o carro é espetacular, apresenta pouca rolagem de carroceria e contorna muito bem. Essa é a vantagem da bateria, que pesa cerca de 300 kg, estar posicionada no assoalho, deixando o centro de gravidade do carro bem baixo.

O sistema de direção com assistência elétrica tem ajuste perfeito com ótimo compromisso de esforço estático e progressão indexada à velocidade. O sistema absorve as imperfeições do piso, sem deixar chegar ao volante, aumentando assim o conforto. A resposta e precisão da direção também é um ponto a ser elogiado no modelo. Grande contribuição dada pelos pneus Goodyear 215/50R17.

Sempre digo que freio bom é aquele que não chama a atenção em uma avaliação. E é assim que se apresentou o sistema de freio do Nissan Leaf. Mesmo em situações mais abusivas não é notado fading, e no anda e para da cidade tem a modulação bem adequada do esforço do pedal x curso x desaceleração.

Conforto e segurança a bordo

O Nissan Leaf não é um showroom da última tecnologia disponível, mas certamente traz um pacote bem completo que deve agradar a seus compradores. A central multimídia tem conexão Android Auto e Apple CarPlay através de cabo, e sendo assim, dispensa o carregador por indução. O sistema de som tem ótima qualidade sonora, porém a recepção de emissoras não tem o mesmo alcance dos carros nacionais.

O controle automático de velocidade de cruzeiro adaptativo tem ajuste da distância do carro à frente em três posições. Como outros sistemas similares já testados, mantém uma margem de segurança razoável, a ponto do motorista que vai à frente não perceber que está limitando a velocidade do carro de trás. Tema recorrente no AE. essa é uma cultura que tem que melhorar no motorista brasileiro. A última faixa da esquerda é para ultrapassagem e a da extrema direita, quando há 3 ou mais faixas, não é só pra caminhões. Carros de passageiro podem e devem trafegar por ali também.

O pacote de segurança conta com seis bolsas de ar inflável, incluindo as duas frontais obrigatórias. Pode-se destacar também o alerta de colisão frontal com assistente de frenagem de emergência, alerta de fadiga, alerta de saída de faixa e alerta de ponto cego que são ótimos recursos de auxilio ao motorista e trazem maior segurança.

O controle de estabilidade tração traz o incremento do controle de trajetória de curvas e estabilização da carroceria (ride control). Esse sistema integrado permite efetuar curvas com maior segurança e confiança.

Os bancos tem revestimento em couro com ótimo conforto, e aqui novamente fica aquela decepção da calibração da suspensão. Com bancos tão bons, mereceria um refino no ajuste dos amortecedores para deixar tudo perfeito. Chamou a atenção haver engates Isofix adicionais no banco do passageiro dianteiro, além do par presente no banco traseiro.

Aparência externa

As linhas externas são desenhadas para o melhor fluxo de ar e consequentemente melhor coeficiente de arrasto aerodinâmico. O Cx é de 0,28. Na dianteira há uma pseudograde, pois é totalmente fechada e todo sistema de iluminação frontal e traseiro é com tecnologia de LED, o que traz modernidade ao carro.

Teto pintado na cor preto piano é de série para os carros de cor prata e branco, e a terceira cor disponível é o preto. Esse artifício de teto escurecido transforma o visual de alguns carros. Já em outros é melhor apertar o botão “desver”. No caso do Nissan Leaf teve um resultado bem bacana.

Mercado

A oferta de carros elétricos no mundo vem aumentando. Todas as semanas pipocam lançamentos aqui e ali. Recentemente li uma publicação que indicava uma grande quantidade de novos modelos que estão sendo desenvolvidos pelo mundo. Aparentemente é uma realidade sem volta. A resistência à sua utilização diminuirá à medida que a infraestrutura de carregamento for melhorando e principalmente a bateria tiver maior densidade energética, com menores tempos de recarga. Há uma busca da bateria perfeita, vide matéria publicada pelo Bob Sharp recentemente.

A Nissan traz o Leaf para o Brasil, importado da Inglaterra, e com preço de lançamento de R$ 195.000, apostando na venda de 150 carros/ano, mas neste primeiro ano foram vendidos apenas 51 unidades, segundo a Anfavea. Pelas consultas que fiz nesta semana o preço praticado continua o mesmo, apesar da desvalorização do real nos últimos 12 meses.Ou seja, o Leaf está mais barato.

É óbvio que o ano 2020 não está favorável a nenhuma inovação, mas mesmo assim é um volume bem inferior ao que planejaram. Portanto, ainda há um grande caminho para chegarmos nos volumes sonhados pelos departamentos de marketing e vendas dos fabricantes no tocante a carros elétricos. A conferir !

GB

(Atualizado em 4/09/20 às 21h20, correção do tipo de um dos plugues)

(Atualizado em 8/09/20 às 15h20, correção do tipo dos plugues)