O local do 1º Salão do Automóvel foi o Parque do Ibirapuera, onde havia dois grandes galpões que abrigaram o evento. O Parque do Ibirapuera foi um dos legados das comemorações do IV Centenário da Cidade de São Paulo, que ocorreram em 1954. Este Salão do Automóvel foi inaugurado em 26 de novembro de 1960 continuou até 11 de dezembro. Foi um evento incrível que atraiu cerca de 400.000 visitantes.
O Parque do Ibirapuera (que significa pau podre em tupi-guarani) possui um lago que, em 1960, tinha uma profundidade média de 2,5 m e era usado para lazer por meio do aluguel de barcos a remos e a motor, além de oferecer passeios em pequenas catraias que transportavam grupos de pessoas num passeio pelo lago.
No estande da Volkswagen neste 1º Salão um cartaz colocado sobre um cavalete chamava a atenção para a apresentação do VW Fusca Anfíbio no lago próximo, marcava o lugar onde ele ficava quando não estava navegando, como mostra a foto abaixo:
O VW Fusca anfíbio foi preparado pelo Departamento de Testes da Volkswagen do Brasil. Inicialmente, o objetivo dos engenheiros era apenas estudar a vedação do VW Fusca mas, na falta de atração mais especial, o veículo de testes foi levado para o estande da marca. “O carro não tem objetivos comerciais e não se fabricaria em série”, ressaltava a Fábrica.
O motor foi blindado numa caixa metálica e as vedações das portas foram aperfeiçoadas. Por segurança, adaptou-se no porta-malas uma bomba para escoar água que porventura entrasse no compartimento do motor ou na cabine. A característica plataforma do Fusca, toda fechada por baixo, não sofreu qualquer alteração. Também não foram usados flutuadores.
Antes de se apresentar no Salão o VW Fusca Anfíbio foi testado na represa de Guarapiranga, que fica próxima à Fábrica da Volkswagen;. Veja algumas fotos destes testes (Fotos: Volkswagen):
O Salão foi inaugurado num sábado e as fotos no lago foram feitas naquele fim de semana. Como o lago era usado para recreação, o VW Fusca Anfíbio teve que disputar espaço com lanchas e barcos a remo, como mostra a foto de abertura. Um dos pontos altos das apresentações era quando o VW Fusca entrava no lago:
O VW Fusca Anfíbio teve, inclusive, num dia uma companhia ilustre. Um Schwimmwagen participou do evento, só que ele foi projetado para isto mesmo: navegar.
Sempre que o VW Fusca Anfíbio entrava na água apareciam pessoas para admirar aquela façanha, como mostra a foto abaixo:
No Rio de Janeiro, na Lagoa Rodrigo de Freitas
O Jornal O GLOBO na página 3 de sua edição de 15 de dezembro de 1960 avisava da chegada de um VW Fusca muito especial com a notícia: “Um Fusca na Lagoa”, e a ilustração desta notícia é uma foto do VW Fusca Anfíbio navegando no lago do Ibirapuera:
O texto desta notícia diz:
Um Volkswagen na Lagoa
CHEGA hoje ao Rio, um carro diferente, Vem de São Paulo, rodando normalmente pela Presidente Dutra, De fora é um Volkswagen Igual aos outros, e só uma pequena hélice na traseira e dois canos de descarga voltados para cima dão uma ideia de que o carrinho foi preparado para estranhas viagens. O VW é um veículo anfíbio, especialmente preparado pelo Departamento de Testes da Volkswagen do Brasil, que vem ao Rio fazer demonstrações a convite de Mauro Salles, redator da coluna “Automóveis e Aviões de O GLOBO. Quem o traz de São Paulo é o Sr. Ehrard Schmidt, ele é o técnico responsável pela curiosa adaptação, ele e o nosso companheiro estarão, na tarde de domingo, a partir de 16 horas, descendo a rampa do Clube Caiçaras, para “umas voltas” na Lagoa. A não ser que chova muito e a experiência seja transferida para as ruas cheias de Catumbi ou da Praça da Bandeira, onde o pequeno VW estará bem à vontade. Na foto, o VW anfíbio, durante uma exibição domingo último, no lago do Ibirapuera.
O cenário desta façanha carioca foi a Lagoa Rodrigo de Freitas, que podemos ver na foto abaixo:
Com 9,5 km de contorno, a Lagoa Rodrigo de Freitas está ligada ao mar (ao fundo da foto) pelo canal do Jardim de Alah, que separa as praias do Leblon e de Ipanema. Suas águas são o local preferido dos remadores. Por esse motivo, a lagoa é rodeada por clubes tradicionais do remo, como Flamengo e Vasco (sede náutica), e outros de lazer, como Caiçaras e Piraquê.
Agora eu vou passar a bola para o que meu amigo, e jornalista, Jason Vogel que escreveu sobre este acontecimento, iniciando com a chamada:
“O então redator do GLOBO Mauro Salles convenceu o chefe do Departamento de Testes da Volkswagen e executor do projeto de pôr à prova o sistema de vedação do carro.
Tarde de domingo, rampa de barcos do Clube Caiçaras. Com o característico assobio de seu motor, o Fusquinha 1200 vai abrindo alas entre os curiosos e, lentamente, mergulha na Lagoa Rodrigo de Freitas. Ao volante estava Mauro Salles, então “redator automobilístico” do O GLOBO, onde trabalhou por 10 anos até se tornar diretor de redação, antes de se tornar um dos maiores publicitários do país.
Muito original em tudo o que fazia, Salles tratou de convencer Ehrardt Schmidt (chefe do Departamento de Testes da VW e principal executor do projeto) a navegar com o besouro na Lagoa. O carro veio de São Paulo ao Rio rodando normalmente pela Dutra. Parecia um Fusquinha como qualquer outro, não fosse a pequena hélice na traseira e os canos de escape voltados para cima, ladeando a vigia traseira.
‘O carro flutua bem, com dois passageiros e até três, com a linha d’água na base dos faróis e na curva inferior dos para-lamas traseiros’, relatou Salles na reportagem. ‘O carrinho navegou com naturalidade como se fora um barco carregado. Mantive uma leve aceleração e a velocidade desenvolvida era de uns 10 km/h. As rodas dianteiras agiram como leme, e foi possível manobrar em curvas de pequeno diâmetro. (…) Dirigi o tempo todo de sapatos e meias, e só os molhei quando, ao descer do sedan, pisei em uma poça de chuva’.
O carro fez várias evoluções na Lagoa e ‘varou as marolas de uma lancha com mais conforto do que superaria qualquer buraco nas ruas do Rio’. Para gerar suspense, Salles (que não havia levado os remos de segurança) desligou e religou o motor duas vezes. Deu tudo certo, como contou a seção “Retrovisor”, do caderno Carro etc. em 27 de janeiro de 2016.
‘Seria preferível o naufrágio do que a desmoralização de um redator automobilístico que voltasse remando’, concluiu o jornalista.”
Este foi um capítulo interessante e muito diferente nas atividades da fábrica da Volkswagen de São Bernardo do Campo. Fica aqui o registro das duas aparições deste VW Fusca tão especial em São Paulo e Rio de Janeiro.
Agradeço ao Jason que permitiu o uso de seu material neste trabalho, permitindo complementar a parte do Rio de Janeiro.
Há várias outras aventuras de Fuscas navegando inclusive por mares revoltos em vários países. Talvez algumas destas aventuras apareçam em outras matérias aqui na coluna “Falando de Fuscas & Afins.”
AG
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