Após a década de 1960, praticamente não houve grandes evoluções conceituais em termos de motorização aeronáutica para o mercado da aviação geral (de pequeno porte), em emprego não comercial.
O emprego de motores turbo-hélice e a reação na aviação comercial e militar, os principais para o desenvolvimento da aviação como um todo, deixou a aviação geral de lado em termos de de motores e, com isso, à exceção da evolução pontual de projetos e materiais empregados na fabricação, os motores a pistão de movimento recíproco (boxer) da aviação geral continuaram exatamente os mesmos, seja no conceito e até mesmo nos modelos produzidos, daqueles concebidos nos anos 1950, ou seja, 70 anos atrás!
Esse conservadorismo já foi inclusive tema de outra matéria aqui no AE, neste artigo de 2021 onde se discute a evolução dos motores aeronáuticos e os novos conceitos, e talvez por essa razão, nunca tenhamos tido nada expressivo em termos de novidade.
O Continental Tiara dos anos 1960
Se hoje num mundo em busca da eficiência, um novo conceito de motores aeronáuticos dificilmente consegue sair do papel, imagine-se na década de 1960, quando a demanda absoluta de aviões leves e motores era pujante e os preços dos combustíveis estavam longe de ser uma preocupação!
Ainda assim, a Continental Motors arriscou e resolveu criar uma nova família de motores, ao mesmo tempo em que mantinha conceitos consagrados porém com ideias novas.
Para conservar o time ganhador, a Continental manteve o conceito de motores superquadrados (diâmetro maior que o curso), com cilindros externos a carcaça, arrefecido a ar dinâmico, duas velas por cilindro, dupla ignição por magnetos. A taxa de compressão empregada foi um pouco mais alta que as utilizadas nos motores comuns, com valores de 9:1.
Para melhorar a eficiência volumétrica e ganhar potência, utilizou a forma mais simples para isso, o aumento de rotações. Desta maneira, enquanto um motor aeronáutico comum trabalha a até 2.800 rpm para o acionamento direto da hélice, no virabrequim (no máximo 3.400 rpm empregando uma redução simples com apenas duas engrenagens. entre 0,67:1 e 0,75:1), o Tiara funcionava a 4.000 rpm nas versões de aspiração atmosférica e até 5.000 rpm para as turbocarregadas, melhorando, assim, a eficiência volumétrica e a potência dos motores.
Para simplesmente eliminar o emprego da caixa de redução ou de pesadas engrenagens, a solução (genial) empregada foi a de usar a redução natural que todos os motores de ciclo Otto e quatro tempos possuem, seja aeronáutico ou não: a árvore de comando de válvulas!
Desta maneira, a hélice nesses motores são acopladas à árvore de comando de válvulas e não no virabrequim, impondo uma redução inerente de 2:1.
Havia um sistema interessante de amortecimento de vibrações entre a hélice e a árvore de comando do motor, visando a eliminação de vibrações e ressonâncias com potencial destrutivo do motor, simplesmente eliminando as rotações criticas que poderiam ser danosas ao conjunto.
O Continental Tiara entrou em serviço nos anos 1970 e em uso comercial propriamente dito, apesar de testado em inúmeras aeronaves desde Piper Cherokee até Cessna 175, apenas no Piper Pawnee Brave 285, uma aeronave agrícola (e de porte semelhante ao Embraer Ipanema) saiu equipado por um curto período com essa motorização.
Embora houvesse um ganho expressivo de potência específica nos motores Tiara, o seu consumo era muito próximo ao motores de baixa rotação e grande cilindrada semelhantes, e fabricados pela própria Continental.
Outro fator que acabou por derrotar o Tiara foi a sua vida útil: Enquanto nos anos 1970, os motores eram feitos para 1.600 até 1.800 horas TBO (Time Between Overhaul), ou seja, tempo que, uma vez atingido, o fabricante recomenda reformar o motor, o Tiara tinha um TBO de apenas 1.200 horas, número esse extremamente baixo e somente visto no Continental GO-300 do Cessna 175 (um fiasco comercial) e no GTSIO-520-F de 435 hp empregado em uns pouquíssimos (66!) Rockwell Commander 685.
O início da década de 1980, a da derrocada da aviação leve (a chamada “aviação geral”) levou os números de números de produção anual de cada fabricante a cair de alguns milhares de unidades para apenas pouco mais de uma centena (quando muito), num prazo de apenas dois anos, o que representou também o encerramento da linha Tiara que, hoje, só existe em museus.
DA
FICHA TÉCNICA E VERSÕES
FICHA TÉCNICA | ||||
Designação | 4-180 ou O-270 | 6-260/6-285/6-320 ou O-405 | T6-260/T6-285/T6-320 ou O-405 | 8-380/T8-450 ou O-540 |
N° de cilindros/configuração | 4 cilindros contrapostos 2 a dois | 6 cilindros contrapostos 2 a dois | 6 cilindros contrapostos 2 a dois | 8 cilindros contrapostos 2 a dois |
Arrefecimento | a ar, via natural | a ar, via natural | a ar, via natural | a ar, via natural |
Aspiração | Atmosférica | Atmosférica | Turbocarregada | Atmosférica/Turbocarregada |
Diâmetro x curso (mm) | 123,8 x 92,1 | 123,8 x 92,1 | 123,8 x 92,1 | 123,8 x 92,1 |
Cilindrada (cm³) | 4.434 | 6.652 | 6.652 | 8.870 |
Taxa de compressão (:1) | 9 | 9 | 9 | 9 |
Potência máxima (hp/rpm) | 180/4000 | 260/285 ou 320 a 4000 rpm | 260/4000 | 380/4000 ou 450/4500 |
N° de comandos de válvulas/acionamento | Um – por engrenagem | Um – por engrenagem | Um – por engrenagem | Um – por engrenagem |
N° de válvulas por cilindro | 2, de atuação indireta | 2, de atuação indireta | 2, de atuação indireta | 2, de atuação indireta |
Formação de mistura | Injeção mecânica no duto | Injeção mecânica no duto | Injeção mecânica no duto | Injeção mecânica no duto |
Gerenciamento do motor/ignição | ||||
Combustível | Avgas 100/130 / Avgas 100 LL | Avgas 100/130 / Avgas 100 LL | Avgas 100/130 / Avgas 100 LL | Avgas 100/130 / Avgas 100 LL |
Peso sem fluidos mas com acessórios (kg) | n/d | n/d | n/d | n/d |
Redução da hélice (:1) | 2 | 2 | 2 | 2 |