A controvérsia da semana é a cobrança do SPVAT — Seguro Obrigatório para Proteção de Vítimas de Acidentes de Trânsito — o imposto que substituiu o seguro obrigatório (DPVAT) cobrado até 2020 pela Seguradora Líder de todos os veículos. Alguns estados se manifestaram contra sua cobrança — como sempre foi — junto com o IPVA, no começo de 2025. Os governadores de Minas Gerais e São Paulo, por exemplo, declararam que não irão cobrá-lo, enquanto outros concordaram e o anexarão ao imposto estadual, num convênio com a Caixa Econômica Federal. Por “coincidência”, os governadores alinhados com o ex-presidente Bolsonaro se negam a estabelecer a parceria. E vice-versa.
Entretanto, o normativo da Lei nº 207, de maio de 2024, prevê que o Conselho Nacional de Trânsito (Contran) “adotará medidas com vistas a garantir que veículos automotores de vias terrestres que não estiverem quites com o pagamento do prêmio do SPVAT não sejam licenciados nem possam circular em via pública ou fora dela. (Artigo 5º)”.
Ou seja, a autoridade estadual pode se negar a cobrar o SPVAT, mas o dono do veículo tem a obrigação de pagá-lo: “conforme previsão legal, ainda que não haja, via convênio, cobrança do prêmio do SPVAT em conjunto com a taxa de licenciamento anual por meio das unidades da federação, caberá à Caixa, como agente operador do fundo mutualista, efetuar a cobrança do seguro aos proprietários”.
A Lei nº 207, portanto, é muito objetiva: se o Detran não concordar em estabelecer a parceria e se recusar a cobrar o SPVAT junto ao pagamento do IPVA (ou licenciamento do veículo), caberá à Caixa Econômica Federal efetuar sua cobrança.
Trapalhada governamental
Na verdade, este é um grande imbróglio provocado por decisões equivocadas dos últimos governos federais. Tudo começou em 1966, quando foi criado o seguro obrigatório chamado Recovat, que se transformou em DPVAT em 1974. E em 2007 o CNSP (Conselho Nacional de Seguros Privados) determinou a criação da Seguradora Líder representando 76 seguradoras. Mas tantas foram as trapalhadas com as verbas gigantescas recolhidas pela Líder que a Susep (Superintendência dos Seguros Privados) transferiu em 2020 a responsabilidade do DPVAT para a Caixa Econômica Federal. Que recebeu a inacreditável soma de 4,5 bilhões de reais que “sobrava” na Seguradora Líder para indenizar as vítimas de acidentes de trânsito a partir de janeiro de 2021. Por que tanta “sobra”? Porque a Líder ajustava quase anualmente o valor pago por veículo, mas manteve — despudoradamente — inalteradas as indenizações pagas aos acidentados. Tudo com a conivência do governo federal.
Importante ressaltar que, ao contrário do que se afirma, o DPVAT não foi extinto pelo governo anterior, em 2021, apenas sua cobrança deixou de ser realizada pois os bilhões de reais em caixa eram suficientes para as indenizações. Mas só até 15 de novembro de 2023, quando a fonte “secou” e a Caixa deixou de socorrer as vítimas de trânsito. Os proprietários de veículos deveriam ter voltado a pagar o seguro obrigatório em janeiro deste ano, mas o governo se atrasou ao enviar para o Congresso a nova lei estabelecendo seu retorno. Por isso, o DPVAT só volta em janeiro de 2025, com um novo nome (SPVAT) e um novo conceito, pois passa a ser um imposto em vez de um seguro, já que não é mais pago a uma seguradora, mas a um banco (Caixa Federal).
E agora, José?
Agora, a situação é complexa e deveria ser analisada pelo Ministério Público, pois está repleta de irregularidades. O seguro obrigatório existe em diversos países, mas é facultado ao dono do veículo pagá-lo na seguradora que melhor lhe aprouver. Como foi no Brasil, ao ser implantado como Recovat, em 1966. Mas logo desvirtuado e administrado, desde 2021, por um banco, a Caixa Econômica Federal. Que passa agora, segundo a própria Susep, a “agente operador do fundo mutualista”.
Quanto será cobrado pelo SPVAT em 2025? Ainda não foi determinado o valor, mas calcula-se que no entorno de R$ 60,00. Cerca da metade que a Seguradora Líder cobrava em sua época de “vacas gordas”, até 2018. E nos estados que se negam a estabelecer parceria com a Caixa? Ela terá de recorrer a algum caminho para obter a lista dos milhões de veículos automotores e seus respectivos proprietários para efetuar a cobrança.
A solução para este problema é simples, mas o governo se recusa a adotá-la: quem administra seguro é seguradora. O SPVAT deveria, portanto, ser pago às corretoras de seguros, as especialistas no assunto. E caberia aos Detrans que não cobrarem o “seguro” exigir o comprovante deste pagamento para licenciar o veículo.
E as vítimas de acidentes com veículos não identificados? As seguradoras implantariam um fundo para garantir estas indenizações, como em outros países.
BF
A coluna “Opinião de Boris Feldman” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.
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