Nesta última semana recebi de dois grupos distintos questionamentos sobre uma estratégia das empresas automobilísticas chinesas, iniciada pela BYD, de redução de preços dos veículos para dominar o mercado. O artigo completo pode ser acessado em: https://thenews.waffle.com.br/negocios/vender-barato-demais-pode-ser-um-grave-problema”.
Diz a matéria que “o plano chinês está custando caro para as montadoras” e complementa justificando que “como os carros têm ficado cada vez mais baratos, a possibilidade de revenda diminui consideravelmente”. O fato é que os veículos da BYD tiveram uma redução de até 34% em seus valores na China.
Em um outro artigo, agora pelo portal Terra traduzindo outro artigo do site espanhol Xataka, especifica que a guerra de preços iniciada pela BYD tem por objetivo desovar estoques utilizando a oportunidade para “limpar o mercado e eliminar concorrentes”.
Por fim, o site Exame.com aponta que analistas do Morgan Stanley divulgaram uma nota informando que “embora alguns desses descontos estejam em vigor desde abril, o anúncio oficial envia um forte sinal de quão difícil está o mercado final”. Tal nota da BYD desencadeou uma série de quedas nas ações da marca levando as ações de outras empresas também a cair.
Entretanto não podemos nos esquecer que quem dita as estratégias é o soberano mercado. As fabricantes analisam o mercado diariamente e uma ou duas vezes ao mês alteram suas estratégias de preço em função do que constataram nas vendas publicando aquilo que é denominado por “ação comercial”. Normalmente no início do mês disponibilizam as regras do jogo daquilo que acontecerá ao longo das semanas e permanecem, como já dito, monitorando o mercado. Na eventualidade de uma rápida ação, publicam uma nova ação comercial, normalmente por volta da metade do mês (mas isto pode ocorrer em maior ou menor número).
No caso de a opção pela fabricante ser, realmente, pelo posicionamento de preços baixos e mantê-los e/ou abaixá-los de forma constante, o que acontecerá serão os problemas relatados acima. Em maio de 2025 a BYD China abaixou os preços em até 34% para aumento de suas vendas o que, segundo a matéria, causou uma dificuldade na revenda dos veículos. Penso que o comentário tem uma perspectiva temporal muito pequena para se poder afirmar isso.
Afirmo que olhando apenas sobre este ponto de vista, está correto o entendimento de prejuízo aos concessionários. Imagine você, cliente, comprando um veículo por 100 moedas na data de hoje e na semana seguinte este mesmo veículo 0-km estar sendo comercializado por 66 moedas. Este veículo terá um valor de depreciação elevadíssimo no caso de o consumidor pretender vendê-lo, pois além da queda no preço, incide-se a depreciação do veículo novo. Neste caso realmente a perda financeira seria representativa e o cliente ficaria bem infeliz.
Um outro ponto deve ser levado em consideração e diz respeito ao fato de na comercialização de um veículo a preços baixos, existe uma perda do valor percebido pelo consumidor e igualmente se transmite, de forma até equivocada, a ideia de baixa qualidade no produto ou uma tendência de manter baixa a atratividade pela marca ao longo do tempo fazendo com que clientes não procedam com uma nova compra, atrapalhando, não só a imagem da marca, como o processo de fidelização, atualmente já tão difícil com tanta concorrência..
Se até aqui colocamos os pontos negativos da estratégia de preços baixos, podemos analisá-la sob a perspectiva estratégica. Neste caso analisaríamos o copo cheio desta mesma história…
É muito importante que uma empresa saiba ofertar descontos pontuais e planejados que tenham por finalidade o atingimento de um determinado objetivo.
Vamos considerar este caso fictício:
– Preço publico sugerido (o preço de lista): R$ 250.000,00
– Preço Incentivado e informado nos concessionários com os descontos concedidos pela fabricante: R$ 225.000,00
– Desconto com o concessionário na hora da aquisição: R$ 10.000,00
– Valor Final: R$ 215.000,00
Estamos falando de um veiculo que “vale” R$ 250.000,00, é anunciado por R$ 225.000,00 e que, por fim, é comercializado por R$ 215.000,00…
Após um ano, preços sobem pois a marca se consolida no mercado e reposiciona seus preços nos patamares normais; sem considerar inflação, reposicionamento de produto, ou o próprio movimento do mercado, vamos considerar que o veículo apenas retorna ao seu preço original (R$ 250.000,00).
Vamos considerar os parâmetros abaixo de depreciação real após 1 ano (esses números podem variar bastante… vamos tê-los como uma média):
– Depreciação média de um veículo a combustão: 12%.
– Depreciação real de um veículo elétrico hoje (irá melhorar nos próximos anos): 25%
Assim teríamos:
– na depreciação (combustão): R$ 250.000,00 – 12% = R$ 220.000,00
– na depreciação (elétrico): R$ 250.000,00 – 25% = R$ 187.500,00
ENTRETANTO, não se esqueça, pagou-se R$ 215.000,00 pelo veículo…
Então na depreciação de um veículo à combustão o cliente ganharia R$ 5.000,00 ao final de um ano e, na depreciação de um veículo elétrico o cliente perderia R$ 27.500,00, ou seja, aproximadamente 13% de perda o que é plenamente aceitável para qualquer veículo…
Neste caso tem-se a impressão de que o cliente sai “ganhando” com o veículo adquirido um ano atrás, pois não perdeu ou perdeu pouco dinheiro.
NOTA: não estou falando em dumping, ok?
Então, estrategicamente falando, as vezes a questão dos baixos preços, se bem utilizada e planejada pela marca, pode trazer ótimos benefícios.
MKN
A coluna “Visão estratégica” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.