Este é o título do vídeo “educacional” que está no “Tik Tok”. Uma dica sem nenhum embasamento técnico, nem empírico, para melhorar o desempenho do automóvel. O “tiktokeiro” encosta no posto, pede para abastecer o tanque com tantos reais de gasolina e mais alguns litros de diesel S-10.
E relaciona as inúmeras vantagens da prática. Afirma que o percentual de diesel (10 ml por litro de gasolina) aumenta a octanagem do combustível (dá uma “octanada” – diz ele), limpa os bicos injetores, reduz o consumo e se dá ao luxo de precisar valores: o carro passa a rodar 13 km com 1 litro em vez de 11 km.
Estava certo o escritor e filósofo italiano Umberto Eco (“O Nome da Rosa”, entre outros), pois disse em 2015 que “as redes sociais deram voz à legião de imbecis”. Que até então tinham sua manifestação limitada às mesas de bares e botequins, mas ganharam palanque internacional com a internet.
Notícias e informações estapafúrdias (e até dicas que podem prejudicar o carro, como esta) já circulam há anos pela web e as voltadas para motoristas estão entre as mais difundidas. Não me esqueço de uma delas — viralizou na época — que exibia a foto de uma inundação num grande pátio com dezenas de automóveis, todos com água pela janela e quase impossível de se determinar a marca.
O texto que acompanhava a imagem dizia “Onde está a imprensa corrupta brasileira que não divulga esta foto? Ela é toda vendida e não tem coragem de revelar o estoque da Volkswagen debaixo d’água no pátio de sua fábrica em São Bernardo do Campo! Claro que a fábrica vai recuperá-los e daqui a algumas semanas estarão todos à venda nas concessionárias VW do Brasil. E coitado de quem comprá-los”.
A foto era verdadeira. Mas não era nem da Volkswagen, nem no Brasil. Mas de uma fábrica na Europa.
Quais as consequências de se acreditar na dica do diesel?
O diesel, apesar de também ser um combustível para motor, tem propriedades completamente diversas da gasolina ou do álcool. Ele não tem octanas, mas cetanas.
Que bicho é esse?
A octanagem do combustível para um motor Ciclo Otto (gasolina ou gás natural, ou seja, de ignição por centelha) define quanto ele — misturado com o ar — suporta de pressão e temperatura antes que a combustão iniciada pela vela não se complete, o que resulta na combustão espontânea e repentina da mistura ar-combustível residual, o que gera temperaturas e pressões muito elevadas e potencialmente danosas ao motor, começando pelos pistões e chegando às válvulas. O fenômeno é chamado de detonação, popularmente conhecido como “batida de pino”. A foto de abertura permite ver a mistura ar-combustível residual que acabou de entrar em combustão espontânea.
Por que não falei em álcool? Combustíveis produzidos a partir de vegetais — cana-de-açúcar, milho, beterraba, batata — não têm o hidrocarboneto iso-octana, portanto não têm octanagem. Mas seu comportamento, na questão da detonação, equivale a uma gasolina de 115 octanas RON, tendo por isso elevada resistência ao fenômeno.
Na verdade, nenhum pino bate na detonação. O ruído típico que se escuta é provocado pelo choque de duas frentes de queima, a iniciada de um lado pela centelha na vela e a outra, gerada pela queima espontânea do “resto” da mistura. O nome ‘pino’ é apenas forma aportuguesada de ping, verbalização do som do ruído da detonação, descrita logo acima, em inglês. E o que se chama de onomatopeia, no caso de algo batendo. Todos conhecem onomatopeias como au-au, miau, bum, plim-plim.
O motor Diesel funciona de outro jeito. Em vez da centelha na vela, a queima do combustível se dá exclusivamente pela alta temperatura do ar quando o pistão o comprime no cilindro. Ou seja, a combustão começa no momento em que o diesel nele injetado encontra o ar superaquecido. É exatamente o que se evita no motor Ciclo Otto.
E o que define a facilidade da combustão do diesel é seu número de cetanas, ou cetanagem. Que, pode-se dizer, é o contrário da octanagem.
Então, o que pode acontecer quando se mistura diesel na gasolina? Sua octanagem despenca e são enormes as chances de ocorrer a destrutiva detonação.
Cuide-se, pois assim como esse do diesel, existem outros “milagres” na internet para aumentar desempenho e reduzir consumo e que podem danificar o motor. Querosene, naftalina, óleo 2T ou aditivo tipo booster na gasolina estão entre eles…
BF
A coluna “Opinião de Boris Feldman” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.
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