Tive oportunidade de dirigir o BMW i3 por algum tempo e alguma distância, diferentemente do que o Paulo Keller pôde fazer quando o carro elétrico da marca bávara foi apresentado à imprensa no dia 14 de setembro, conforme ele nos contou, em que só andou com o carro num condomínio fechado. Antes, em 1º de maio, nosso editor e correspondente na Suécia, o Hans Jartoft, havia nos brindado com uma ampla e excelente matéria sobre sua experiência com o BMW elétrico. Agora o Ae volta ao assunto após um “míni-no uso” esta semana, em São Paulo, dessa grande novidade mundial.
A matéria do Hans, com exemplos de utilização e custos do i3, e a do Paulo, altamente descritiva em detalhes do veículo, são complementares e recomendo sua leitura ou mesmo releitura, dado o grande volume de informação nelas contido.
De tudo o que já se sabe do i3, fica mesmo claro que a BMW não poupou empenho e dedicação para se lançar num novo e, até certo ponto, estranho segmento. Em meio à grande pergunta se puramente elétrico ou com algum meio de estender autonomia no caso de esgotamento da bateria, a fabricante liquidou a questão oferecendo duas versões, uma que depende exclusivamente de bateria, outra contando com a geração de energia elétrica a bordo para manter carga em patamar mínimo e o carro continuar a rodar, isso por meio de um motor de combustão interna 2-cilindros de 650 cm³ e 34 cv.
Bom de andar
Definitiva e inquestionavelmente, o i3 é excelente de andar. O gene BMW lhe sai por todos os poros, chegando-se ao cúmulo da abstração de, em várias situações, não se sentir estar ao comando de um carro tão intrinsecamente diferente dos seus carismáticos “Séries 1 a 7”.
É fácil pô-lo em movimento, a modulação do pedal “do acelerador” é perfeita, quase uma extensão do que o cérebro manda e mesmo sem ter o avanço lento (creeping) consegue-se o efeito sem nenhuma dificuldade.
Estamos cansados de saber que motores elétricos produzem torque máximo desde 1 rotação por minuto. Junte-se isso a potência de 170 cv num carro de 1.315 kg e o que se tem é uma vivacidade para acelerar de arrancar sorrisos de quem está ao volante. Alguns dados de desempenho falam por si sós: 0-60 km/h em 3,9 segundos, 0-100 km/h em 7,9 segundos e retomada 80-120 km/h em 5,5 segundos, esta simplesmente sensacional, sem reduzir marcha mediante algum comando ou kickdown, pois não há câmbio.
Minha experiência anterior com carro elétrico havia sido em novembro de 2011, o Renault Fluence Z.E., basicamente o Fluence normal muito bem convertido para propulsão elétrica, que resultou em 1.605 kg, muito peso para o motor de 95 cv, por isso o desempenho correspondia ao de um Fluence 1.6-litro a gasolina, como o 0-a-100 km/h em 13 segundos. Mas uma coisa me chamou a atenção, do que gostei imensamente: a potente frenagem resultante da regeneração de energia elétrica.
Pois no i3 essa característica é ainda mais pronunciada, de modo que verdadeiramente freia-se no trânsito normal “pelo pedal do acelerador”, aliviando-o mais ou menos conforme maior ou menor desaceleração é desejada.
Essa desaceleração chega a 1,6 G, lembrando que uma freada de emergência com bons freios convencionais é de 0,8 G. Ou seja, como disse o Hans na sua matéria, o desgaste de material de atrito dos freios será marginal no i3. É mesmo uma experiência totalmente nova e prazerosa sentir o efeito frenante da regeneração de energia.
À sua frente o motorista tem um mostrador com velocímetro digital bem no centro, à direita o “nível” de carga da bateria, à esquerda o medidor de consumo em quilômetros por quilowatts·hora (km/kW·h). Sob o primeiro lê-se a autonomia elétrica remanescente, sob o segundo a autonomia adicional com o motor a combustão provendo energia para manter a bateria no nível mínimo de 6% a 7% de carga.
O sistema de controle monitora permanentemente as autonomias restantes em função do consumo de energia elétrica de modo a se ter em tempo real a informação mais preciosa do que nunca num carro elétrico.
Ao se estabelecer uma rota no GPS, o próprio sistema de informação de bordo dirá se carro tem energia elétrica e combustível suficientes para chegar ao destino, de modo a não haver surpresas nesse aspecto.
Sobre o tanque de gasolina conter apenas 9 litros, o que à primeira vista pode parecer uma capacidade ridícula, na verdade ela é para atender exigência legal na Europa e Estados Unidos no sentido de a autonomia em propulsão elétrica ser necessariamente maior do que com eventual extensor de autonomia por motores a combustão. Isso é para que o veículo seja classificado como elétrico e possa fazer jus a incentivos fiscais e outras facilidades.
No caso de Londres, por exemplo, carros elétricos podem trafegar na Zona de Restrição de Tráfego sem pagar as 5 libras esterlinas (R$ 19,50) diárias a título de taxa de congestionamento.
Foi então que sugeri ao gerente sênior da submarca BMWi no Brasil, Carlos Côrtes, que me acompanhou, levar a mensagem do Ae à fábrica no sentido de aumentar a capacidade do tanque de gasolina para 20 litros, uma vez que não temos aqui essa legislação que define carro elétrico sob esta ótica.
Lembrei-lhe, inclusive, que o up! europeu tem tanque de 35 litros e aqui, 50 litros, mostrando que é normal aumentarem-se os tanques — caso também do Opala, que começou com 55 litros e chegou a 84 litros por causa do maior consumo com álcool. Ou do Passat, de 45 para 60 litros após alguns anos.
Com essa “tropicalização” o i3 poderia rodar cerca de 300 quilômetros consumindo gasolina (e não 135 km), que somados aos até 300 quilômetros em elétrico proporcionariam autonomia na zona de conforto, certamente um grande atrativo — mais um, pois é o que não falta ao i3. “Dê essa idéia aos alemães e sua promoção estará garantida”, brinquei.
É um carro idealizado para uso urbano, 4 metros de comprimento (3.999 mm!), homologado para 4 lugares, mas com distribuição de peso 50-50% (motores e tração traseiros) e avantajado entreeixos de 2.570 mm, que por isso encara uma estrada com total disposição. Vai tem em curvas de baixa e de alta mesmo com finos pneus 155/70R19 de baixo atrito de rolamento.
A velocidade máxima é limitada a 150 km/h, mas se isso não o torna um obstáculo móvel nem numa Autobahn (exceto na última faixa da esquerda), o que dirá aqui.
O rodar é que poderia passar pelas mãos da engenharia brasileira, uma vez que não está calibrado para o nosso chão que, embora não seja nada crítico, poderia ser melhor num carro desse naipe.
O acesso ao banco traseiro é bastante facilitado pelas portas traseiras de abertura reversa, como se vê na foto acima, e o porta-malas acomoda 260 litros, como num hatchback compacto, ampliável para até 1.100 litros com o banco rebatido. Não há estepe, só selante e bomba elétrica. O espaço no banco traseiro, entretanto, é apenas razoável.
Como estamos em plena era da conectividade, ela é bem explorada no i3, com o auxílio em acidentes (como no novo Ford Ka), serviço de reservas (por enquanto só na Europa) e, claro, internet plena. O Hans bem que disse na matéria dele, “sem conexão ninguém consegue sobreviver em 2014, parece”…
Para o Brasil só virá a versão com o motor a combustão para acionar o gerador que carrega a bateria, chamada REX, de Range Extender, em dois níveis de acabamento, uma por R$ 226.000 e outra, por R$ 236.000. A mais cara traz rodas de 20 polegadas, bancos em couro e revestimento do painel em madeira — “de eucalipto de reflorestamento registrado”, estranho mundo esse nosso hoje… Carro para poucos, portanto.
Preço elevado, sem dúvida. O Hans disse que o REX completo que testou custa o equivalente a R$ 155.000 na Suécia, o que pela tecnologia empregada, inclusive a estrutura em compósito de fibra de carbono, se justifica.
Mas quem puder pagar o “preço Brasil” terá nas mãos algo diferente e realmente capaz de dar alegrias, em especial a da exclusividade.
BS
FICHA TÉCNICA BMW i3 RANGE EXTENDER | |
MOTORES | |
Elétrico | |
Tipo | Síncrono híbrido com eletrônica de potência integrada, carregador e função de gerador para recuperação de energia |
Potência nominal (cv) | 170 |
Torque (m·kgf) | 25,5 |
Potência de recuperação (cv) | Até 68 |
Térmico | |
Tipo | 2 cilindros em linha, 4 válvulas por cilindro |
Cilindrada (cm³) | 647 |
Diâmetro e curso (mm) | 66 e 79 |
Potência (cv/rpm) | 34/4.300 |
Torque (m·kgf/rpm) | 5,6/4.300 |
Taxa de compressão (:1) | 10,6 |
Combustível | Gasolina 95 RON, mínimo 87 RON |
BATERIA DE ALTA TENSÃO | |
Tipo | Íons de lítio |
Tensão nominal (V) | 360 |
Capacidade energética bruta (kW·h) | 22 |
Tempo de recarga a 80% (h) | Menos de 30 minutos a 50 kW em recarga rápida, até cerca de 8 horas numa tomada residencial de 220 V |
TRANSMISSÃO | |
Tração | Traseira |
Câmbio | Marcha única |
SUSPENSÃO | |
Dianteira | McPherson, elementos de alumínio, geometria antimergulho |
Traseira | Multibraço atrelada diretamente à unidade motriz |
DIREÇãO | |
Tipo | Pinhão e cremalheira, assistência elétrica indexada à velocidade |
Diâmetro mínimo de curva (m) | 9,86 |
FREIOS | |
Dianteiros | A disco ventilado |
Traseiros | A disco |
Controle | ABS, EBD, BAS |
RODAS E PNEUS | |
Rodas | Alumínio, 5Jx19 |
Pneus | 155/70R19 |
CARROCERIA | |
Construção | Carroceria hatchback em compósito de fibra de carbono, chassi em alumínio, 4 portas, 4 lugares |
AERODINÂMICA | |
Coeficiente aerodinâmico (Cx) | 0,30 |
Área frontal (m²) | 2,38 |
Área frontal corrigida (m²( | 0,71 |
DIMENSÕES | |
Comprimento (mm) | 3.999 |
Largura (mm) | 1.775 |
Altura (mm) | 1.578 |
Distância mínima do solo (mm) | 140 |
Distância entre eixos (mm) | 2.570 |
PESOS E CAPACIDADES | |
Peso em ordem de marcha (kg) | 1.315 |
Carga útil (kg) | 415 |
Tanque de combustível (L) | 9 |
Porta-malas (L) | 260 a 1.100 |
DESEMPENHO | |
Aceleração 0-60 km/h (s) | 3,9 |
Aceleração 0-100 km/h (s) | 7,9 |
Retomada 80-120 km/h (s) | 5,5 |
Velocidade máxima (km/h) | 150 |
AUTONOMIA NO DIA A DIA | |
Modo Comfort (km) | 240 a 300 |
Modo mais eficaz (km) | até 340 |
CONSUMO | |
Corrente elétrica (kW·h/100 km) | 13,5 |
Corrente elétrica (km/kW·h) | 7,4 |
Combustível (km/L) (L/100 km) | 167 (0,6) |