Na Parte 1 vimos como o VW 1600 surgiu e foi muito bem aceito pela imprensa e pelos consumidores. Na Parte 2 deste trabalho vamos dar continuidade à matéria sobre este sedan com quatro portas, entraremos no período de produção e vamos ver as primeiras transformações que este carro recebeu. Também veremos o lançamento da “série especial”, a versão luxo — o VW 1600 L, como o exemplar da foto de abertura. Esta parte termina com algumas nuvens no horizonte deste carro.
Após a superação de todos os problemas da fase de lançamento, a Volkswagen intensificou na mídia impressa da época, comerciais “bem-humorados” destacando as novidades do novo modelo, tais como o novo motor mais potente, os novos freios a disco, o painel tipo jacarandá, o limpador de para-brisa de duas velocidades, sempre associadas às características tradicionais da marca, tais como, a robustez da mecânica a ar, e a economia de combustível.
Vamos ver algumas das propagandas publicadas nesta época, iniciando com uma que foi publicada no dia 10 de fevereiro de 1969. O seu mote é a pergunta: “V. abandonaria a mecânica dêste carro só por causa de umas linhas bonitas? ” que aparece abaixo da imagem de um Fusca. A resposta é: “Não precisa. Chegou o Volkswagen 1.600”. Um anúncio didático que mostra que basicamente o VW 1600 tem todos os fundamentos do Fusca, só que numa embalagem mais bonita e mais confortável. Esta propaganda também visa convencer um cliente Volkswagen que caso ele queira sair da linha do Fusca ele tem uma solução Volkswagen moderna, bonita e com a mecânica comprovada do Fusca. (Nota do autor: a acentuação e a ortografia neste anúncio e nos seguintes foram mantidas intencionalmente para reforçar o cunho histórico).
Em seguida veja a matéria que foi publicada no dia 13 de fevereiro de 1969, com o mote: “Volkswagen em nova embalagem”, mas leia-se: “Fusca em nova embalagem”, mensagem que pretendia passar para o carro recém-lançado a confiabilidade do Fusca. Tanto que no final desta propaganda pode-se ler: “Conclusão: agora v. pode comprar um Volkswagen em nova embalagem, o que afinal é uma grande novidade. Com a vantagem de não estar comprando nenhuma novidade.”
A próxima propaganda será cortada ao meio e postada em duas partes para permitir a leitura das legendas da sua ilustração. Ela foi publicada em 25 de fevereiro de 1969. Seu mote era: “Duas razões para V. gostar do Volkswagen 1.600” e logo abaixo está uma foto do chassi do VW 1.600 com o título “Mecânica Tradicional”; os itens importantes estão ressaltados por legendas específicas. Na parte de baixo desta propaganda está o subtítulo “As linhas nada tradicionais” com a foto do carro; segue-se por um texto que ressalta os seus itens “de beleza” arrematando o assunto com a frase: “Mas no fundo, êle continua o mesmo, um tradicional Volkswagen”.
Passamos para a propaganda de 19 de março de 1969, seu mote era forte: “À primeira vista V. pode pensar que traímos nossos princípios.” e no texto são dados os argumentos para negar esta afirmação. Este texto dizia: “Dizem que a primeira impressão é a que vale. No caso do Volkswagen 1.600, isto pode levar v. a tirar uma conclusão errada. Vendo tôdas aquelas coisas bonitas que êle tem, v. é bem capaz de pensar que êle deixou de ser um Volkswagen. Mas é justamente o contrário. O Volkswagen 1.600 não é Volkswagen só no nome. É Volkswagen em tudo. É Volkswagen em tudo. Olhando embaixo das coisas bonitas, v. não vai encontrar nenhuma traição aos princípios Volkswagen. Vai encontrar só estes princípios. Quer ver? O motor continua lá atrás, sobre as rodas motrizes, dispensando um longo eixo cardã. E continua sendo refrigerado a ar, como todos os motores Volkswagen, apesar de ter 60 HP. Outro princípio que v. vai encontrar é o pão-durismo. O VW 1.600 faz economia em gasolina, óleo e oficina. Como todos os outros Volkswagen, o VW 1.600 também não tem nada embaixo. Só aquela chapa de aço. E no lugar das molas, v. encontra outro princípio Volkswagen: as barras de torção. Agora que v. já viu como é o Volkswagen 1.600 por dentro, pode tirar a sua conclusão, sem correr o risco da primeira impressão. Responda com sinceridade: v. acha que nós traímos nossos princípios? Ou com o Volkswagen 1.600 êsses princípios ficaram apenas mais bonitos?
Um belo trabalho de catequização dos compradores potenciais, mas a eficácia deste trabalho de convencimento foi restrita aos leitores de jornais. Influenciar o “boca a boca” popular era uma outra coisa.
O anúncio seguinte era de 20 de maio de 1969, a “Blitzkrieg” de anúncios já estava sendo espaçada. Este tinha o mote:”Êle é tão pão-duro quanto os outros Volkswagen”. Novamente o final do texto, neste caso as três frases finais, arremata o mote do assunto: “Portanto, é bom v. ficar preparado: não pense em ter um VW 1.600 apenas com linhas bonitas. Todo aquele pão-durismo da família vem junto. O que afinal não deixa de ter também a sua beleza.” É interessante observar que o esquema de propaganda criado na década de 50 pela DDB – Doyle Dane Bernbach, de Nova York era fielmente seguido pela agência de publicidade ALMAP no Brasil.
No próximo anúncio continua sendo feito o paralelo entre o Fusca e o VW 1600, desta vez com mais ênfase e de modo mais explícito, usando, novamente, a imagem do Fusca juntamente com o seu descendente direto o VW 1600. Na propaganda publicada em 4 de junho de 1969 o mote foi: “Qualquer semelhança no desempenho é meramente proposital” e dando um arremate nesta forma explicita de traçar um paralelo entre os dois carros as duas últimas frases do texto diziam: “E não há nenhuma coincidência nisso: o VW 1.600 copiou do ‘Fusca’ tudo o que ele tinha de bom. Embora tenha dado também a sua contribuição pessoal: 4 portas, faróis retangulares, pára-brisa de visão panorâmica, etc., etc.” Neste texto nota-se a intenção de “matar o Fusca” através do verbo no passado na passagem: “copiou do ‘Fusca’ tudo que ele tinha (nosso grifo) de bom”, uma mensagem que não era nada subliminar.
Também eram publicados anúncios coloridos em revistas, como o exemplo abaixo. Neste é interessante observar a parte que se refere ao porta-malas espaçoso que dizia: “Para arranjar mais espaço para as pessoas não foi preciso tomá-lo do porta-malas: pelo contrário, ele também ficou mais espaçoso no Volkswagen 1.600,” Mas o segredo do grande porta malas foi o posicionamento do tanque de combustível colocado atrás, ao contrário do que ocorreu com seus “irmãos” Variant e TL.
Como vimos, ao longo do primeiro semestre de 1969, a Volkswagen intensificou a exposição do VW 1600 na mídia, preparando, em janeiro deste ano, inclusive um questionário tipo “Perguntas e Respostas”. Na matéria publicada pelo O Globo no dia 17 de janeiro de 1969, este questionário vinha com o seguinte título: “Volks quatro portas detalhe por detalhe” e vinha com o seguinte esclarecimento adicional: “Questionário preparado pela própria Volkswagen do Brasil, dissipando dúvidas possíveis sôbre o Sedan 1600, é publicado, agora, para que o leitor tenha uma visão maior sobre o novo VW quatro-portas. As respostas em linguagem acessível a todos farão de você um entendedor de primeira do 1600.” Nota-se a liberdade que o redator usou na nomenclatura do carro. Para permitir uma visualização melhor, a matéria do O Globo foi dividida em duas partes. Na verdade, a tecnologia de digitalização empregada pelos jornais e disponibilizada pela internet não é das melhores, mas o que vale é a documentação histórica e, com um pouco de boa vontade, pode-se aproveitar o seu conteúdo precioso.
A revista Quatro Rodas publicou, em sua edição de julho de 1969, uma pesquisa com proprietários do VW 1600 a fim de medir a satisfação dos consumidores com o novo carro da VW. Interessante que apesar do elevado índice de satisfação de 92%, somente 35% se dispunham a conservá-lo por mais de um ano. Os pontos fortes relatados foram: linhas bonitas, visibilidade, estabilidade, posição do motorista e freios. Já os pontos fracos: ruído interno, dificuldade de fechamento das portas, consumo excessivo. Diante do exposto, considerando a excelente avaliação, concluímos que o VW 1600, foi um sucesso em seu lançamento! Mas será que este sucesso foi duradouro?
Apresentamos esta pesquisa para que você possa ver os detalhes desta avaliação:
As análises de aspectos de análise individuais foram apresentadas pela Quatro Rodas sob a forma de gráficos reproduzis abaixo:
VW 1600 L – O primeiro veículo de passeio de luxo da Volkswagen do Brasil
Em junho de 1969, com a concorrência do Corcel e do Opala acirrando o mercado de médios quatro-portas, a Volkswagen do Brasil preparou uma versão de luxo, lançada como “Série Especial” do VW 1600 e batizada de “VW 1600-L”. Essa versão estreou na tabela de preços da revista Quatro Rodas referente a julho de 1969, ficando disponível até a tabela referente ao mês de março de 1970, ou seja, durou apenas nove meses.
Em função dos materiais usados e do capricho dessa versão, podemos considerar o VW 1600-L o primeiro veículo de passeio de luxo da VW do Brasil, desconsiderando a Kombi luxo por se tratar de um utilitário e não possuir o mesmo acabamento refinado da série especial do VW 1600. No dia 21 de junho de 1969 o jornal O Globo publicou a matéria “Volkswagen lança 1600-L”. Dividimos a imagem deste artigo em duas partes para melhorar a visualização:
O diferencial começava pelo lado de fora da carroceria, onde chamava a atenção as seguintes opções de combinações de cores: bege Gobi com teto branco Lótus, verde Folha com teto verde Pinheiro, vermelho Cereja com teto preto, branco Lotus com teto bege Gobi. Além destas, havia a opção da cor única Preta, exclusiva para essa versão.
Outro exemplar da série de fotos de divulgação vermelho Cereja com teto preto pode ser visto na imagem de abertura desta parte da matéria. Esta é uma foto atual de um excelente exemplar de coleção.
Outros detalhes externos eram os frisos na linha de cintura, os pneus faixa-branca, a tampa do tanque de combustível com chave e o logotipo VW 1600 acrescido do “L” na tampa do motor. Internamente o luxo no acabamento dava o tom para essa versão: estofamento moldado à mão forrado em couro natural, incluindo as laterais de porta, novo descansa-braço, mais anatômico, assoalho interno e do porta-malas revestidos em carpete tipo buclê de náilon, painel contendo relógio elétrico, acendedor de cigarros e rádio com quatro faixas de onda, de excepcional sonoridade. Trazia ainda buzina dupla com funcionamento regulado por um relê. Opcionalmente eram oferecidos bancos dianteiros reclináveis.
Sob o título “É o nosso Volks, com luxo” a coluna “Painel” da revista Quatro Rodas de julho de 1969 fala rapidamente da nova versão de luxo. Na foto é possível identificar o interior luxuoso, com o padrão de forração com costura em gomos revestido em couro natural e a opção de bancos dianteiros reclináveis:
Em relação ao conjunto mecânico, permanecia o mesmo confiável motor 1600 a ar que estreara alguns meses antes. Esta versão era tratada pela Volkswagen como “uma versão sofisticada para quem gosta de carros requintados”. Não há registro de quantas unidades do VW 1600-L foram produzidas porque a VW não diferenciava este modelo do VW 1600 comum em termos de identificação do número do chassi. Hoje, só há uma certeza: restaram pouquíssimos exemplares originais desta versão para contar a história!
Mas parece que o prazo de validade passou rápido para o VW 1600. Lançado em janeiro de 1969, como um sucesso, foi perdendo fôlego rapidamente, o que exigiu uma versão mais sofisticada ainda em junho de 1969 e chegou ao seu primeiro facelift em fevereiro de 1970, ou seja, praticamente um ano após seu lançamento. Algumas mudanças vieram a reboque do lançamento do segundo integrante da família Tipo 3 no Brasil: a VW 1600 Variant, que obteve um grande sucesso no lançamento e possivelmente ofuscou o ainda recente VW 1600.
Em 7 de fevereiro de 1970 foi publicada a coluna “De roda em roda” do jornalista Paulo Menezes, no O Globo, destacando como as modificações introduzidas pela Volkswagen pretendiam afastar os boatos sobre o encerramento da produção do VW 1600:
Estes boatos davam conta de um eventual encerramento da produção do VW 1600 ou a introdução de modificações mais profundas em sua frente e traseira. Mesmo que nenhum deles tenha se confirmado, uma onda de “notícias ruins” como essa é suficiente para ofuscar qualquer automóvel no mercado, pois deixa o consumidor inseguro em função das perdas que teria com a aquisição de um modelo desatualizado ou até mesmo, que logo estaria fora do mercado.
Ainda em fevereiro, a Volkswagen apresentou formalmente as modificações que introduziu no VW 1600 para o ano de 1970: novo estofamento com costura em gomos tal como era a do VW 1600-L e na nova Variant; novo para-choque de uma lâmina apenas, ao invés de lâmina dupla como no modelo anterior; frisos laterais na “linha de cintura” do carro, tal qual o VW-1600-L; alça de segurança para o passageiro da frente reposicionada para o lado direito do painel; faróis mais elegantes, com os frisos cromados mais finos, suavizando a dianteira do carro; maior vão livre na parte dianteira. E, por fim, uma última e bizarra opção: os freios a disco permaneciam de série, mas havia a opção de freios a tambor… essa, uma evolução inversa!
Na matéria “VW-1600: modelo 70 com estilo mais requintado”, publicada no O Globo de 21 de fevereiro de 1970, são dados os detalhes deste facelift:
A maior novidade para 1970 era que, mesmo com todos os novos itens, o preço não se alterou, permanecendo o mesmo de 1969. Essa talvez tenha sido a estratégia adotada para manter o VW 1600 competitivo no mercado, pois estava claro que já havia começado a perder o fôlego.
Na propaganda que se segue, publicada no dia 19 de fevereiro de 1970, a manutenção do preço é destacada explicitamente como sendo uma das grandes novidades:
Aqui termina a Parte 2 desta matéria, e na Parte 3 vamos ver o que ocorreu com o VW 1600, o seu segundo facelift, e que acontecimentos ocorreram para agilizar o seu ocaso.
Na parte 3 também mostraremos as diferenças entre os diversos modelos, com o intuito de ajudar os aficionados a diferenciá-los mais claramente, uma documentação imperdível.
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AG
Hugo Bueno colaborou nesta matéria