Nos primórdios do beisebol, nos Estados Unidos, surgiu um time que foi chamado de Highlanders. A denominação durou cerca de dez anos e foi finalmente alterada para Yankees em 1913. Pouco tempo depois, em janeiro de 1915, sofrendo de dificuldades financeiras, os sócios resolveram vender o time, o preço pago pelos novos proprietários foi de US$ 460.000 (valor da época).
Transformando os números para a nossa linguagem, descobrimos que com a soma que foi disponibilizada por Jacob Ruppert e seus sócios para arrematar o time promissor, era possível montar uma frota de 1.000 Ford T 0-km. Caso uma encomenda como esta chegasse para a empresa, que inaugurou o sistema de produção em série instalando um transportador contínuo no início de 1914, a Ford levaria um dia de trabalho para completar a entrega das mil unidades.
Em 1915 a capacidade de produção do modelo T era dez vezes maior do que no seus primórdios e o preço unitário de venda havia caído pela metade. Na década seguinte o preço do Ford T reduziria ainda mais 50%. Metade da metade é 25%.
Hoje o NY Yankees vale US$ 2,5 billhões. Ou uma frota de 100.000 Ford Mustang, bem mais do que um ano inteiro de produção do modelo.
Apesar do registro histórico indicar que a alvorada do automóvel ocorreu ainda no século 19, a maioria da força do que se chama de indústria automobilística tem, ao meu ver, exatamente um século de existência. Não por que Ruppert mudou a história do beisebol americano há justamente 100 anos atrás, mas porque com a nova capacidade de produção de 26.000 unidades por mês Ford e seu modelo mais popular proporcionaram a partir daquele momento a difusão da invenção que completava 30 anos de existência desde que Karl Friedrich Benz dirigiu o seu primeiro protótipo em 1886.
Basta notar também que várias marcas e empresas do ramo estão passando pelo seu centenário neste momento. As linhas de montagem de automóveis e a invasão das cidades pelo moderno meio de locomoção começavam a tomar forma cem anos atrás.
Podemos encontrar registros indicando que em 1895 já era possível encomendar um veículo na França ou na Alemanha, catálogos com as características da novidade começaram a surgir nas maiores e mais ricas cidades da Europa. Porém, as primeiras três décadas do automóvel não foram mais do que uma etapa de preparação do mundo e da humanidade para poder acolher esta máquina fascinante. Na virada do século, apenas 10.000 carros circulavam nos Estados Unidos e outros 10.000 haviam sido produzidos na Europa. Veículos fabricados de modo artesanal e que custavam fortunas, que somente os mais abastados poderiam ousar neles investir.
Chegando em 1915 encontramos uma nova situação, principalmente devido ao inovador sistema de montagem com produção em série. Naquele momento poder-se-ia almejar um carro novo por um valor mais acessível, cerca de US$ 500 (mais ou menos US$ 10.000 de hoje). Isso permitiu que o automóvel passasse a ficar ao alcance das famílias de classe média, algo que nunca fora possível antes.
Outros fatores contribuíram para o progresso do mercado automobilístico nos Estados Unidos a partir de 1915: a descoberta de novos campos para extração de petróleo, que proporcionou a redução do preço da gasolina, e a recente aparição do motor de partida elétrico, que simplificou sobremaneira a vida dos motoristas de então, principalmente das motoristas, são exemplos dos ventos que começaram a soprar a favor do uso do carro.
Foi em 10 de dezembro de 1915 o milionésimo Ford foi produzido. A partir deste ponto podemos dizer que surge uma indústria e uma tendência de força econômica em volta do mundo do automóvel.
Neste cenário, caso meu avô quisesse comprar um carro em 1915, o que ele teria de opções?
Na Europa já estavam disponíveis marcas como Renault, Rolls-Royce, Alfa Romeo, Fiat, Audi, Bugatti, Škoda, Lancia, Vauxhall, Benz (depois, Mercedes-Benz), Opel, ficando uma menção honrosa à Peugeot que é a mais antiga marca produtora de automóveis do mundo, fundada em 1810, ainda que só viesse a produzir automóveis no final dos anos 1890.
Nos Estados Unidos já estavam disponíveis marcas como Buick, Cadillac, Chevrolet, Dodge e Ford.
No Japão já existia alguma indústria e as empresas que originaram a Daihatsu e a Suzuki haviam iniciado suas operações antes de 1915, porém o Japão daquela época não estava ainda pronto para os automóveis.
Estas são as marcas que romperam a barreira dos 100 anos e estão vivas até hoje. Inúmeras outras opções de compra existiam, entretanto. Muitas delas uma verdadeira opção personalizada em que o interessado em um automóvel comprava o chassi rolante e encomendava a uma oficina encarroçadora a sua vontade sobre rodas.
Estamos em 2015 e, na minha opinião, 100 anos atrás o mundo começava a tomar a forma que conhecemos hoje. Antes disso já existiam cidades e civilizações. Porém no meu entender o mundo com a cara de ruas, estradas e, principalmente, os automóveis e todo o aparato criado em torno do ser humano motorizado, tem esta idade, e com o automóvel começa a surgir algo novo na existência humana. A facilidade de mudar de endereço, trocar de cidade ou conhecer outras comunidades, e com isso iniciar a miscigenação de cultura e tradições, desenho antigo da humanidade, mas que ganhou muita força naquele momento, proporcionada também pela maior simplicidade no acesso ao automóvel e a existência de alguma infraestrutura para poder usufruir deste fantástico invento da humanidade.
O que mais acontecia pelo mundo nesta época? Além do início de um longevo sucesso do Yankees de Nova York, e do fato de meu avô estar iniciando a sua vida adulta, bem como o seu trabalho em uma fábrica de rodas para carruagens, o mundo experimentava um conflito armado em algum canto da Europa, que se transformaria no registro histórico da Primeira Guerra Mundial.
E como já sabemos, o esforço de guerra é uma fonte de transformação.
Surge também uma nova personagem automobilística, talvez o segundo automóvel mais importante da história até então, depois obviamente do Motorwagen de Benz, uma limusine de luxo da Gräf & Stift, o Double Phaeton, fabricado em 1911.
O Gräf & Stift transportava Francisco Ferdinando e sua esposa Sophie Chotek pelas ruas de Sarajevo, no dia 28 de junho de 1914. Depois de escapar de um atentado a granada, que deixou sua comitiva ferida em outro carro, Ferdinando, príncipe-herdeiro do Império Austro-Húngaro, foi alvejado quando cruzava uma ponte da cidade. Devido ao incidente anterior, ocorrido antes do evento que Ferdinando atendeu na Prefeitura local, o comboio deveria ter alterado a rota, evitando o centro da cidade, porém o carro em que ele estava seguiu o plano original. Quando o motorista foi alertado e iniciou a manobra de retorno, o sérvio Gavrilo Princip apareceu na multidão e disparou contra o veículo. Ferdinando e sua esposa morreram em decorrência do novo atentado. O Império fez um ultimato à Sérvia, que vinha cometendo atentados diversos, não foi atendido, e a guerra começou. França, Grã-Bretanha e Rússia apoiaram a Sérvia, e Alemanha e Itália ficaram do lado do Império, tornando um conflito local em mundial. Os Estados Unidos, neutros, entraram na guerra em abril de 1917 ao lado dos franceses, britânicos e russos, mas estes abandonaram a aliança quando irrompeu a revolução russa em outubro. A guerra terminou em novembro de 1918 com a derrota dos italianos e alemães.
Um advento tecnológico surgido na Primeira Guerra Mundial foi o tanque, seu desenvolvimento iniciou-se também em 1915 na Inglaterra e na França. Esta máquina foi sugerida e concebido por Eugène Brille, engenheiro-chefe da Schneider e projetado pelo coronel Estienne, o “pai dos tanques”, entre maio e setembro de 1915. O tanque foi utilizado pela primeira vez pelos franceses durante a ofensiva do general Nivelle de abril 1917, em Berry-au-Bac, onde existe atualmente um memorial registrando o fato. Sem muito sucesso, o Schneider CA-1 deixou espaço para o desenvolvimento da Renault e seu FT, um veículo pioneiro cujas características básicas ainda são encontrados em tanques modernos.
Os modelos franceses seguiram em paralelo ao desenvolvimento feito pela Inglaterra e o seu “Little Willie”. O primeiro tanque britânico foi derivado de uma série de projetos que remontam também ao início de 1915. Apesar de seu nome aparentemente meigo, o “Little Willie” era na verdade uma máquina de guerra impressionante, concebido para avançar sobre as linhas alemãs. O projeto imaginava um veículo capaz de atravessar qualquer tipo de trincheiras, destruindo arame farpado no processo. O Comitê Landships foi criado em fevereiro de 1915 como uma pequena comissão de guerra britânica de ministros, chefiado por Sir Winston Churchill e composto de vários políticos, engenheiros e diretores, com o objetivo de produzir o primeiro veículo blindado antes do final de 1915.
O nome tanque teria surgido do fato de que, para camuflar o seu transporte para o campo de batalha, escrevia-se “tank” nas grandes caixas de madeira nos quais eram embalados antes de serem transportados por trem, como se fossem grandes tanques de armazenamento de líquidos.
Meu avô viveu essa guerra mas nunca teve um automóvel, e isso não era estranho até a primeira metade do século 20.
Hoje devemos ter mais de 1,2 bilhão de veículos em uso pelo mundo afora (perto de 1/4 deste total apenas nos Estados Unidos). Em 1950 eram cerca de 60 milhões de automóveis. Não deveriam ser mais de 4 milhões em 1915 (2 milhões nos EUA).
Mas já estavam provocando o interesse dos entusiastas da época. Meu avô (materno) trabalhava para o dono da fábrica de rodas de madeira para carruagens e, curiosamente, este senhor era também o primeiro marido da minha avó. Ele adoeceu e faleceu de repente, tendo pedido para o meu avô ficar com a empresa e a esposa. E assim foi.
Com a virada que o destino provocou na sua vida, meu avô poderia imaginar comprar um carro, ou pesquisar o que estava disponível na época.
As ferramentas de busca não eram nem de perto tão abrangentes como as atuais, porém meu tio mais velho, único filho do primeiro casamento da minha avó, como tivesse seguido a profissão de jornalista, tinha acesso aos meios de comunicação com outros países e poderia ajudá-lo.
O que meu avô, teria então desejado possuir como um automóvel naquele momento? Chega a soar como uma das matérias do MAO, mas se trata de um tempo 90 anos antes do nosso.
Uma lista, imaginando os modelos 0-km disponíveis na Europa, poderia ser:
Rochet Schneider Type 9300 (Exótico)
Nos idos de 1914 e 1915 existiam seis modelos de Rochet-Schneider disponíveis, com seus motores de 4 ou 6 cilindros que poderiam produzir de 15 a 50 cv.
Renault 2 cilindros, Type EK (Simples)
Depois de ir conhecer o sistema de produção americano, Louis Renault investe em sua capacidade produtiva na França, cerca de 6.000 pessoas se encarregavam da produção de modelos como o EK. A capacidade anual da empresa era de 10.000 unidades.
Martini GT de 1915 (Exclusivo)
A Família de empreendedores suíços Dardel ousou lançar uma marca de automóveis. O modelo GT disponível em 1915 era luxuoso e competente. O nome Martini vinha do responsável pela idealização do automóvel, Friedrich von Martini, que era engenheiro formado pela Escola Politécnica de Karlsruhe, na Alemanha. Suas duas filhas se casaram com dois irmãos Dardel. O curioso é que como Martini havia também inventando um tipo de fuzil, com inovador carregamento da munição pela parte posterior, durante alguns anos a logomarca da empresa de veículos fazia referência ao inusitado armamento.
Le Zèbre Cabriolet 1915 (Esperto)
Com uma concepção de estrutura mais leve os veículos Le Zebre fizeram sua história na indústria automobilística francesa, econômicos e ágeis levaram ao Ministério da Guerra francês a encomendar cerca de 150 exemplares para aparelhar a sua Artilharia Especial durante a 1ª Guerra.
Delage 1915 (Ousado)
Mais um corajoso francês, Louis Delage, arriscou fabricar veículos em uma pequena oficina começando em 1905, com a ajuda de apenas três empregados. Inicialmente utilizando motores DeDion-Button, Delage já tinha seu próprio projeto de unidade motriz em 1909 e dez anos depois do ousado início era capaz de produzir mais de 1000 veículos por ano.
Benz 22/55 (Tanque)
O Benz 25/55 foi produzido até 1920, pesava quase 2 toneladas e era dotado de motor de 6 cilindros, 6,5 litros e 55 cv. Alcançava a velocidade máxima de 85 km/h.
Austin 30hp (Esnobe)
Um legítimo representante da fleuma inglesa, os Austin eram clássicos das ruas inglesas do início do século XX. Hoje a marca pertence a um grupo chinês depois de passar por diversas mãos como a Morris e BMC, British Aerospace e BMW, além da parceria com a Healey. Os últimos carros a usar o logo Austin foram produzidos em 1987, no entanto os mesmos veículos, Maestro e Montego, seguiram em produção até 1994 sob a tutela da Rover. Entretanto, não ostentavam mais uma “marca” e ficaram órfãos por sete anos, não eram Austin nem Rover, chamavam-se apenas Maestro e Montego.
Audi Type G 8-22 (Competente)
O Tipo Audi G foi um carro produzido entre 1914 e 1923 pela Audi. Com mais de 1.100 exemplares vendidos, foi um dos maiores sucessos da marca alemã antes da sua integração à Auto Union em 1932. Pesava 1.250 kg e era capaz de chegar a 70 km/h.
Dasse 1914 (Arriscado)
Automóvel belga de construção leve, trazia motores variados, partindo de 1,5 litro e 12 cv indo até 50 cv. Ousou também ao aplicar a incrível tecnologia derivada de motores de aviação, onde temos um cabeçote sem válvulas, em um motor de 3,5 litros, sendo que duas camisas de cilindro movimentam uma ao interno da outra, permitindo assim as aberturas de admissão e escapamento.
Lancia Theta (Emocionante)
Com 35 cv, o Lancia Theta substituiu em 1913 o Epsilon, que era menor e menos potente, e foi um sucesso imediato para a Lancia, vendendo em boa quantidade por mais de cinco anos. Foi um dos primeiros modelos Lancia que permitiu demonstrar os ideais inovadores de Vincenzo Lancia. Um novo sistema elétrico para a iluminação foi implementado e, pela primeira vez em um carro europeu, não foram era mais utilizada a manivela de partida. Foi ainda em 1915 que a Lancia patenteou o primeiro de seus motores com configuração em “V” de ângulo reduzido, que tornaria a empresa famosa nos anos posteriores.
O Lancia teria grandes chances para ser o carro do meu avô, mas antes de decidir ele teria visto as opções para encontrar um modelo em território americano:
Ford T (Imperdível)
Entre 1915 e 1916, a Ford fez algumas mudanças em seu Modelo T, incluindo pára-lamas curvos e um nova parede de fogo entre o motor e a cabine. Nesta época o modelo ainda não tinha um painel de instrumentos, que só apareceu juntamente com a partida elétrica em 1919.
As pessoas que queriam um velocímetro deveriam instalar o seu próprio, retirando o movimento de uma engrenagem na roda dianteira direita. O controle da velocidade raramente era uma preocupação, porém era interessante manter o controle de quilometragem para fins de manutenção.
Buick 55hp (Desafiante)
Demorou até 1914, quando a Primeira Guerra Mundial eclodiu, para a Buick novamente poder alcançar e superar a marca de produção inicial de 1910 — cerca de 33.000 carros. Apesar da guerra, ou talvez por causa disso, a produção continuou a subir até que, em 1916, ele atingiu um novo pico de 125 mil carros. O ano de 1915 marcou a decisão da Buick em entrar no campo de seis cilindros e produzir um carro potente que deveria ser vendido na faixa de preço médio, proporcionando desempenho de luxo. O resultado foi o modelo D-6-55, denotando um motor de seis cilindros que entregava uma potência de 55 cv.
Stutz (Interessante)
Fazendo apologia à “Era sem Cavalos” o anúncio do novo Stutz chamava a atenção do consumidor para o Preço, Qualidade e Desempenho. Mais compacto e com a indefectível qualidade de construção “duplicada”, US$ 1.475 eram pedidos para que o modelo fosse levado para casa.
Overland Six (Potente)
Uma outra opção era um Overland Six, indicando que o seu modelo apresentava um “substancial” seis-cilindros, e era grande, segundo a chamada, maior do que os mais populares seis-cilindros da época: 45 hp, pneus largos e espaço para sete adultos completavam a atratividade desta versão.
Sphinx (Misterioso)
Entrega imediata e a garantia de um carro correto, por dentro e por fora. Precisa de algo mais?
Marathon 106 (Competitivo)
O Marathon buscava alcançar dois objetivos com a sua propaganda carregada de adjetivos enaltecedores das fantásticas propriedades dos seus modelos. Um alvo era o motorista interessado em adquirir um “star performer” e o outro era conquistar representantes interessados em distribuir o produto, “melhor ligar ou escrever hoje”, indicava a chamada no final do texto. Mesmo que ligar ou escrever naquela época fosse tarefas bem diferentes do que estamos acostumados a fazer hoje.
Partin-Palmer Touring (Suficiente)
O anúncio era muito honesto, indicava as características do carro e seu preço competitivo. Não indicava a cilinrada do motor, mas dava todas as dicas para que pudesse ser calculado. Quatro cilindros, 3,5 polegadas de diâmetro por 5 polegadas de curso = 192,4 pol³ = 3.152 cm³. E basta.
Dodge Brothers Winter Car (Protegido)
Em 1914, a Dodge havia produzido seu primeiro automóvel, e na seqüência mais 230 carros Dodge saíram da nova fábrica naquele ano. Os irmãos Dodge não eram novos no cenário automobilístico dos EUA, mas tinham tomado a decisão de fazer o seu próprio veículo após imbróglios e relacionamentos que se complicaram com o tempo, principalmente com Henry Ford. Para 1915 a produção atingiria um total de 45.000 unidades, em setembro deste ano a marca anunciava a versão de inverno do seu veículo. A partir da versão standard (Touring) um teto rígido e desmontável era adicionado: por US$ 165 a mais você poderia desfrutar da comodidade de não viajar ao relento. Uma das características avançadas dos Dodge era a carroceria e chassi totalmente em aço, sem peças de madeira que ainda apareciam em outros fabricantes do momento.
Light Baker Electric Coupe (Chocante)
Bem, no começo da movimentação humana autônoma sobre rodas, os motores a vapor e elétricos superavam em muito o uso de motores a gasolina. Mas isso foi só no começo. Mesmo que em 1915 ainda se pudesse comprar um interessante Light Baker Electric Coupe, esta opção tornava-se cada vez menos atraente. O custo de produção não conseguia ser mais competitivo com a nova realidade de linhas em série e, além disso, os novos preços (mais baixos) da gasolina, devido ao aumento de produção e de descoberta de poços de petróleo em território americano, aliado às maiores distâncias a serem percorridas nas novas estradas, impediram naquele momento a continuidade da opção do carro elétrico.
Maxwell Tourer de 1915 (Resistente)
No começo dos anos 1900, a Maxwell Motors era um dos grandes fabricantes de automóveis dos Estados Unidos e, conseqüentemente, do mundo, ao lado de Buick e Ford. A Maxwell compunha a maior capacidade de produção da época. Como terceiro produtor americano, seu modelo de 4 cilindros e câmbio de três marchas chegou à marca de 100.000 unidades entre 1914 e 1916
A Maxwell Auto Sales Company ficou famosa também por outra cifra, 22.461 milhas (36.147 km) rodados por um exemplar sem paradas para manutenção. Um modelo normal de produção normal e voltado para o uso no dia a dia, foi o herói desta conquista. Mas não era a primeira vez que a Maxwell desafiava os limites dos seus produtos. Em duas oportunidades anteriores já haviam desafiado a resistência das suas máquinas, em 1909 rodando 3.000 (4.828 km) e em 1912 percorrendo um total de 10.000 milhas (16.093 km).
Em 1915 novamente, era 22 de novembro daquele ano quando o motor de um Maxwell Touring foi colocado para girar em Los Angeles. Daquele dia até 6 de janeiro do ano seguinte por mais de 1.000 horas o motor não parou de funcionar e nenhum ajuste ou conserto foi realizado. Três motoristas foram utilizados para o completar o feito. O carro rodava na estrada por 24 horas ao dia parando apenas para completar óleo e gasolina (situação em que o motor era mantido em funcionamento). O menor percurso diário foi de 438 milhas (705 km) e o maior foi de 666 milhas (1.072 km).
E escolha do meu avô?
Meu avô teria escolhido um desses Maxwell, tenho certeza. E repetiria a história do recorde, muitas e muitas vezes.
Em janeiro de 1914 Henry Ford começou a pagar um salário de US$ 5 por dia. O dobro do que outros industriais ofereciam e muito mais que os trabalhadores do campo ou das minas de carvão poderiam sonhar em receber por uma jornada de trabalho.
Embora tenha surpreendido e indignado seus pares, Ford havia calculado, corretamente como se viu, que pagar mais permitiria aos seus trabalhadores adquiri seus próprios carros da Ford e, ainda, reduzir absenteísmos e a rotatividade dos empregados nas fábricas da empresa. Criaria uma força de trabalho leal que iria aumentar a produtividade e os lucros a novos patamares.
Henry Ford criou um potencial de mercado com a sua decisão. De 1915 em diante a compra de um automóvel passou a ser um desejo possível de se transformar em realidade, inicialmente nos EUA e depois no resto do mundo. Por isso proponho comemorarmos em 2015 um século de sucesso da indústria e do mercado automobilístico, provavelmente o único bem de consumo que atravessou mais de 100 anos sem ser deposto por um produto alternativo ou substituto.
Meu avô viu duas guerras mundiais e conheceu o advento do automóvel, teve seis filhos e viveu em dois países diferentes. Durante as refeições em família ninguém ousava levantar-se da mesa antes dele. Quando o peso da idade chegou, passou a caminhar apoiado em uma bengala; dentro do tubo da bengala havia uma espada. Foi um grande homem. Pena que não gostava dos Yankees…
FM