Publieditorial: saiba sobre essa ação.
Um dos principais lançamentos recentes no nosso mercado, sem dúvida, é o Jeep Renegade. Pelo fato de ser fabricado aqui, ser um Jeep compacto, ter um desenho bem diferente, uma série de equipamentos interessantes e também por ter a opção de motor Diesel, até então disponível apenas em utilitários ou em suves importados.
A primeira pergunta que nos vem à cabeça é por que não temos carros a diesel no Brasil. Em 1976 o abastecimento de diesel em carros de passeio foi proibido para deixar esse combustível apenas para veículos de carga. O Arnaldo Keller explica bem o que acontecia na época, o por quê da proibição, e como ela não faz o menor sentido hoje em dia, na matéria sobre a situação dos combustíveis no Brasil.
E assim, para um modelo a diesel poder ser comercializado no Brasil ele deve ter capacidade de carga igual ou superior a 1.000 kg. Ou seja, ter um apelo utilitário. Isso explica o caso das picapes médias. E até um raro caso da Kia Carnival, que na época em que foi trazida com motor Diesel era especificada com essa capacidade. Mas há exceções que explicam os suves importados e nacionais, como o BMW X5 que testamos recentemente, o próprio Jeep Renegade e outros modelos.
Estão livres da necessidade da capacidade de carga de 1.000 kg veículos classificados como jipe que tenham as seguintes características: tração nas quatro rodas, caixa de mudança múltipla e redutor (“reduzida”), guincho ou local apropriado para recebê-lo, altura livre do solo mínima sob os eixos dianteiro e traseiro de 180 mm, altura livre do solo mínima entre os eixos de 200 mm, ângulo de entrada mínimo de 25º, ângulo de saída mínimo de 20º e ângulo de rampa mínimo de 20º.
Recentemente houve um leve abrandamento nesses requisitos, sendo aceitas pelo Denatran (Departamento Nacional de Trânsito) como redução a primeira marcha muito curta, como no caso do Renegade, que não tem caixa de transferência e em uso normal sai em segunda marcha, e a dispensa da necessidade de provisão para guincho. O interessante é que todos os modelos têm que se enquadrar na categoria jipe.
O Jeep Renegade Trailhawk, que utilizamos para ilustrar essa matéria, usa o moderno motor MultiJet II da Fiat (atualmente FCA, Fiat Chrysler Automobiles), que foi desenvolvido pela FTP (Fiat Powertrain Technologies) em parceria com a GM (também é utilizado no Cruze, além de outros modelos da FCA) e que tem o sistema Common Rail da Bosch. Importado da Itália, trata-se de um 2-litros, com duplo comando, 16 válvulas, bloco de ferro fundido, cabeçote de alumínio, e turbocompressor de geometria variável (VGT, a sigla em inglês), que dispensa a válvula de alívio (wastegate).
E para aprendermos mais sobre seu sistema de injeção, eu e o primo Arnaldo fizemos uma viagem — com o Renegade Trailhawk — até a unidade da Bosch em Curitiba (PR). Lá visitamos a linha de fabricação de injetores, conhecemos o novíssimo e um dos mais modernos e bem aparelhados laboratórios de testes de motores do mundo, e também tivemos uma conversa muito rica com Daniel Korioth, presidente regional da Robert Bosch Ltda., e Mário Massagardi, vice-presidente de Engenharia da empresa.
A equipe de engenheiros da Bosch, em Curitiba, foi responsável pela calibração do sistema e testes dos veículos para homologação no mercado nacional. Além de fornecedora do sistema de injeção diesel, a empresa também está presente nos outros modelos da linha Renegade com o fornecimento de componentes como alternador e motor de partida, bobina de ignição, além dos mais diversos sensores como o de fase, pressão, temperatura ambiente, bateria, temperatura e medidor de massa, pressão e temperatura do turbo, oxigênio (sonda lambda), pressão diferencial, vela aquecedora, unidade de controle da vela aquecedora, estacionamento traseiro e o sistema para estacionamento semi-autônomo (este último foi objeto de outra matéria sobre um sistema Bosch fornecido para o Renegade). A unidade de controle eletrônico (ECU) das bolsas infláveis também é fornecida pela Bosch.
Aproveitamos essa viagem de ida e volta de São Paulo a Curitiba, e outra que fiz com o Juvenal Jorge para o interior de São Paulo, para explorarmos as diversas condições de uso do Renegade a diesel, neste caso a versão topo-de-linha e 4×4, a Trailhawk.
O motor Diesel tem um forte apelo para veículos fora-de-estrada pelo seu torque elevado já em baixíssimas rotações e também pela faixa de rotações mais contida. Para se ter uma idéia, a potência máxima de 170 cv, no caso do Renegade, é obtida a 3.750 rpm, e o elevado torque de 35,7 m·kgf já está disponível a 1.750 rpm, sendo bem presente já na marcha-lenta. Essa condição permite transpor obstáculos com força e tração e um bom controle de rotação pelo acelerador. Procuramos algumas aventuras com o jipinho que serão objeto de outra matéria.
E nos carros de passeio, automóveis ou utilitários? A grande vantagem está no consumo mais baixo, que se traduz em uma autonomia maior, além de menos emissões de CO2. De maneira geral e comparando motores com tamanho e desempenho similares, os Diesel consomem entre 25 e 30% menos combustível, além de poluírem menos.
Mas em estradas ou em uso normal o comportamento é um pouco diferente, justamente pela faixa de rotação ser mais estreita. Isso não quer dizer que seja pior ou melhor que motores ciclo Otto. Na verdade, em algumas situações é até melhor devido à alta potência ou torque em baixas rotações.
Os motores Diesel são entre 10 e 15% mais caros e compensam no caso de quem roda mais que 10.000 km por ano ou simplesmente queira ter mais autonomia. Aqui no Brasil fica muito difícil fazer essa comparação; até mesmo no caso do Renegade isso é complicado.
Todos os Renegade com motor Diesel têm, além do motor, a caixa automática epicíclica de 9 marchas e a tração 4×4, com outros componentes que são “pendurados” nesse equipamentos, como, por exemplo, o sistema Select-Terrain. Além do que o desempenho com o motor diesel é notavelmente superior em relação ao E.torQ 1,8-litro flex com potência de 132 cv a 5.250 rpm e 19,1 m·kgf de torque a 3.750 rpm quando com álcool (com gasolina, 130 cv e 18,6 m·kgf, mesmas rotações).
Então fica fácil de entender que essa comparação não faz sentido nesse caso. Nos Estados Unidos existem estudos demonstrando que no período entre 3 e 5 anos, computando todos os gastos com a compra do veículo, manutenção, seguro, combustível e, no final, o valor de revenda, os modelos Diesel podem ter um saldo positivo entre 2.000 e 7.000 dólares. Isso é no mínimo interessante. Na Europa, para quem quiser fazer simulações, existe um site da própria Bosch onde é possível comparar modelos a diesel com os a gasolina. Infelizmente está só em inglês, mas é bem fácil de usar e entender: http://www.fuel-pilot.com/.
Eu, o AK e JJ testamos o Renegade e a conclusão que nós três chegamos é de que o conjunto motor Diesel-caixa automática ZF de 9 marchas é muito prazeroso. Estamos falando de um carro com motor 2-litros e que pesa 1.674 kg. E que mesmo com esse peso faz de zero a 100 km/h em menos de 10 segundos graças ao elevado torque e à potência em baixa rotação resultante. O desempenho na estrada é ótimo e até bem entusiasta, com retomadas convincentes. Outro ponto que gostamos muito é a suavidade. Motores Diesel são conhecidos por vibrarem mais e serem mais ruidosos, mas isso é passado.
Parte disso era devido ao antigo sistema de injeção mecânico bem diferente dos modernos Common Rail. Os motores Diesel atuais melhoraram de modo significativo nesse quesito, a ponto de elogiarmos o Renegade. Apenas do lado de fora pode se escutar aquele som característico do motor diesel.
Lançado em 1997, o sistema de injeção de diesel de alta pressão conhecido como Common Rail Bosch foi um marco no caminho para veículos amigos do meio ambiente. Até 2010, a tecnologia permitiria que os níveis de emissões tóxicas fossem reduzidas em mais de 96% em comparação com a linha de base de 1990.
O sistema Common Rail CRS2-16 que equipa o Renegade e uma enorme gama de modelos disponíveis em outros mercados utiliza uma bomba de pistão radial lubrificada pelo próprio combustível e gera uma pressão de 1.600 bar. O combustível então é enviado para uma galeria de alta pressão (o rail) que alimenta os quatro injetores. Estes por sua vez possuem válvulas eletromagnéticas (solenóides) controladas pelo módulo eletrônico (ECM) que liberam o combustível para ser atomizado pelos bicos na quantidade e no momento certos, com capacidade para até oito injeções por ciclo para melhorar a combustão e diminuir o consumo.
O módulo eletrônico de controle ainda faz o gerenciamento da válvula de recirculação de gases do escapamento e da pressão de sobrealimentação.
Na reunião que tivemos o Sr. Massagardi foi-nos explicado em detalhes as diferenças entre as emissões dos motores Diesel e Otto. Os dois principais poluentes emitidos por motores Diesel que são controlados e prejudiciais são material particulado (combustão incompleta) e os óxidos de nitrogênio, os famosos NOx. O NOx não é formado a partir do combustível, que não contém nitrogênio, mas sim de reações com o ar a altas temperaturas. O NOx ajuda a formar o smog, ou névoa fotoquímica, visível quando existente e somente com a incidência de raios solares. Já nos motores a gasolina/flex os principais componentes prejudiciais são o monóxido de carbono (CO) e os hidrocarbonetos (HC), estes restos de combustível não queimado.
Em ambos os motores também há a emissão de CO2, que não faz mal à saúde, mas colabora para o efeito estufa. O CO2 é produto da combustão e é diretamente proporcional ao consumo de combustível. Na Europa, hoje, o limite máximo para emissão de CO2 é de 130 g/km nos chamados limites EURO 6. Em 2020 esse limite baixa para 95 g de CO2 por km. E aí está a grande dificuldade dos fabricantes. Há muito o que fazer em termos de tecnologia e complexidade nos motores e trens de força para atingir esse limite.
Como os motores a diesel são bem mais econômicos que motores a gasolina, é aí que eles levam vantagem e por isso são tão populares na Europa, alcançando mais de 50% de participação de mercado.
Para atingir esses níveis de consumo existem alguns estágios de desenvolvimento que já estão sendo aplicados e tecnologias que ainda podem ser aplicadas partindo de um carro atual e de referência chamado de D0. O D0 é um carro médio pesando 1.370 kg, tem um motor turbodiesel com injeção direta e sistema common-rail, e emissões de CO2 de 144 g/km equivalentes a algo em torno de 18 km/l. Para facilitar o entendimento imagine um Golf. Para reduzir ainda mais o consumo do D0 ele recebeu um pacote tecnológico levando-o para o estágio D2 com redução de emissão de CO2 para 104 g/km e quase 25 km/l de consumo e em alguns casos até 30 km/l. Esse pacote tecnológico é composto por: otimização da combustão, sistema Start/Stop, melhorias no balanço térmico do motor, diminuição de atrito no motor e agregados, câmbio com mais marchas para reduzir as rotações de trabalho, redução do tamanho do motor passando de 2,0 para 1,6 litro (continuando com 4 cilindros) e catalisador para NOx.
O catalisador de NOx permite otimizar a combustão para uma melhor eficiência, condição que aumenta o NOx que por sua vez agora é neutralizado no catalisador (o Renegade tem esse catalisador). O próximo pacote, o D3, é basicamente constituído de downsizing, ou seja, diminuir a cilindrada e o número de cilindros. Porém isso ainda não chegou aos motores Diesel. E os chamados D4 são carros com tudo isso e que já são capazes de atingir os limites de 2020. Há alguns poucos carros subcompactos e compactos realmente muito econômicos, mas o desafio maior é dos médios e acima incluindo os suves.
Nesse caso para se reduzir ainda mais o consumo e assim emissões, e atingir os níveis D5 e D6, há outras tecnologias que já estão sendo desenvolvidas e em alguns casos já até estão disponíveis, como otimização do fluxo do combustível/mistura no motor, recirculação de gases de escapamento de baixa pressão com captação de gases queimados depois do turbo, redução ainda maior de atrito, melhorar a admissão do motor, turbo com rolamentos e diminuição da taxa de compressão (encontrar o ponto ótimo entre esforço para uma alta compressão e a potência obtida). Essas medidas ainda podem trazer um consumo entre 10 e 15% menor e obtendo-se algo até superior a 30 km/l de consumo.
Para carros compactos (de peso até 1.370 kg) e abaixo é possível atingir os limites de 2020 sem a eletrificação, ou hibridização. O interessante é notar que todo esse desenvolvimento é feito a partir da imposição de limites ou restrições que visam a preservação da nossa saúde.
No Brasil a coisa é um pouco mais complexa. Para caminhões pesados utilizamos a norma européia e para carros de passageiros e comerciais leves, a base da norma americana. O fato curioso é que hoje não há limites impostos para consumo de combustível. O que temos é o programa voluntário de etiquetagem do Inmetro que dá um norte para os consumidores poderem comparar dados de consumo em ciclos-padrão. Mas é um programa voluntário e nem todos os fabricantes o aderiram, porém a grande maioria está lá. Quem quiser consultar veja aqui. E a partir de 2017, os fabricantes que aderiram ao programa Inovar-Auto terão que atingir limites de consumo que serão definidos. Isso com certeza trará uma nova onda de desenvolvimento de motores para o consumido brasileiro.
Com o Renegade, na viagem para Curitiba, incluindo trechos de serra e trânsito intenso, fizemos uma média de 13 km/l. Em outra viagem, andando bem comportado, o Arnaldo fez 18 km/l. E a 80 km/h chegamos a fazer 21 km/l. Considerando o peso, o desenho quase anti-aerodinâmico e os pneus de uso misto do Renegade, essa média que obtivemos é excelente. Em carros como sedãs e hatches com certeza essas médias seriam mais altas. Se nós quiséssemos teríamos facilmente completado a viagem de ida e volta para Curitiba com apenas um tanque, já que o do Renegade tem capacidade de 60 litros.
Não seria uma má idéia derrubar essa proibição do diesel para carros de passeio no Brasil e deixar o mercado, ou o consumidor, fazer sua própria escolha.
E, para fechar a matéria, vale a pena citar que não foi à toa que a Audi conquistou 8 vitórias em Le Mans usando motores Diesel ou sistema híbrido com motor diesel e sistema Common Rail da Bosch.
PK