O progresso tecnológico, principalmente na eletrônica de bordo, tem sido fator importante para a modernização do automóvel, deixando-o mais seguro e confiável. Profissionais de desenvolvimento trabalham para tornar os veículos cada vez melhores, mais bonitos e mais baratos — seu alto preço no Brasil é outra história —, tripé fundamental para viabilizar produtos cada vez mais competitivos dentro do cenário mundial.
Reduzir custos de manutenção, diminuir o consumo de combustível e de emissões de poluentes, elevar os níveis de segurança ativa e passiva, fazer melhor uso dos materiais existentes, diminuir o peso e aumentar o espaço interno, são apenas algumas premissas envolvendo o projeto de um veículo, objetivando oferecer ao consumidor melhores itens de conforto, comodidade e benefícios práticos de ordem geral. O automóvel moderno deve ser apreciado não apenas do ponto de vista técnico, mas também do econômico, para que possa ser oferecido a preço que o cliente possa pagar, tendo seus objetivos atendidos.
Fatores econômicos, tecnológicos, ecológicos e de estilo devem ser considerados simultaneamente pelos fabricantes para enfrentar o elevado nível de competitividade do mercado. Valorização de comportamento, profissionalismo, habilidade, criatividade e talento deve ser cada vez mais estimulada para que haja um time forte capaz de definir e desenvolver o melhor produto para o mercado.
Esta matéria enfoca alguns detalhes importantes na definição e projeto de um veículo.
Começo
Tudo começa no alto escalão da presidência da fabricante, escolhendo o segmento que vai atuar, se no de entrada, dos médios ou dos grandes de luxo, por exemplo. O segmento de entrada gera pouco lucro por unidade produzida, requerendo um grande volume de produção para atingir o objetivo de receita e custos. Já os médios e os grandes de luxo são muito mais lucrativos, porém mais complicados em sua manufatura, principalmente nos detalhes de acabamento e equipamentos fornecidos, requerendo investimento inicial muito maior do que no segmento popular.
No passado, o tempo de gestação de um veículo ficava em torno de cinco anos e hoje em dia são três, no máximo, com tendência a diminuir ainda mais devido à melhoria dos processos virtuais e as comunizações de plataformas, motores e transmissões.
O estilo do veículo é o atributo mais importante na escolha do consumidor. É o que pode ser visto, tocado e avaliado estaticamente de uma maneira totalmente subjetiva. Os designers tem a difícil missão de desenhar um veículo que projete a tendência de oito anos a frente, três de gestação mais cinco de vida útil projetada sem atualizações posteriores (facelifts).
São raros os automóveis que mantiveram o seu estilo praticamente intocado desde o seu lançamento. Um bom exemplo é o Fiat Uno, que foi projetado com boa futurização. Em seu lançamento foi mal interpretado e chegou a ganhar o apelido de “botinha ortopédica”, porém o seu estilo se mostrou brilhante, conseguiu mantê-lo jovem ao longo de mais de duas décadas.
Imagine o leitor como é difícil criar um desenho em curto espaço de tempo e, mais ainda, fazê-lo projetar o seu sucesso em futuro distante. É por este motivo que o departamento de estilo mantém várias criações de prateleira, objetivando aproveitá-las em um novo projeto, mesmo que seja somente em alguns detalhes, e assim ganhar tempo.
Normalmente é feito um modelo em compósito de fibra de vidro, madeira e/ou argila que é submetido a testes em túnel de vento para avaliar e/ou otimizar a sua aerodinâmica. É então submetido a clínicas de marketing para entender a reação do público ao novo desenho e, uma vez aprovado, o modelo é digitalizado em 3 dimensões e enviado à engenharia de carroceria para o detalhamento do projeto.
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Marketing também influencia os outros atributos. Define em bases do mercado que o novo veículo, por exemplo, deverá ser pródigo em consumir pouco combustível, competitivo em sensação de desempenho, líder em segurança etc. As definições de marketing são repassadas a toda engenharia e também à manufatura para que tudo saia a contento e os objetivos do programa sejam plenamente atendidos.
Os motores e transmissões para novos veículos são normalmente de prateleira, assim como as plataformas/chassis.
Uma nova família de motor/transmissão é muito complexa e envolve projetos independentes iniciados na engenharia avançada. Uma nova fábrica de motores fica mais cara que a do próprio automóvel, requerendo muito tempo de desenvolvimento de engenharia e manufatura. É por este motivo que a vida de uma família de motores é longa, normalmente mais de dez anos, para amortizar todo o investimento requerido. Neste período, algumas modificações e ajustes podem se feitos para adequar a curva de torque, potência e consumo específico para os novos veículos, porém o motor básico continua o mesmo. Trabalhos contínuos de calibração também podem ser realizados para garantir o menor nível de poluentes requeridos pela legislação e a melhor dirigibilidade.
Este mesmo raciocínio vale também, em menor escala, para as plataformas/chassis. É comum varias configurações de veículos com uma mesma plataforma, utilizando mesmos motores e transmissões, como é o caso da Ford com o Ka, o Fiesta e o EcoSport. Às vezes é difícil o público entender e acreditar que o EcoSport é a mesma plataforma Ka. Este expediente economiza, e muito, os investimentos tanto de engenharia quanto de manufatura. Maximizar a comunização é o objetivo maior da fabricante.
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Os motores são desenvolvidos com base em avaliações no dinamômetro, em sua fase básica, para atender os objetivos de desempenho e consumo de combustível do veículo definidos pelo departamento de marketing. Aceleração, recuperação, capacidade de vencer rampas, velocidade máxima e consumo de combustível no ciclo cidade e estrada são pontos fundamentais para o bom andamento do programa. Definido o mapa de torque, potencia, consumo especifico e avanço em varias cargas do motor, o time de calibração vai aprimorar em veículo os níveis de dirigibilidade e detonação (“batida de pino), definindo o mapa de avanço otimizado com base em vários dados do motor como, por exemplo, pressão no coletor de admissão, curso do pedal do acelerador, rotação do motor, velocidade para cada marcha etc., em situações ambientais diversas.
Testes e avaliações são efetuadas ao nível do mar e em altitude, com temperaturas altas acima de 40°C e abaixo de 0°C. A maioria dos locais para estes testes e avaliações são comuns a várias indústriaa automobilísticas. Por exemplo, o Pico do Itapeva em Campos do Jordão, o litoral sul de São Paulo (Praia Grande e Peruíbe), a Patagônia Argentina, a cidade de Teresina, entre outros. É comum encontros casuais dos times de empresas concorrentes nestes locais.
Outro ponto importantíssimo do projeto é a estabilidade direcional do veículo. Hoje em dia existem softwares muito precisos e correlacionados com a vida real que projetam o sistema de direção/suspensões de forma adequada e, mais ainda, otimizadas para segurança em situações-limite de estabilidade direcional como capotagem, desvios de obstáculos, frenagem em curvas, tanto em piso seco quanto molhado.
Após a definição virtual do projeto, vários testes dinâmicos são efetuados incluindo o teste de capotagem, que para a segurança do piloto de provas é feito com um dispositivo que protege a manobra — são os outriggers, braços que apoiam o veículo na condição-limite de capotagem. A manobra é feita aumentando a aceleração lateral até que haja levantamento de roda e/ou toque da roda do outrigger no solo.
Este teste de capotagem é também realizado em caminhões, em manobras radicais, com o auxílio dos outriggers.
Enfim, os veículos estão cada vez mais parecidos uns com os outros, ficando difícil a identificação da marca ao primeiro olhar. Também a parte funcional e de segurança utiliza praticamente as mesmas especificações e normas que, como diz o Bob Sharp, faz não existir mais veículos ruins.
Cada vez mais, estilo, engenharia e manufatura terão a difícil missão de fazer veículos diferenciados em seus atributos para fazer presença marcante perante aos consumidores.
O tripé de ser bom, bonito e barato (BBB!) está cada vez mais presente nos projetos e nas decisões corporativas na indústria automobilística.
Hoje a minha homenagem vai para os designers que, com a arte e dedicação, projetaram ícones que se perpetuaram na historia da indústria do automóvel. Incluo o nome do Paulo Roberto Sá dos Santos, que participou no projeto do Ford Corcel e do Del Rey, entre outros.
Hoje o Paulo é designer na Mitsubishi Motors do Brasil.
CM