Nada como um dia após o outro. Pessoalmente, evito tirar conclusões de afogadilho, sem ter todos os elementos para julgar. Não que eu me furte de dar opinião, não é isso e muitíssimo pelo contrário. Apenas que não faço isso enquanto não tenho todos os elementos – ou pelo menos o máximo possível. Isso vale para tudo, especialmente hoje quando é muito fácil dar palpite sobre qualquer coisa. Afinal, basta um par de cliques para dar vazão a qualquer ideia nas redes sociais, por mais maluca que seja. E olha que o que mais tem é teoria maluca.
O pior é que são justamente essas pessoas que saem crucificando pessoas (e empresas) e tirando (in)conclusões, posto que totalmente incompletas, aquelas que nunca se retratam. Não se desculpam pelos comentários apressados, pelas teses não confirmadas e até mesmo contraditadas e, por óbvio, não admitem que estavam erradas. Nunca, nunquinha.
Pois bem, gostaria de saber dessa parte da população o que dizem agora que saíram números sobre a redução de congestionamentos nas marginais de São Paulo depois que aumentaram os limites de velocidade. Destaco sempre que isto aconteceu em apenas alguns trechos, somente para veículos leves, já que para os pesados continuam os mesmos, permanecem os mesmos 50 km/h nas faixas da direita das pistas locais e as máximas ficaram exatamente iguais às anteriores, de 60 km/h. Nada de Mach 1, OK?.
Para acabar com o suspense, os congestionamentos caíram em 2017 quando comparados com 2016. No caso da Marginal Tietê sentido Ayrton Senna a redução chegou aos 16%.
Lembro de “explicações” sobre como andando mais devagar se chegaria mais rápido ao destino. Elas envolviam simulações com garrafas, funis e grãos de arroz, mas tudo com nomes pomposos e desenhos que davam um ar de seriedade. Não que a teoria em si não tenha sua lógica — apenas que não se aplica ao trânsito.
Como meus caros leitores sabem, venho de uma família na qual metade das pessoas são de Ciências Exatas (Química, especificamente, mas com paixão pela Física e pela Matemática). Pois bem, consultei vários, inclusive o marido engenheiro e ninguém conseguiu estabelecer uma correlação entre grãos de arroz e veículos pelo simples motivo de que no trânsito há imprevistos que não ocorrem num funil.
Nas vias de uma cidade os veículos se deparam com objetos e pessoas e são obrigados a frear subitamente – aliás, algo que vem deixando os criadores dos carros autônomos malucos, se não já estaríamos rodando sem condutores, né? Há motoristas que freiam sem necessidade, apenas por susto, porque um carro está freando 800 metros adiante, porque acham que sempre devem pisar algum pedal… enfim, várias razões que envolvem seres humanos imperfeitos. É impossível falar em fluxo contínuo. Carros, motos e bicicletas se incorporam ao trânsito a toda hora, ao contrário do que acontece num funil por onde passam grãos de arroz. Parece óbvio, mas na época muita gente achou que dava para comparar.
Mas vamos então aos números divulgados semana passada pela Companhia de Engenharia de Tráfego (CET):
Os limites de 90 km/h entraram em vigor no dia 25 de janeiro de 2017, então por questões práticas vamos considerar que o ano todo foi com as novas velocidades. Os congestionamentos médios caíram nas duas marginais, nos dois sentidos, tanto nas pistas expressas quanto nas centrais, exceto na Marginal Tietê sentido Castello Branco-Ayrton Senna pista central, onde houve um ligeiro aumento.
E agora, José? O que dizem os defensores das velocidades mais baixas nas marginais? De uma forma geral, nada. Assim como nos casos mais comentados nas redes sociais que depois se provaram furos n’água, não dizem nada.
Mas é claro que eu vou dar minha opinião, como sempre baseada em dados sólidos. Acredito, sim, que a redução dos congestionamentos tenha a ver com a maior velocidade pois tenho certeza de que andando mais rápido se chega mais cedo ao destino. Mas num país onde um experiente jornalista, porta-voz de uma entidade internacional disse que “Química não é uma ciência exata”… vá lá, quem sou eu para achar que a Física não mudou… (modo irônico ativado, claro!).
Na época em que eu estudei Exatas no segundo grau, se João saía do ponto A e andava a 5 km/h e Pedro saía do ponto B na direção do ponto A, em linha reta, a 4,5 km/h e ambos estavam a 10 quilômetros de distância dava para calcular onde se encontrariam. Mas vai ver que a Física mudou desde então.
Voltando então, aos números. Houve, sim, outros fatores que devem ter ajudado a diminuir os congestionamentos. A CET aumentou de 2016 para 2017 o número de agentes de trânsito nas marginais de 169 para 259. Com isso, qualquer interrupção no fluxo pode ser normalizada mais rapidamente reduzindo o índice de congestionamento.
A sinalização nas marginais também melhorou. Agora há placas que indicam, centenas de metros antes, que haverá redução do limite de velocidade evitando as freadas bruscas e permitindo que o motorista se programe para diminuir a velocidade. Também foram colocados sonorizadores na pista para os mais distraídos.
Houve, segundo a CET, um aumento no número de acidentes fatais nas duas vias que passou de 26 para 34. Mas desse total a CET ressalva que 5 foram “atípicas”, pois num caso uma motorista alcoolizada e com a CNH vencida atropelou um carro que estava parado num recuo e matou três pessoas, um motociclista que se desequilibrou ao chutar o retrovisor de um veículo e caiu sob uma carreta, e uma moradora de rua que atravessava as pistas. Especificamente nesses casos, tudo errado. Chutar retrovisor de carro? Pedestre na marginal? Motorista alcoolizada e com a CNH vencida? Assim não há velocidade que dê jeito. A máxima podia ser qualquer uma que o resultado seria esse mesmo.
Novamente, nas marginais o volume de acidentes com vítimas não fatais caiu de 472 para 462, assim como no resto da cidade, que passou de 16.052 em 2016 para 13.483. Em 2017 também foi registrada redução no número de vítimas que passou de 19.235 para 16.252 pessoas.
Não encontrei números sobre o fluxo de veículos na cidade, mas é muito provável que ele tenha aumentado. Digo isso tendo em vista que houve no último ano uma recuperação econômica, ainda que tímida e ainda que parte dela tenha sido para trabalho sem carteira assinada — o que não faz a menor diferença para o trânsito, diga-se de passagem, pois significa que mais gente sai de casa para realizar alguma atividade. Por veículos, é claro, entenda-se mais gente circulando de carro, ônibus, trem, metro, moto ou bicicleta, o que quer dizer mais risco de acidente e maior índice de congestionamento, já que pedestre atravessa rua e os carros têm de parar para que ele vá de um lado ao outro da via.
Ah, mas sou obrigada a lembrar que quando uns 2-3 anos atrás se dizia que o número de acidentes de trânsito havia caído devido à redução da atividade econômica a CET e a Prefeitura diziam que isso não era motivo, que não tinha nada a ver, lembram?
A questão do aumento da letalidade no trânsito não tem a ver com velocidade, como é óbvio. Tanto que o número de mortes no trânsito da cidade como um todo caiu 7%, mas subiu em 8 das 10 vias mais letais da capital, onde não houve alteração nos limites de velocidade.
As vias com maior índice de mortalidade no trânsito em 2017 foram, pela ordem:
Marginal Tietê (20 mortes em 2017 ante 14 em 2016)
Av. Senador Teotônio Vilela (19 mortes ante 10)
Marginal Pinheiros (14 mortes ante 11)
Estrada de Itapecerica (13 mortes ante 9)
Av. Dona Belmira Marin (9 mortes, mesmo número de 2016)
Av. Jacu Pêssego (9 mortes ante 7)
Av. Sapopemba (8 mortes ante 5)
Av. Marechal Tito (8 mortes ante 4)
Estrada do M’Boi Mirim (7 mortes ante 22)
Av. do Estado (7 mortes ante 4)
Decupando por tipo de vítima, o número de ciclistas mortos subiu 23,3% em 2017 quando comparado com 2016, passando de 30 para 37. No caso da Marginal Tietê, das 20 mortes 13 foram de motociclistas e 4 foram atropelamentos. No caso da Marginal Pinheiros, das 14 mortes 9 foram de motociclistas e 2 atropelamentos. É claro que motociclistas e pedestres são mais frágeis, mas chama a atenção que continue havendo pessoas transitando nas marginais e que para um volume proporcionalmente muito inferior de motos (menos de 20% da frota) elas estejam envolvidas em 80% dos acidentes. Mas, parafraseando o Bob Sharp, fazer conta e exercitar o raciocínio dá um trabalho danado…
Mudando de assunto: Escrevo esta coluna exatos 24 anos depois da morte de Ayrton Senna. Lembro claramente daquele dia e do choque e da tristeza. Não gosto de rever acidentes de pilotos, especialmente quando fatais. Mas falando de Fórmula 1 e de algo mais alegre, o que foi a corrida de Baku? Barbaridade! Fantástica! Teve de tudo, até lambança entre os dois Red Bull, o que foi uma pena. pois torcia muito pelo Ricciardo, que fazia uma corrida incrível. Lamentei a abalroada que o Ocón deu no Kimi, que fez uma linda recuperação e mereceu o pódio – e quase sorriu depois de cumprimentar a esposa. Pena o detrito que tirou uma merecida vitória do Bottas, depois de ter feito tudo certo, Vettel afobado jogou fora uma possível vitória e Hamilton novamente com aquela sorte que acompanha os campeões. E, claro, fiquei contente com o pódio da Force India e o sexto lugar do Leclerc e de sua vibração contagiante. Quase infartei com o Hartley se arrastando no meio da pista e o Gasly chegando a 320 km/h… E eu cada vez mais curiosa para conhecer essa cidade às margens do mar Cáspio que parece tão bonita. Gostei tanto da corrida e das vistas de Baku que vi pela televisão na hora e mais duas vezes a gravação.
NG