Estávamos no final de 1987, e os primeiros carros da corrida-piloto da linha Opala 1988 começaram a chegar nas mãos do time de desenvolvimento geral de veículos de passageiros no Campo de Provas da Cruz Alta (CPCA), em Indaiatuba, SP, que era liderado pelo engenheiro João Alberto Pirani e era composto por cerca de 10 engenheiros. Para surpresa de todos o comportamento dinâmico dos carros era diferente dos carros protótipos que haviam sido utilizados por dois anos para desenvolvimento.
O pacote de suspensão visava deixar o carro mais firme, porém sem perder o conforto. Novas molas com constante elástica (k) reduzidas para 34 N/mm na traseira obrigaram a introdução de barra antirrolagem na traseira na versão 6-cilindros. A mola dianteira deste foi definida com 41 N/mm, e 34 N/mm nos 4-cilindros. Novas barras antirrolagem na dianteira ajudaram a reduzir a rolagem da carroceria.
Novas buchas e nova calibração de amortecedores: era o primeiro carro nacional a utilizar amortecedor pressurizado como equipamento de série. E para completar o pacote tivemos a utilização de batentes de compressão em Cellasto®, da BASF, um elastômero de poliuretano, pela primeira vez na linha Opala.
O sistema de direção teve um barramento totalmente redesenhado, com nova geometria baseada no modelo ’75 com barra central reta. A caixa de direção teve uma nova calibração do sistema hidráulico, deixando-a mais firme, trazendo maior precisão de direção. As mangas de eixo também foram redesenhadas para casar com o novo barramento. Portanto, tínhamos a missão de encontrar nesse pacote de peças qual a que estava fora do que havia sido desenvolvido.
O desenvolvimento desse projeto foi feito primordialmente pelo Fernando Rebellato e pelo Marco Marinho, com suporte dos demais membros do time. O Marco havia saído da GM para montar uma pizzaria e eu fui contratado na sua vaga. Portanto o histórico todo estava nas mãos e na cabeça do Fernando.
Enquanto o Fernando se concentrava em fazer experiências nos componentes da suspensão, eu fui designado para investigar o sistema de direção. E ao final do dia compartilhávamos o que havíamos encontrado, ou não.
No princípio as minhas avaliações eram estáticas e consistia em levantar a curva de convergência/divergência/câmber/cáster versus a altura do carro, chamada de curva “bump steer”. Para levantar essa curva o carro era posicionado no alinhador de direção e tracionávamos a suspensão de 5 em 5 milímetros. A cada passo de 5 milímetros mediam-se os valores de alinhamento das rodas dianteiras.
Como o curso da suspensão do Opala era bem longo, o tempo de medição de cada carro era de mais de uma hora, tempo esse em que o carro ficava posicionado na valeta do alinhador de direção. Éramos acompanhados do mecânico José João Corazza nesse trabalho.
Nessa época ainda não tínhamos computadores para trabalhar, portanto todos os dados levantados eram plotados em uma planilha feita em papel milimetrado. Certamente os engenheiros mais jovens não devem ter conhecido essa ferramenta.
Esse era o lado duro dessa investigação, mas como todo trabalho duro tem suas recompensas, este também tinha. Era difícil avaliar os Opalas nas pistas do CPCA e notar a diferença de comportamento dinâmico. Isso acontecia porque o maior problema era quando trafegávamos em alta velocidade em longas ondulações que provocavam a movimentação de maior amplitude da suspensão. Esse tipo de ondulação não havia dentro do CPCA, portanto tínhamos que sair para avaliar em estradas da região.
Como passava o dia todo concentrados nessas investigações no equipamento de alinhamento, o único tempo disponível para avaliar os resultados em estradas era no trajeto CPCA-casa-CPCA. Portanto, a recompensa vinha com a autorização para sair com os carros de teste todas as noites da semana.
Nessa época eu ainda estava cursando a faculdade de engenharia à noite, portanto em vez de ir para Campinas e pegar o ônibus para a faculdade em Santa Barbara d´Oeste, eu saia direto do CPCA para a faculdade.
A SP-308, Rodovia do Açúcar, que liga Sorocaba a Piracicaba, era uma de nossas vias prediletas para avaliações externas, portanto, a ida para a faculdade em Santa Barbara juntava o útil com o conveniente.
O Opala nunca foi um carro bom de andar reto, pois “passarinhava” em alta velocidade, faltava-lhe estabilidade direcional. O pacote de suspensão e direção ’88 veio para diminuir esse efeito, e era justamente essa esperada melhoria que os carros oriundos da corrida-piloto estavam falhando em apresentar.
O Brasil sempre teve limite de velocidade nas estradas, porém nessa época a fiscalização era feita pela Policia Rodoviária através de cronômetro. Nós conhecíamos todos os pontos onde os policiais costumavam ficar, porém à noite ficávamos livres dessa fiscalização e costumávamos acelerar um pouco mais.
As praças de pedágio das rodovias Anhanguera e Bandeirantes haviam sido desativadas devido a um litígio judicial. Pagávamos a TRU – Taxa Rodoviária Única anualmente para licenciar os veículos, portanto a cobrança de pedágio foi entendida como bitributação. Em função dessa interpretação o governo parou de cobrar pedágio. Mas as praças de pedágio, com suas cabines e vias estreitas de passagem ficaram lá.
Rodovias com limite de 110 e 120 km/h como eram a Anhanguera e a Bandeirantes e aquelas praças de pedágio no meio do caminho, mas com cancela liberada, e um Opala que não andava muito bem em linha reta, bingo!! — cenário perfeito pra liberar adrenalina com responsabilidade.
Saíamos com os Opalas do CPCA para as devidas avaliações noturnas, mas no nosso caminho sempre tinha alguma praça de pedágio desativada. A grande diversão era passar nessas cabines. Até hoje, cada um conta sua história e suas emoções desse desafio. O desejo de todos era passar com o pé cravado no acelerador, mas de Opala já era difícil passar a 100 km/h e com os carros da corrida-piloto, era impossível.
Foram cerca de três meses de trabalho e investigações. Alguns ajustes foram feitos na calibração dos amortecedores, nas durezas das borrachas das buchas da suspensão e na geometria de direção para minimizar os efeitos. Mas deixar os carros de produção como eram os protótipos foi impossível. O grande problema do Opala era a baixa rigidez das longarinas da carroceria, que impediam que o carro tivesse um comportamento ideal. Chegava a variar de um carro para o outro.
Finalizado o trabalho de desenvolvimento e validação de todo esse pacote de suspensão e direção, e o relatório técnico que contemplava toda essa mudança não saiu. O Marco Marinho, que havia saído da GM, deixou a incumbência para o Fernando. Este fez um ótimo trabalho e até hoje sabe todas as características de todos os componentes de memória, mas jogou a responsabilidade para este que agora escreve e que não sabia muito ou quase nada. E nesse jogo de empurra-empurra a falta desse relatório — ou a virtual existência dele, como afirma o Fernando — é uma das grandes perguntas que ficará sem resposta.
Com relatório ou sem ele, o Opala ’88 foi lançado nas suas versões 2-portas cupê, 4-portas sedã e station wagon Caravan, com motores 2,5-l 4-cilindros em linha e 4,1-l 6-cilindros em linha. Todas as versões tinham a opção de câmbio manual ou automático.
O câmbio automático ZF de 4 marchas também era uma inovação e modernidade na época. Além de ser o primeiro carro nacional médio a utilizar um câmbio automático de 4 marchas (o primeiro, como se sabe, foi o compacto Dodge Polara em 1979), tinha o recurso de bloqueio do conversor de torque em 3ª e 4ª marchas (só na terceira e última marcha do Dodge Dart automático), reduzindo o escorregamento e melhorando consumo e retomadas de velocidade.
Todas essas modificações mecânicas deram uma sobrevida de mais alguns anos ao projeto Opala, até a chegada do Omega, quando saiu de linha definitivamente. O Diplomata 6- cilindros automático 4-marchas rodava macio, a 120 km/h a rotação de 2.350 rpm, tendo torque e elasticidade para enfrentar qualquer subida à sua frente.
A receptividade pela imprensa especializada foi muito boa, sendo muito elogiada e reconhecida as melhorias que estavam sendo implementadas naquele projeto com mais de 20 anos de vida, um fato impensável nos dias de hoje.
Antes de sair de produção no final de 1992, a linha Opala ainda teve uma modificação visual nos para-choques no modelo 1991, a eliminação dos quebra-ventos e a introdução de outros itens de avanço tecnológicos para a época. Falarei sobre esse modelo em outra oportunidade.
GB