Esta segunda parte de duas trata da fabricação e processos de desenvolvimento, projeto, tendências — e estepes.
Fabricação e processos de desenvolvimento
Uma vez que o pneumático é uma membrana de borracha com reforços de cordões têxteis, a primeira tarefa é combinar eficientemente esses dois componentes básicos no processo de manufatura. Isto foi obtido pela primeira vez em 1836 por Edwin M. Chaffee de Roxberry, Massachusetts. Ele desenvolveu uma máquina capaz de aplicar borracha diretamente no tecido sem solventes, produzindo uma tela de borracha de espessura uniforme. Esta máquina usada por ele foi chamada de calandra. Ainda é utilizada e é essencial em qualquer fábrica de pneus.
Uma vez que todos os componentes do pneu estejam juntos e este completamente montado, ele está pronto para a vulcanização ou cura. Inicialmente, isto foi feito em autoclaves a vapor. O pneu era mantido no lugar por molde em forma de anel o qual, por sua vez, era mantido na posição pelo envolvimento de uma atadura de tela.
Em 1896, H. J. Doughty inventou a cura por pressão a qual incluiu os meios mecânicos de fixar o pneu pelo seu lado interno, e e inflar o pneu para haver pressão de dentro para fora, forçando-o contra as paredes do molde para produzir elaborados desenhos da banda de rodagem e dos flancos (com os dados informativos). A vulcanização ou cura prosseguia enquanto essa modelagem estava ocorrendo. Novamente, este processo básico, juntamente com incontáveis melhorias, está em uso até hoje.
Em 1916, F. H. Banbury desenvolveu uma máquina para acelerar o processo de mistura dos componentes químicos com a borracha em seu estado não curada antes da operação na calandra ou da preparação dos outros componentes do pneu. Isto foi considerado o maior marco no processo, e o misturador Banbury é ainda essencial nas fábricas de pneus ao redor do mundo.
O pneu de lona radial se mostrou tanto ou mais desafiante para a fábrica quanto foi para o engenheiro e o químico. Para o pneu convencional de lonas diagonais, todos os componentes eram montados em um único estágio do processo de manufatura antes da cura. Isto é, o pneu era montado numa única máquina (geralmente um tambor de montagem). Como o pneu de lona radial se firmou e ganhou popularidade no mercado, ocorreram incontáveis melhorias no processo de fabricação para atender a demanda. Além disso, os projetos e as características-chaves das máquinas foram específicos para as inovações dos fabricantes de pneus e eram segredos muito bem guardados.
Com as rápidas mudanças e melhorias via eletrônica, computadores e robótica, é seguro afirmar que as fábricas de pneu modernas ficam atentas às oportunidades e fazem mudanças de acordo com elas.
Forma, projeto e tendências de estilo
Assim como o automóvel mudou em aparência através dos anos, o pneu também mudou. Claro, hoje é ainda um invólucro de ar sob pressão reforçado por tecido e revestido de borracha. O veículo que está apoiado nele ainda tem quatro rodas e é movido, na maioria dos casos, por um motor de combustão interna, mas além destas similaridades as diferenças são gritantes.
A mudança em medida e perfil do pneu tem sido uma constante progressão para mais baixo e mais largo. A seção transversal ou do perfil é definida por sua proporção – proporção da altura em relação à largura. A altura é a distância do aro à banda de rodagem, enquanto a largura é de flanco a flanco. Esta proporção, expressa em porcentagem, tem caído sem parar ao longo dos anos.
Os primeiros pneus tinham uma proporção de 100%. Isto continuou até o início dos anos 1920. Em 1923, a Michelin apresentou o pneu balão na Europa, e a Firestone foi a pioneira nos EUA. A ideia não pegou firme até o início dos anos 1930, quando a General Tire Company a promoveu efetivamente. Tendo uma proporção de 98%, o pneu dela apresentou quase o dobro da largura de banda de antes e ao mesmo tempo, sob condições normais, precisava de apenas 28 libras por polegada quadrada (lb/pol²) de pressão de enchimento. Isto era cerca de metade da pressão utilizada nos pneus de antes. Desse modo, o principal benefício foi um rodar muito mais macio.
Isto levou ao pneu superbalão, o qual surgiu depois da Segunda Guerra Mundial, e tinha perfil ao redor de 90%. A tendência de diminuição abaixo de 90% continuou com a adoção do pneu “perfil-baixo” no final dos anos 1950. Logo um pneu “perfil-superbaixo”, com proporção perto de 80%, apareceu no mercado.
A medida dos pneus de automóveis era expresso em termos da altura da seção transversal em polegadas seguida do diâmetro do aro também em polegadas. Com o movimento em direção a perfis mais baixos, os novos pneus tinham números grandes, mas realmente sem alteração na capacidade de carga, por exemplo, 7.75-14 trocado por 7.50-14. Prevista uma continuação destas tendências, junto com procurar evitar confusões, foi adotado um sistema alfanumérico para medidas de pneus de automóvel. Isto foi chamado de sistema “baseado em carga” em oposição ao seu antecessor, o sistema de medidas do pneu de automóvel “baseado em dimensões”.
Isto era para transmitir a importante mensagem de que como os pneus se tornaram mais baixos e mais largos, a capacidade de carga seria a mesma.
Os incrementos de carga foram estabelecidos e uma letra do alfabeto foi definida como primeira característica na nomenclatura da medida. As letras de A a L (exceto a I) foram utilizadas para pneus de automóvel, representando baixas para altas cargas, respectivamente. Os dois caracteres seguintes na nomenclatura foram números para o perfil, expresso em porcentagem.
No final dos anos 1960 foram adotadas medidas série 78 e série 70 e logo surgiram medidas tamanhos série 60. Esta tendência para perfis mais baixos, mantendo ritmo com a frenética atividade de desenvolvimento de pneus radiais, serviu como resposta à continua demanda de pneus para velocidades mais altas e desempenho superior.
A tendência de perfis mais baixos continuou nos anos 1970 adentro. Entretanto, deficiências no sistema alfanumérico de tamanho tiveram de ser resolvidas. Primeiro, com o lançamento do Chevrolet Chevette uma medida menor que A foi necessária. Segundo, o interesse para passar ao sistema métrico estava crescendo nos EUA. Por último, mas não menos importante, houve o desejo de estabelecer um sistema comum para medidas de pneus num padrão mundial. Assim, nasceu o sistema P-métrico de medida de pneus. Refletindo uma volta ao sistema baseado em dimensão, foi incluída também a proporção do perfil, e uma provisão para incrementos significativos incrementos foi incorporada.
As proporções dos perfis continuaram a cair para algo como série 35 (foto de abertura) os quais foram recentemente apresentados (nota: a matéria é de 1995). Em adição às altas velocidades e desempenho em dirigibilidade, outra vantagem dos perfis mais baixos é a possibilidade de utilizar rodas de maior diâmetro e, portanto, freios maiores.
As tendências em desenho de bandas de rodagem focaram em melhorias de aderência em superfícies que não o pavimento seco. Para aderência no molhado, o simples mas ainda interminável desafio para o engenheiro de projeto da banda de rodagem é prover caminhos suficientes e eficientes para que a água escape e “mantenha a borracha na pista”. Sulcos circunferenciais mais pronunciados, uso de fendas nos ombros, e, ultimamente, sulcos centrais largos, têm representado importantes conquistas para o desempenho.
Como os pneus e as bandas de rodagem se tornaram mais largas, houve uma oportunidade para aumentar o número das fileiras de blocos de cinco para sete, e em alguns casos, até mesmo nove. Novamente, desempenho no molhado e resistência à aquaplanagem foram os grandes benefícios.
Nesse mesmo sentido, os responsáveis por autoestradas determinaram fazer ranhuras longitudinais no pavimento em espaços de 20 mm entre si, também para reduzir o risco de aquaplanagem ao melhorar a drenagem de água. Foi então que ocorreu aí o conflito! Quando um certo número de ranhuras da estrada interferia com as ranhuras do pneu, ocorriam pequenos e incômodos deslocamentos laterais do veículo, como que copiando as ranhuras da pista. Isto apressou a volta às bandas de rodagem de cinco fileiras de blocos, o que permanece popular nos pneus de automóveis até os dias de hoje.
Para mais tração na neve, a saída é otimizar ou maximizar as projeções laterais das ranhuras e pequenos cortes, especialmente nas fileiras externas de blocos da banda. Para os desenhos de banda que iam bem na neve, o maior desafio ou contrapartida era tipicamente na questão de uniformidade e desgaste da banda, bem como ruído. O primeiro pneu para neve foi oferecido pela alemã Continental em 1909.
Ao longo dos anos 1970, a prática convencional era trocar pneus normais por pneus de neve no inverno e vice-versa no verão. A entrada de um pneu para todas as estações do ano, iniciada pela Goodyear, se tornou óbvia por conta desta necessidade de duas trocas ao ano. Logo, o restante da indústria ofereceu suas versões, e no início dos anos 1980 o pneu para todas as estações para automóveis tinha se consolidado. Este aperfeiçoamento se estendeu aos pneus de perfil mais baixo e alto desempenho pela competitividade do mercado, junto com ampla aceitação pelo consumidor, encorajando este progresso. Hoje, “M&S” (mud and snow, lama e neve) indicando aplicação em todas as estações, é regra ao invés de exceção no flanco do pneu.
A atenção dada ao flanco tem sido uma história de estilo. Assim como o automóvel passou por eras de fosco e cromado, os flancos foram de faixa grande branca para estreita branca, para múltiplas listras, para letras brancas, para letras contornadas em branco, e assim por diante. O tratamento dado ao flanco moldado (em branco ou preto) incluiu variações tais como “lantejoulas”, diamantes, facetas, anéis, uma variedade sem fim de letreiros. Um exemplo foi o “General Streamline Jumbo” em 1934. Por um breve período, flancos coloridos surgiram no início dos anos 1950 nos pneus da U.S. Rubber. Últimos exemplos incluíram o U.S. Royal Tiger Paw e o Goodyear Blue Streak. Ultimamente, a parede preta tem sido a mais elegante. O que vai, volta.
Segurando o ar
Será que assim que o primeiro pneumático começou a rodar ocorreu o primeiro pneu furado? Provavelmente, mas ninguém sabe com certeza. Parece certo que Thomson e Dunlop poderiam fornecer muitas histórias interessantes. O objetivo de reter o ar permanece conosco até hoje. Não é difícil imaginar que os rebites no pneu de Thomson eram problemáticos ao criar perfurações.
Havia também o problema de como inflar ou esvaziar o pneu. A invenção de Dunlop envolveu o uso de uma incipiente válvula similar à usada em bolas de futebol. Era de via única; isto é., o pneu podia ser inflado, mas não esvaziado. A primeira maior melhoria na válvula de pneu ocorreu em 1891 quando Charles H. Woods ofereceu uma válvula de duas vias, permitindo o esvaziamento bem como o enchimento. O próximo maior passo foi dado por George H. Schrader em 1898. Seu produto era provido de miolo da válvula substituível rosqueando-a na própria válvula. Isto rapidamente se tornou o padrão e permanece em uso até hoje.
As propriedades de retenção do ar pela borracha foram significativamente melhoradas com a invenção da borracha sintética butil em 1937. Robert M. Thomas e William J. Sparks da Standard Oil (agora Exxon) de New Jersey receberam os créditos por esta conquista. Melhorias adicionais foram feitas por Francis Key Baldwin com o butil clorado; daí o nome clorobutil o qual é essencial ainda hoje para câmaras e forro interno dos pneus sem câmara.
O pneu sem câmara foi inventado em 1947 pelo engenheiro Frank Herzegh, da B. F. Goodrich. No pneu com câmara havia o risco de a câmara forçar passagem através de um furo, cortar, abrindo ou desgastar o tecido. Em tais incidentes, existia a possibilidade de perda repentina de ar (estouro). A principal vantagem atribuída aos pneus sem câmera foi que esse risco era eliminado ou ao menos minimizado.
O uso de cintas de aço — tanto em pneus radiais quanto nos diagonais — ofereceu uma maior proteção aos riscos da via. Assim como riscos tipo cacos de vidro, todos os problemas de perda de ar se tornaram raros. Ainda assim, a questão irritante permaneceu — “O que fazer a respeito do insistente prego?”. Uma possível resposta foi adiantada pela Uniroyal e a General com seus selantes para pneus.
Em uma solução um pouco diferente, respostas haviam sido dadas, as quais envolviam a continuidade da mobilidade, mesmo após a perda de ar. O pneu “Goodyear Double Eagle Airwheel and Lifeguard” foi proposto em 1938 como um pneu-reserva dentro da câmara. Ambos eram inflados através da mesma válvula. Se o pneu externo e a câmara falhassem, o pneu de dentro segurava ar suficiente para suportar o carro até ele poder parar de forma suave e segura. Uma variação do tal “pneu que pode rodar vazio” foi oferecida pela Dunlop em 1972. Numerosos outros exemplos têm sido avaliados e a atividade de desenvolvimento continua.
Há uma batalha interminável sendo travada contra os riscos da via — e produzindo-se pneus que mais resistentes a este ataque. A vitória final será a eliminação do estepe!
Estepes, uma relação de amor e ódio
O pneu furou. E agora? Se você não tem habilidade nem ferramentas para consertá-lo no local, a melhor coisa é trocar por outro pneu e continuar a viagem. Óbvio.
No início dos anos 1900, durante o período do pneu com rebites, ninguém ainda tinha defendido a ideia de um conjunto reserva de roda e pneu armazenado em algum lugar a bordo. Como inevitavelmente pneus furavam, o motorista era forçado a dispor de um elaborado conjunto de chaves inglesa, pés-de-cabra, alavancas, grampos, macaco, e até mesmo uma marreta era recomendada para a luta de descolar um pneu do aro. Era comum o pneu era reparado e colocado para rodar novamente ali no local, se possível.
O “avanço” de equipar o carro com um conjunto roda-pneu de reserva deve ter sido muito bem recebido por qualquer motorista que tenha tido o dissabir de consertar um pneu.
Através dos anos, o estepe continuou a ser um estorvo para dedigners, especialistas em projeto de interior e de motoristas que queriam carregar “só mais um pouquinho de bagagem”. Pneus furados eram tão comuns nos anos 1930 que não raro viam-se dois estepes nos carros para viagens longas.
O primeiro maior passo para poupar algum espaço no porta-malas ocorreu com o estepe sem ar, criado pela B.F. Goodrich e pela Goodyear no final dos anos 1960. Era um pneu diagonal que era armazenado no porta-malas totalmente murcho e com um diâmetro total apenas ligeiramente maior que o aro. Uma lata para enchimento acompanhava o veículo e o pneu, quando colocado montado no lugar e inflado para rodar, expandia-se para aproximadamente as mesmas medidas dos pneus normais.
Embora esta invenção necessitasse de menos espaço no porta-malas, não houve redução de peso e, considerando a adição do lata de enchimento, provavelmente nem economia de custos.
O próximo avanço importante veio com o estepe estreito, de uso temporário, do qual a Firestone foi a pioneira no final dos anos 1970. Este também era um pneu diagonal, e oferecia o triplo benefício de espaço, peso e redução de custos. Tem ampla utilização hoje, estando no porta-malas da maioria dos automóveis.E são radiais atualmente.
O estepe temporário estreito nem sempre obteve a apreciação que merecia. Era visto como inferior, uma muleta, e algo que possivelmente não poderia funcionar tão bem quanto o pneu que substituísse. O fato é que foi e ainda é um produto bem projetado e, nas ocasiões em que era colocado para rodar, o motorista mal podia notar a diferença no comportamento do veículo desde que respeitado o limite de velocidade de 80 km/h.
Além disso, o estepe estreito se tornou algo como um verdadeiro porta-voz do desempenho dos pneus nos dias de hoje. Muitos automóveis passam toda a sua vida útil e vão para a sucata sem que o estepe temporário seja ao menos removido do porta-malas.
Rodando sobre e para o futuro
O automóvel certamente percorreu um longo caminho nos últimos 100 anos e o pneumático tem estado com ele praticamente em cada quilômetro. Tanto quanto qualquer item, quilometragem é um critério crítico para medição de melhoria através dos anos.
No princípio, a expectativa de vida dos pneus de automóvel era de umas poucas centenas de quilômetros. Hoje, tipicamente, em vias de boas condições, os pneus rodam 60.000~100.000 quilômetros antes que cheguem ao limite de profundidade de sulco de 1,6 mm.
Claro, ainda há um estepe no porta-malas. Mas é tirado de lá e colocado em uso mais por causa de um irritante prego do que por falhas graves.
Hoje o pneu roda silenciosa e suavemente. Se o pavimento fosse apenas um pouco mais liso, mais ainda. Os especialistas nos dizem que o rumo da tecnologia de pneus é mais do mesmo. Espera-se menos desgaste e rodagem mais suave. Aderência e a dirigibilidade continuarão melhorando e, certamente, o fim de pneus furados e, portanto, do estepe, continua a ser o alvo mais importante. A questão não é se, mas quando o estepe desaparecerá.
Assim como foi importante no início, a resistência ao rolamento permanece importante hoje e continuará sendo no futuro. As demandas e oportunidades para menor consumo de combustível continuarão pressionando a redução da resistência ao rolamento de pneu para níveis antes não considerados possíveis.
Como tem sido sempre o caso, avanços nos materiais permanecerão como a chave para estas melhorias. De arames de reforço e adesivos, a novos compostos de borracha sintética, avanços em todas as áreas são imagináveis.
O pneumático sobreviverá? Alguém poderia simplesmente perguntar: “O motor de combustão interna permanecerá ou o automóvel em si permanecerá?” Francamente, ninguém ponderou nada razoável como alternativa.
MP
Por William J. Woehrle, revista Automotive Engineering International, uma publicação da SAE International, edição de outubro 1995, tradução de Mário J. S. Pinheiro.