Quando a Rodovia Castello Branco em São Paulo foi inaugurada em 10 de novembro de 1968, o limite de velocidade na faixa da esquerda já era de 120 km/h. Nas outras duas faixas o limite era de 100 km/h e 80 km/h. Era a primeira autoestrada brasileira projetada para o crescimento automobilístico que se aproximava.
A então chamada Rodovia do Oeste, ou simplesmente via Oeste, teve o início dos estudos de implementação em 1953, o projeto foi feito em 1961, com construção iniciada em 1963.
Desde sua inauguração é chamada Rodovia Presidente Castello Branco (SP-280), e foi elaborada com características técnicas encontrada apenas em modernas rodovias dos Estados Unidos e Europa naquela época. Hoje vemos estradas modernas também na Ásia e Oriente médio. Vários diferenciadores de conforto e segurança foram implementados como pistas com curvas suaves e com boa visibilidade, largo canteiro central prevendo ampliações futuras, amplos acostamentos dos dois lados da via. Rampas com pouca inclinação, facilitando a vida dos veículos pesados, e ótimos acessos às cidades diretamente servidas, sem cruzamento em nível.
À época operavam no setor automobilístico as grandes fabricantes Ford, General Motors, Simca e Volkswagen. A Ford recém havia absorvido a Willys-Overland do Brasil e a Volkswagen, a Vemag, Todas com fábricas instaladas no Brasil, começando pela Ford em 1919 e General Motors em 1925. A Volkswagen só chegaria em 1953 e a Simca, em 1959. E novos lançamentos, aguardados por todos, se sucediam.
Cerca de um ano e meio antes da inauguração da rodovia, houve o lançamento do Ford Galaxie 500 numa cerimônia na fábrica da Ford no Ipiranga, no dia 16 de fevereiro de 1967. Este passou a ser um sonho de consumo da alta sociedade. Tinha um motor V-8 Y-Block 272 de 4,5 litros (4.458 cm³) que gerava 170 cv brutos, e pesava 1.780 kg. A velocidade máxima era 150 km/h e fazia 0-100 km/h em 14,9 segundos.
Concomitante com a inauguração da rodovia, ocorreu o lançamento do Chevrolet Opala. Na abertura do Salão do Automóvel daquele ano, em 28 de novembro de 1968, chegava ao mercado o primeiro automóvel nacional da GM. Com motor 230 de 3,8 litros e 6 cilindros em linha, desenvolvia 125 cv brutos a 4.000 rpm, e atingia velocidade máxima de 169,8 km/h e 0-100 km/h em 13,3 segundos.
Somente no ano seguinte a Chrysler chega ao Brasil com o Dodge Dart, primeiramente na versão sedã com motor V-8 de 318 polegadas cúbicas (5.212 cm³). Este passava a ser o maior motor até então fabricado no Brasil. Desenvolvia 198 hp (potência SAE bruta) a 4.600 rpm e 41,5 m·kgf de torque a 2.400 rpm. Alcançava a velocidade máxima de 180 km/h.
Junto com esses carrões trafegavam pela moderna rodovia os Fuscas, DKW-Vemag e Dauphines/Gordinis, entre outros veículos, que habitavam nossas vias. Esses carros de menor porte e com motores menores tinham certa dificuldade para atingir o limite de velocidade de 120 km/h da Castello Branco. Eram desprovidos de freios ABS, cinto de segurança e bolsas infláveis, para citar apenas alguns dos sistemas de segurança ativa e passiva que foram sendo introduzidos ao longo dos anos.
Com a inauguração da Rodovia Presidente Castello Branco esperava-se que o Brasil entrasse definitivamente na lista de países com estradas modernas. Até tivemos mais um suspiro de esperança com a SP-348 Rodovia dos Bandeirantes inaugurada em 1978, mas com apenas 100 quilômetros de extensão, ligando São Paulo a Campinas.
Pouco depois, em maior de 1982, nascia o complexo SP-70 Trabalhadores/ Carvalho Pinto, também com cerca de 100 quilômetros ligando São Paulo ao o Vale do Paraíba próximo a Jacareí, hoje estendida a Taubaté a 135 quilômetros da capital. Mas após a morte de Ayrton Senna em 1º de maio de 1994 a Rodovia dos Trabalhadores passou a se chamar Rodovia Ayrton Senna..
Em setembro de 1973 o Rio Grande do Sul dava um enorme passo em direção à modernidade rodoviária com a inauguração do trecho 96,6 quilômetros da BR-290 Rodovia Oswaldo Aranha entre sua origem na cidade litorânea de Osório até à capital Porto Alegre. De três faixas em cada sentido, tinha velocidade-limite única de 120 km/h. Atualmente seu limite é 110 km/h. Seu apelido bem conhecido é Freeway, em alusão ao sistema rodoviário da Califórnia, nos EUA.
Como usuário frequente, vejo que as novas rodovias, duplicações e extensões que foram construídas nos últimos 20-30 anos caminharam para outro caminho. Há pouca preocupação com a largura mínima da faixa de rolamento para acomodar o efeito cambaleante dos veículos. Curvas amplas e suaves como as das rodovias Castello Branco e Bandeirantes é também um luxo impensável. Canteiro central com largura para acomodar uma expansão futura é descartado, e o que mais preocupa é a largura dos acostamentos, pois não permitem fazer uma troca de pneu do lado esquerdo de um veículo com o mínimo de segurança.
Por outro lado, os veículos projetados e construídos de 30-20 anos para cá vêm sendo incrementados em termos de segurança passiva, ativa e até com certa autonomia. O desenvolvimento da eletrônica embarcada permitiu a criação de novos sistemas impensáveis 30 anos atrás. As estruturas deformáveis das carrocerias permitem maior segurança aos ocupantes nas colisões frontais e traseiras. Sistemas semiautônomos de condução proporcionam maior segurança e ajudam a minimizar ou até evitar colisões por distração dos motoristas.
O desempenho de qualquer carro popular atual com motor 1-litro é igual ou superior aos V-8 e 6 cilindros em linha de outrora, tanto em aceleração quanto em velocidade máxima. A capacidade de frenagem é bem superior, pois além de melhores sistemas de freios o peso desses carros é bem menor, o que ajuda nesse resultado. E a estabilidade e a segurança proporcionada pelos pneus radiais atuais é incomparável com os pneus diagonais que utilizavam os Galaxies, Opalas e Darts.
O mesmo acontece com carros de alto desempenho e os superesportivos. É fácil encontrar um carro que acelera de 0-100 km/h em 4 segundos e atinge velocidades superiores a 300 km/h. Mas não é uma rodovia sem limites que espero, e sim rodovias com limite de velocidade próxima à velocidade natural da pista. Essa velocidade natural evolui na proporção da evolução dos automóveis. Hoje temos diversas autoestradas com limite de 80 km/h sem nenhuma justificativa, em que se evidencia a finalidade “caça-níqueis”, arrecadar com multas.
As construções viárias, a segurança e a sinalização também tiveram sua evolução. Hoje é possível encontrar na Europa e Ásia estradas com limite de velocidade dinâmico, ou seja, alteram o limite de acordo com o fluxo e/ou horário do dia, e com as condições climáticas. Porém o Brasil parou e limitou-se à prática dos “puxadinhos”, sempre correndo atrás de resolver o caos já instalado. As duplicações levam anos para sair do discurso da campanha eleitoral passada para a inauguração na véspera da eleição que se aproxima.
Hoje temos carros mais rápidos, mais seguros, mais confortáveis, mais conectados e somos obrigados a andar mais devagar. Seguramente há um elo perdido entre o desenvolvimento da segurança veicular e a implementação de modernidade rodoviária, principalmente em países em desenvolvimento como o nosso.
GB