O projeto do Celta iniciou dentro da GM em meados de 1996, quando o terreno para construção da fábrica de Gravataí, RS foi comprado e o projeto recebeu o codinome de Blue Macaw (Arara Azul), nome que era utilizado por todos para referenciar o projeto.
Era um projeto desenhado para ter uma única carroceria, um único motor e apenas um câmbio. Facilitaria, assim, a vida da fábrica, pois com baixa complexidade de modelos é possível aumentar a velocidade da linha. Mas o mercado começou a pedir variações, e elas foram aparecendo. Veio o Prisma, que era o sedã, e com ele a necessidade de motor de maior capacidade, aparecendo o 1,4-l, que também equipou o Celta.
O carro, lançado em 2000, foi bem aceito pelos consumidores, mas no Campo de Provas da GM o nosso autoentusiasmo pedia mais. Estávamos em franco desenvolvimento do novo Corsa com lançamento previsto para 2002, e este utilizaria o novo motor 1,8-l família I de 8 válvulas. Logo veio a ideia de montar um Celta 1,8-l. Afinal já tivéramos o Corsa GSi 1,6-l DOHC (sigla em inglês de duplo comando de válvulas no cabeçote) em1995 e 1996.
Dentro do grupo de desenvolvimento estávamos todos sobrecarregados para fazer uma “brincadeira” dessas. Porém, depois de várias “reuniões” nos intervalos para um café e outro, apareceu uma luz no fim do túnel. Tínhamos o estagiário Euglen Assis chegando ao grupo e precisávamos treiná-lo. Bingo!!! Nomeamos o estagiário para esse trabalho e dois engenheiros para serem os orientadores. Renato Cobra Monteiro, que era especialista em freios, e Ramon Orives, que era responsável pelos itens de chassis do novo Corsa e com ótima bagagem técnica na área eletroeletrônica.
Mas se era para ser desafio, montar o motor 8 válvulas era muito fácil. Logo veio o verdadeiro desafio. Instalar o motor 1,8-l com duplo comando e 16 válvulas que estava em desenvolvimento para a Meriva. A única similaridade ficava por contas dos pontos de fixação dos coxins de motor e câmbio. Sistema de admissão de ar era diferente e o mais complicado era o sistema elétrico. Mãos à obra!
Motor e câmbio
O motor de 1.796 cm³ de quatro cilindros da Meriva, movido a gasolina com taxa de compressão de 9,8:1, e potência de 130 cv a 5.800 rpm com torque máximo de 17 m·kgf a 4.000 rpm, foi retirado de um protótipo que já havia cumprido a rotina de testes, e seria destruído. O sistema de injeção sequencial era novidade para a engenharia do Brasil e estava em pleno desenvolvimento, portanto era um desafio a mais que o estagiário teria que aprender, encontrar soluções, e nos ensinar, visto que o time todo tinha pouco conhecimento também.
O coletor de admissão era variável, atuando em baixas rotações com o ramo longo para melhorar o enchimento dos cilindros e o torque e a potência nessa faixa, e em altas rotações utilizava o ramo curto,aumentando assim ambos e, consequentemente, melhor desempenho.
Através do diagrama de dente de serra o câmbio escolhido foi o F-17, dada a potência do motor, e optou-se por uma caixa close ratio onde as relações de marchas são mais próximas, principalmente entre 3ª e 5ª marchas, conferindo maior esportividade. E rodava a 120 km/h em 5ª marcha a 3.400 rpm.
A simulação do desempenho foi comprovada na prática e surpreendeu. Com peso em ordem de marcha de 940 kg, acelerava de 0 a 100 km/h em 8,5 segundos e atingia a velocidade máxima de 200,4 km/h em 5ª marcha a 5.700 rpm. Estes dados foram obtidos nas pistas de testes do campo de provas da GM em Indaiatuba, SP, ou seja, a Pista Reta e a Pista Circular (“reta infinita”).
Suspensão e freio
Para completar o desempenho de um pocket rocket, exigia-se melhorias na suspensão e no freio. O sistema de direção ficou inalterado. Foi mantida a direção desassistida, visto que o peso no eixo dianteiro ainda permitia boa manobrabilidade, dispensando assistência elétrica ou hidráulica.
As molas helicoidais de suspensão dianteira foram redimensionadas utilizando constante elástica de 27 N/mm. Foi adicionada barra antirrolagem com diâmetro de 21 mm e os batentes de compressão foram definidos com 40 mm de comprimento livre e densidade de 60 g/cm³.
Na traseira continuou a utilização de mola helicoidal do tipo barril com dupla constante elástica. O primeiro estágio com 30 N/mm e o segundo, com 45 N/mm. Adicionou-se também a barra antirrolagem de 18 mm de diâmetro e o batente de compressão de 40 mm de altura com densidade de 50 g/cm³.
Esse pacote de molas, barras e batentes alterou a rigidez e a frequência de trabalho de todo conjunto, mas manteve harmônico e muito similar ao antigo Corsa GSi. Porém, uma nova calibração de amortecedores foi necessária para dar equilíbrio ao conjunto.
Sendo um projeto extraoficial, não era possível fazer a calibração de amortecedores com os fornecedores. Portanto utilizamos conjuntos de amortecedores desmontáveis antigos e válvulas, molas e pistões que tínhamos em mãos para definir uma nova calibração.