O meu querido amigo Marcus Zamponi, o “Zampa”, que para tristeza de todos os que o conheceram nos deixou há nove anos, era uma das maiores figuras deste mundo. Jornalista inteligente, astuto, capaz de fazer rir a todos por muito e muito tempo com suas histórias (“o tema é verdade — garantia ele — mas às vezes crio em torno da história para valorizá-las, fazendo-as mais engraçadas”).
Carioca, sotaque carregado e aventureiro, foi morar na Europa ainda jovem, já com grande conhecimento do automobilismo mundial. Como todo jovem, tinha suas dificuldades de sobrevivência. Vida dura, dependendo de favores dos amigos que lá já moravam e de alguns pilotos brasileiros que seguiam para o velho continente em busca da sorte atrás de um volante.
Morava em Londres e tinha um Mini. Mas aqui é preciso abrir um parêntese para mencionar que o Zampa passava — e bem — dos 100 kg de peso. Vivia acompanhando provas pela Europa, especialmente F-1. E não poderia deixar de ir até Mônaco para ver a corrida mais charmosa do mundo. Pegou carona em um avião para o principado, e lá se foi com pouco dinheiro para despesas.
Assim, com o bolso e estômago vazios, o querido Zampa deparou-se com um jornalista carioca como ele, e mencionou suas dificuldades. O cara, todo posudo (hic!) disse: olha Zampa, posso te ajudar. Você carrega esta pasta para mim que te pago 100 dólares. Contando a história para os amigos ele dizia: “na hora eu pensei se mandava o cara à ou para a PQP. Mas aí pensei que com aquela grana eu poderia comer uma semana em Londres. E aceitei”.
Carregando pasta pra lá e pra cá, ele acompanhou o jornalista (sic!!!) até que este apontou para um homem mais adiante, cercado de belas mulheres e disse: olha lá o Graham Hill (ele participou da F-1 entre 1958 e 1975, sendo campeão duas vezes na categoria, em 1962 e 1968), vamos lá para entrevistá-lo.
Zampa tentou ponderar por que não deveriam ir até lá, mas diante das ameaças de lhe ter tomada a pasta e, claro os 100 dólares, cedeu. O cara chegou lá e falou: Graham Hill, sou jornalista do Brasil etc., etc., etc. … e começou a perguntar coisas para o “piloto”. As moças riam e o entrevistado também. E o Zampa, ficou quieto, mas, claro, exibindo a sua conhecida cara de zombeteiro.
Depois de muitas perguntas, o Zampa afinal manifestou-se: cara, este aí… nas foi interrompido bruscamente pelo jornalista, que ameaçou novamente tomar-lhe a pasta e cancelar o “contrato”.
Mas, desta vez, o “carregador” não aguentou e disse: cara, este aí não é o Graham Hill, é o David Niven, conterrâneo do piloto inglês e também campeão na sua categoria, tendo ganho o Oscar de melhor ator em 1958 por sua atuação, por apenas 15 minutos, no filme Separate Tables exibido aqui no Brasil como “Vidas Separadas”. Ele deveria ter ganho também o Oscar de melhor interpretação de um piloto de F-1, respondendo às perguntas do equivocado jornalista com maestria. Como se fosse o verdadeiro Graham Hill
A razão do equívoco: bem, primeiro pela arrogância. Se tivesse ouvido o Zampa não teria “pago aquele mico”, depois, talvez porque ambos tinham Graham no nome (o ator era James David Graham Niven). E o principal era o característico bigodinho inglês, fino e comprido, que emoldurava a boca de ambos.
Nunca perguntei, nem o Zampa falou, se recebeu ou não os 100 dólares acordados. Mas o que vale mesmo é a história que ele contou, não é verdade? Entre os jornalistas do setor, existem dezenas de outras incríveis histórias como essa, do querido Zampa.
Obs.: É preciso esclarecer, aos que não sabem, é que David Niven era apaixonado pela F-1 e assistia a todos os GPs que podia.
CL