Uma história puxa a outra… Foi assim neste caso também. Meu amigo Fernando Fuhrken vai contar nesta matéria como foi a sua visita ao AutoPavilion feita dias antes da tragédia relatada na matéria “NOVE CARROS DO AUTOPAVILION VW DA ÁFRICA DO SUL SÃO DESTRUÍDOS EM ACIDENTE”.
O Fernando já participou aqui na coluna “Falando de Fusca & Afins”. Foi a matéria “FUSCA “ITAMAR” AZUL SATURNO É PREMIADO EM RIBEIRÃO PRETO” ele tinha sido o dono do VW Fusca de que a matéria trata.
A foto de abertura mostra de um lado o que infelizmente ocorreu com carros do museu e de outro lado, como eles foram fotografados no AutoPavilion pelo Fernando, cujo relato segue abaixo.
Minha visita ao AutoPavilion um pouco antes da tragédia
Por Fernando Fuhrken
Escrevo este relato por sugestão do amigo Alexander. Recentemente entrei em contato com ele após ler uma de suas últimas matérias. Era a do pavoroso acidente ocorrido no longínquo ano de 2007 que arruinou carros históricos do museu da VWSA (Volkswagen of South Africa). Eu tinha fotos dos carros que viriam a ser destruídos no acidente e as submeti nesse contato.
Ele identificou a natureza insólita do caso e me propôs escrever um breve relato sobre os eventos. Descrevo, assim, o caso, contextualizando-o. Falo sobre o museu da VWSA — o AutoPavilion, lembrando que morei na África do Sul entre os anos de 2006 e 2007.
Contexto
Pois bem. Em 2006 eu era funcionário da engenharia da Volkswagen de Caminhões e Ônibus. em Resende, RJ Foi-me oferecida então a oportunidade de fazer parte de um programa de trabalho global, no qual eu residiria na África do Sul representando a engenharia. O objetivo era o desenvolvimento de produto para produção local.
Resumidamente, uma oportunidade incrível. Aceitei a oferta de pronto. O aceite envolvia seus riscos, pois sendo de natureza técnica, os meus únicos conhecimentos sobre a África do Sul se resumiam a meia dúzia de fatos:
1. A África do Sul ter sido operada pela Companhia das Índias Ocidentais (aprendi no colégio)
2. A África do Sul ter sido palco da horrível Guerra dos Boers (colégio, de novo)
3. A existência de ondas perfeitas em Jeffrey’s Bay (sou do Rio de Janeiro; surfe lá é religião.)
4. Origem dos pioneiros e caríssimos chips de potência UniChip
5. A VWSA ter fabricado inúmeras versões locais únicas e ainda fabricar (na ocasião) o Golf MK1
6. Lá ter sido fabricado o Puma (sim, o nosso Puma de carroceria de compósito de fibra de vidro)
Pois bem, de seis itens que eu conhecia, metade era relacionada a assuntos automobilísticos. Daí se depreende um pouco do meu perfil, o fato de eu ter ido parar na África do Sul e finalmente de conhecer um museu VW no interior do país.
Sobre o museu e o trágico acidente
A VWSA concentra a sua operação na região metropolitana de Gqeberha (antiga Port Elizabeth), especificamente na cidade de Kariega (antiga Uitenhage). O museu, por sua vez, fica ao lado do portão principal da principal fábrica da Volkswagen entre quatro que existem num mesmo bairro de Kariega.
O deslocamento entre as fábricas é por via pública. É um local industrial, pouco movimentado. Eu trabalhava em outra fábrica, de engenharia (chamada “B Plant”, uma espécie de lá da Ala 17 de engenharia da fábrica Anchieta) e me deslocava algumas vezes por semana para outra fábrica onde ficava a operação de caminhões. No caminho, passava em frente ao museu e o visitava vez por outra já que funcionários não pagavam. As visitas nesses casos geralmente eram rápidas, principalmente para comprar miniaturas na lojinha de merchandising.
As fotos dos carros antes do acidente, são as da primeira visita que fiz ao museu. Devido a um volume de trabalho pesado no período inicial em que vivi lá, só consegui visitá-lo depois de alguns meses.
O museu, em sua versão atual, havia sido inaugurado recentemente e contava com enorme interesse por parte de pessoas comuns. Isso eu ouvia nas inúmeras vezes em que me apresentava fora do ambiente de trabalho. Sabia que o acervo era bom. Portanto, como bom gearhead reservei algumas horas, próximo à época mais tranquila de fim de ano, para uma visita decente.
A impressão se confirmou e o museu se mostrou não apenas bom, mas incrível! Os pontos altos eram a qualidade dos carros expostos e as peculiaridades exclusivas de modelos sul-africanos. Eu imaginava encontrar modelos medianamente restaurados, mas na verdade tratava-se de carros realmente novos e representantes de momentos históricos — indicavam ter havido planejamento prévio muito bem feito em se montar um acervo.
Atualmente, como funcionário da VW Automóveis, fico feliz em saber que a VW do Brasil está promovendo algo semelhante e expondo vários produtos específicos do mercado brasileiro e que inclusive despertam interesse estrangeiro.
Por fim, logo no começo do ano seguinte já imerso em trabalho, recebo a informação sobre o acidente. Curiosamente a notícia veio do amigo carioca e autoridade em Passat André Grigorevski. Num primeiro momento a informação do acidente correu de forma velada. Posteriormente lembro que VWSA divulgou releases sobre os eventos dada a comoção causada. Uma das divulgações constava na entrada do museu e agradecia as inúmeras manifestações de entusiastas e clientes.
Os sul-africanos carregam uma relação de afeição imensa com a marca VW. Desde épocas antigas, o início da operação da VWSA foi em 1951, anterior até mesmo do da VW do Brasil, que foi fundada em 1953.
Essa afeição pela marca foi sacramentada pelo Golf MK1. Esse Golf de primeira geração permaneceu em produção com a introdução do Golf MK2 em 1984. Foi rebatizado como Citi Golf e era oferecido em apenas três cores vermelho, amarelo e azul — tons da moda dos extravagantes anos 1980. Era uma oferta despretensiosa e uma alternativa econômica. De forma improvável o Citi Golf acabou sobrevivendo não apenas ao Golf MK2, mas também até mesmo ao Golf MK5. O MK1 viveu até 2009 como um meio de transporte jovial e acessível.
Mais detalhes sobre o Citi Golf, que foi uma peculiaridade sul-africana, podem ser vistos na matéria “GOLF CITI — UMA HISTÓRIA DE AMOR”.
Revendo alguns dos carros que foram acidentados quando ainda estavam no AutoPavilion
Com base nas fotos que o Fernando colocou à disposição eu fiz este levantamento, em especial mostrando o estado impecável destes exemplares enquanto preservados no museu. As fotos, todas dele, serão apresentadas na ordem em que o Fernando as tirou.
Réplica simplificada de um Herbie, que na ocasião estava estacionado na entrada do AutoPavilion:
Passat GLS SE ano 1979, quatro portas, versão luxo. Este Passat foi uma versão que só existiu na África do Sul, era um face-lift do modelo original 1973, que combinou a traseira do alemão 1977 e a frente do Audi 80 (que também foi usada no Brasil nos modelos 79-82):
Audi Coupé S 1975, com câmbio automático:
Audi Super 90 ano 1970:
Audi 100 S, ano 1973:
Sports Bug 1978, uma série especial com sua característica faixa que atravessa o teto:
Finalizando esta série de fotos o último Kombi fabricado na África do Sul, ano 2002:
Todos estes carros e mais dois VW Fusca, o último a ser fabricado lá e um ano 1958, foram reduzidos a ferro retorcido dada a intensidade do acidente com o conjunto transportador.
Para quem não leu a matéria anterior sobre este assunto, reapresento algumas fotos do estado em que estes carros ficaram (todas fotos são do Facebook de Air-Cooled Culture, passionate about VW Beetles in Cape Town, South Africa):
Curiosidade: o projeto 1021 da VWSA
A VWSA desenvolveu um estudo para uma camioneta, inclusive em versão picape, tendo por base um chassi de VW Fusca. Um dos protótipos foi preservado no AutoPavilion:
Há várias outras curiosidades e carros históricos no acervo do AutoPavilion que poderão fazer parte de uma outra matéria.
Agradeço ao Fernando Fuhrken por mais esta participação na coluna “Falando de Fusca & Afins”, onde os “Afins” desta vez foram os Audis que brilharam na África do Sul. A presença de Audis por lá começou em 1968 com a introdução do Audi 90, de tração dianteira, montado na África do Sul, e que era rápido, confortável, econômico e “estiloso”. Seguiram se vários outros modelos conforme a evolução ia ocorrendo na Alemanha.
Mas, sem dúvida, o maior sucesso da marca por lá foi o VW Fusca que foi campeão de vendas por muitos anos seguidos.
AG
NOTA: Nossos leitores são convidados a dar o seu parecer, fazer suas perguntas, sugerir material e, eventualmente, correções, etc. que poderão ser incluídos em eventual revisão deste trabalho.
Em alguns casos material pesquisado na internet, portanto via de regra de domínio público, é utilizado neste trabalho com fins históricos/didáticos em conformidade com o espírito de preservação histórica que norteia este trabalho. No entanto, caso alguém se apresente como proprietário do material, independentemente de ter sido citado nos créditos ou não, e, mesmo tendo colocado à disposição num meio público, queira que créditos específicos sejam dados ou até mesmo que tal material seja retirado, solicitamos entrar em contato pelo e-mail alexander.gromow@autoentusiastas.com.br para que sejam tomadas as providências cabíveis. Não há nenhum intuito de infringir direitos ou auferir quaisquer lucros com este trabalho que não seja a função de registro histórico e sua divulgação aos interessados.
A coluna “Falando de Fusca & Afins” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.