Segundo relata o site da revista Autoweek, a prefeitura de Detroit está empenhada em concluir a demolição da enorme e histórica fábrica da Packard ainda este ano. Porém, o processo de demolição iniciado em setembro de 2022 vem se arrastando não só devido às grandes dimensões da f, mas também pela escassez de recursos.
Agora, a prefeitura da cidade que já foi denominada com toda pompa de Motorcity (cidade do automóvel) afirma que poderá usar US$ 26 milhões de dólares destinado ao combate da pandemia da Covid, conforme a Lei do Plano de Resgate Americano, para concluir a demolição da fábrica que originalmente tinha 47 prédios espalhados em uma área de 35 acres (pouco mais de 140.000 m²).
A fábrica da Packard Motor Car, que é considerada um dos marcos iniciais do acelerado processo que criou no começo do século passado a revolução na produção de automóveis, acabou se transformando no exemplo mais emblemático da praga que assola Detroit há várias décadas com dezenas de prédios de fábricas de automóveis e componentes totalmente abandonados.
Após os encerramentos das atividades industriais da Packard, em junho de 1956, a fábrica ainda foi utilizada como apoio às linhas de produção de outras marcas e também teve áreas alugadas para pequenos fabricantes de autopeças, mas isso acabou sendo reduzido drasticamente no fim da década de 1970 e a área ficou abandonada até meados dos anos 1990.
Em 1994 a prefeitura da cidade reivindicou a maior parte da propriedade, depois que seus donos não conseguiram pagar os impostos atrasados. Porém, pela falta de um projeto de recuperação, com o tempo o local se tornou uma das áreas mais degradadas da cidade, virando depósito de pneus, móveis usados e todo tipo de lixo ali despejados ilegalmente.
Com a falta recursos para a demolição, a área continuou abandonada até 2013, quando o arquiteto e empresário espanhol Fernando Palazuelo, radicado atualmente no Peru, comprou a hipoteca da fábrica pela pechincha de US$ 405 mil, em leilão, com um grande plano de recuperar partes dela em um empreendimento de uso misto: comercial, residencial e cultural.
Palazuelo declarou à Associated Press em 2014 que o custo total da reconstrução deveria ficar próximo de US$ 350 milhões, com recursos próprios e de outros investidores. Mas não conseguiu reunir o financiamento necessário para o projeto e, em 2016, pediu à Câmara Municipal que aprovasse o congelamento de impostos por 12 anos.
Como Palazuelo não fez praticamente nada na área desde 2013, nos últimos anos a cidade entrou com diversas ações judiciais e impôs prazos para pagamento de impostos sobre a propriedade, contas de drenagem e multas relativas a pragas. Como nenhum deles foi cumprido, a cidade assumiu novamente a propriedade e iniciou a demolição de um prédio por vez.
Recentemente, segundo a Autoweek, a prefeitura realizou entrevista coletiva de imprensa no local sombrio e lamacento para anunciar os planos ambiciosos de concluir toda a demolição ainda este ano. Mas, segundo a publicação, não será surpresa se a meta não for alcançada, pois podem faltar caminhões ou aterros suficientes no estado para levar o entulho dos escombros.
Após a demolição, a prefeitura de Detroit planeja reabilitar o local para possibilitar que novas fábricas, em especial fornecedores de autopeças, possam investir em novas e modernas instalações. Mas há também o plano de preservar o grandioso portal que marcava a entrada principal da fábrica na avenida E. Grand Boulevard para guardar uma parte da importante história.
Pioneirismo histórico
A Packard iniciou suas atividades em 1899 na cidade de Warren, estado de Ohio, fundada por James Ward Packard, seu irmão William e o sócio George Lewis Weiss, com a denominação New York and Ohio Automobile Company, enquanto os modelos já eram denominados Packard e cerca de 400 carros foram construídos em Ohio até 1902.
Mas a marca acabou sendo uma das pioneiras a se instalar em Detroit, após seu controle acionário ser assumido por um grupo de investidores liderados Henry Bourne Joy, membro de uma das famílias mais tradicionais e ricas da futura Motor City, que comprou um modelo Packard e ficou impressionado com sua confiabilidade.
A nova empresa passou a ser denominada Packard Motor Car Company, com James Packard como presidente e Henry Joy assumindo o cargo de gerente-geral e, posteriormente, presidente do conselho, enquanto as operações foram transferidas para Detroit em uma moderna fábrica instalada na enorme área de 35 acres no East Grand Boulevard.
Inaugurada em 1903, foi a primeira fábrica desenvolvida especificamente para a produção de automóveis em Detroit e teve seu projeto arquitetônico assinado por Albert Kahn que, com este trabalho, ganhou fama na cidade e acabou projetando diversas outras obras importantes como a fábrica da Ford em Highland Park e o enorme complexo Ford de River Rouge, além da imponente sede administrativa da General Motors. Parte do sucesso do arquiteto, além de seu talento, também se deve a parceria com seu irmão Julius, engenheiro civil que desenvolveu um método científico de reforçar concreto com aço, tornando a construção em concreto armado prática, rápida e econômica. A patente “Sistema Kahn” permitiu que a enorme obra, na época, fosse concluída em poucos meses.
Apesar de não ter alcançado as dimensões e importância da General Motors e Ford, a Packard foi importante marca de veículos de prestígio na primeira metade do século 20 e o primeiro fabricante a lançar um modelo com motor V-12, em 1915. O prestigio era internacional e foi a marca de luxo mais vendida na década de 1920. Em 1931, dez modelos Packard faziam parte da frota da Casa Imperial do Japão. A empresa também teve participação ativa no esforço americano na Segunda Guerra Mundial, quando fabricou as versões de 40,8 litros do motor V-12 Liberty L-12, além de ter fornecido 55.523 unidades do supercarregador de dois estágios/duas velocidades, que equipavam os motores Merlin V-12, de 27 litros da Rolls-Royce.
Porém, após o fim da guerra, a marca perdeu seu brilho e administrações confusas levaram a empresa à ruína. Vários historiadores da indústria automobilística afirmam que a “pá de cal” foi a fusão com a Studebaker, em 1953. A Studebaker-Packard Corporation acabou entrando em bancarrota em 1956, com o passivo da sociedade assumido pela Curtis-Wright Corporation, que lançou os últimos modelos Packard em 1957 e encerrou a produção da marca em julho do ano seguinte.
RM