Estes dias o meu amigo Guilherme King, de Nova Iguaçu, RJ, me enviou uma mensagem pelo Instagram falando dos preparativos para sua nova aventura. Logo me interessei, pois acho que viajar de VW Fusca pelas estradas do mundo é o sonho de muitos.
Entrei em contato com ele e fiz uma entrevista, que reproduzo abaixo:
AG: Conte quem é Guilherme King.
GK: Tenho 47 anos, sou ex-militar do Exército Brasileiro, pratico tiro desportivamente, sou empresário do ramo de estética automobilística e entusiasta de automóveis antigos, em especial Volkswagens clássicos.
AG: Você é conhecido entre os apreciadores de automóveis antigos. Por quê?
GK: Sou produtor de encontros de carros antigos no Rio de Janeiro. Sou administrador do perfil @carrosantigosrj no Instagram, também sou membro do Clube de Carros Antigos Nova Iguaçu.
AG: Fale de seu Fusca e qual é o motivo do seu apelido “Bumblebee”?

GK: É um VW Fusca 1300 ’74 amarelo Safári. Eu o apelidei de Bumblebee porque quando o achei ele estava largado no fundo de um sítio em Japeri, a 40 quilômetros daqui, com um monte de coco seco em volta dele e num para-lama dianteiro havia uma colmeia de abelhas pequenas. Aí eu me lembrei do filme do Bumblebee, cujo herói, um VW Fusca amarelo que era capaz de se transmutar num transformer, foi achado pela Charlie (Hailee Steinfeld) no ferro-velho com abelhas nele.

Por coincidência, meu VW Fusca participou do casamento da dubladora da Charlie para o português do Brasil, Amanda Manso. Ela chegou à igreja do seu casamento no meu carro, com direito a um personagem caracterizado de transformer do Bumblebee na chegada.

AG: Quando e como você teve a ideia do desafio de ir até Ushuaia de Fusca?
GK: Eu sofro de depressão refratária [NR: A depressão refratária, também conhecida como depressão resistente, é um transtorno que não responde ao tratamento convencional] e dois anos atrás tive uma crise muito forte, larguei tudo e fui fazer um mochilão [NR: O mochilão (“Backpacking”) é uma forma de viagem independente e de baixo custo, que muitas vezes inclui hospedagem em acomodações baratas e carregar todos os pertences necessários numa mochila, e até fazer acampamentos minimalistas] de Rio das Ostras, RJ, até o Uruguai a pé sem 1 real no bolso.

Em cinco dias cheguei ao Uruguai. Fui pedindo carona, além de andar em média 20 a 32 km por dia. Lá fiquei quatro meses na mata acampando, caçando, pescando e não tive nenhuma crise. Foi aí que percebi que a minha válvula de escape contra essa doença é a viagem e a natureza.

Além disso, quando vou a encontros de carros antigos é como se eu estivesse noutra época, noutra geração, isso me deixo muito bem mentalmente.
Em 2017 conheci o Jesse Koz (viajante que morreu num acidente com seu VW Fusca nos Estados Unidos onde estava viajando tendo partido do Brasil) em Balneário Camboriú, SC e nos 5 ou 10 minutos de papo com ele sobre seu projeto achei aquilo muito legal. Depois de alguns anos comecei a segui-lo e acompanhar a sua jornada pela internet, aquilo me acalmava e alimentava meu sonho de fazer o mesmo e finalmente aqui estou me preparando para seguir o legado do Jesse e realizar meu sonho (o papo foi muito rápido mais ele me passou uma vibração pura demais).
AG: Você já fez o mapa de sua viagem? O trajeto de ida será o mesmo que o de volta? Quantos países você vai percorrer e você já estabeleceu etapas a percorrer por dia?
GK: Estimo que sejam em média 400 km por dia e já tenho alguns pontos de apoio espalhados de Resende, RJ até Tubarão, SC.
O trajeto normal dessa viagem seria um pouco mais de 5.000 km, mas na rota que montei serão mais de 14.000 km, pois irei visitar cidades, lagunas e montanhas não turísticas, explorando o interior do Uruguai, Argentina e uma boa parte do Chile.
Sobre a volta ainda não sei se de Ushuaia (ponto final dessa expedição) eu voltarei ao Brasil, pois se tudo der certo quero fazer a Rota Panamericana até o Alaska, rota esta que começa em Ushuaia. Caso eu volte para o Brasil a distância normal a percorrer seria de 5.000 km.
AG: E o que você teve que fazer em seu VW Fusca para prepará-lo para esta viagem/desafio, do lado mecânico e de estrutura?
GK: Foram vários itens que receberam uma atenção especial como proteção térmica interna, caixa d’água no teto para banho e outros usos, bagageiro e maleiro, cozinha no bagageiro dianteiro (em construção), cama no interior do VW Fusca, reforço na suspensão, troca de todas as juntas e embreagem, pneus Tamura alta rodagem, freios, cabos e velas novas, sistema de navegação e som, e para-brisa laminado degradê para que em caso de acidente ele não voe em pedaços sobre mim.

Também houve uma surpresa desagradável no piso do carro que mereceu uma atenção especial. A parte com problemas foi recortada, depois foi soldado um pedaço de piso novo. Finalmente foi aplicada a isolação térmica no piso dos dois lados:

AG: E para morar no Fusca, o que foi necessário fazer?
GK: Eu tive que tirar o banco do passageiro e o banco traseiro para colocação da cama, do guarda-roupa e da geladeira que vai ficar atrás do banco do motorista.

Além disso embaixo deles, onde era o banco traseiro, vai ficar o sistema de bateria de íons de lítio e controladores da energia solar (uma placa solar instalada no teto carrega a bateria de íons de lítio que alimenta a geladeira, as luzes internas e o ventilador).
A cozinha fica sobre o tanque aproveitando todo o espaço que tem ali no porta-malas dianteiro; com uma bandeja estilo gaveta para o fogareiro que desliza para fora do capô:

AG: Quais serão os seus recursos de navegação e comunicação? Como você fará o acesso à internet durante o percurso? Existirão muito pontos sem comunicação?
GK: Todo o cotidiano da viagem será postado ao vivo no Instagram @ofuscaporai pretendo colocar no VW Fusca uma antena Star Link mas até lá, no início, a navegação será só pelo iPhone mesmo. Ainda sobre a navegação tenho uma multimidia carregada com aplicativo iOverlander para estudar pontos de parada e o Google Maps. [NR.: O iOverlander é um aplicativo de viagem que funciona como um banco de dados de locais para viajantes. Ele pode ser útil para quem viaja de carro, motorhome ou moto]
AG: Você contará com algum tipo de apoio durante este desafio?
GK: Sim, de DEUS e de meus seguidores (risos). A ideia é mostrar os perrengues mesmo. Além disso, farei conteúdo sobre pesca e acampamento selvagem longe de civilização com dicas de sobrevivência na selva em caso de se perder ou algo do tipo.
AG: Que ferramentas e peças de reserva você está levando para a viagem?
GK: Levo bobinas, cabos, correias, para-brisa, pneus, lâmpadas, fusíveis, hastes de limpadores de para-brisa e suas palhetas, rotor do distribuidor, alternador e ferramentas padrão de manutenção.
AG: Você está levando suprimentos, ou o irá adquirindo pelo caminho?
GK: Levarei alguns não perecíveis como café, açúcar e grãos além de latas de gás para o fogareiro e um fogão a lenha caso acabe o gás, além de pederneira, faca e material de pesca e caça.
AG: Como será possível ir acompanhando o desenrolar deste desafio?
GK: O meu endereço na Internet é @ofuscaporai que pode ser acessado nas plataformas: Instagram, YouTube e TikTok.

[NR: quanto ao Salmo indicado no logo acima próximo à imagem do Cristo Redentor: o Salmo 23:4 diz: “Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal algum, porque tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me consolam”. O Salmo 23 é sobre um bom pastor, que guia as pessoas em caminhos retos e de justiça. O versículo 4 transmite a ideia de que, mesmo em situações difíceis, a convicção em Deus torna as pessoas destemidas]
AG: Você fez contato com outros que já fizeram este percurso? Que tipo de preparo logístico foi possível fazer?
GK: Eu conversei com muitos viajantes que foram de VW Fusca e de VW Kombi para este e até para trajetos mais longos (não é impossível, mas basta lembrar que se trata de um carro com mais 50 anos de idade e que tem suas limitações, mas que ainda é um GRANDE GUERREIRO)
AG: Conte quem já colaborou com a sua aventura? Algum apoio em especial?
GK: Eu ressalto que o apoio mais especial para mim é o da minha equipe técnica da LOGUS: Abraão, que é o mecânico-chefe, João, que é o gerente de projeto, e o Luiz, mecânico e o piadista da turma (risos). A pneus Tamura, cujos pneus vou usar e reportar seu comportamento no decorrer desta aventura. E a VW Auto Iguaçu. Todos os apoiadores são muito importantes e são a base do projeto, sem eles esta aventura não sairia do papel.
AG: Existe algum meio que permita ao pessoal colaborar com as suas despesas? Você tem patrocinadores?
GK: Eu tenho poucos patrocinadores, pois percebi que a maioria das empresas acharam essa ideia uma loucura (risos).
Mas os seguidores podem colaborar com o projeto com qualquer valor
pela chave PIX: ofuscaporai@gmail.com (serei muito grato!).
AG: Como a sua família está vendo esta sua decisão de partir para o “fim do mundo” de Fusca?
GK: Do mesmo modo que as empresas a quem pedi patrocínio (risos). – Mas minha filha Letícia, de 17 anos, está me dando força, pois ela sabe que ficarei longe dela, mas é para o meu bem mental e físico, além de realizar um sonho. Também o meu irmão de coração, o Renan Sabatini, que atualmente é meu sócio na nossa empresa de estética automobilística, também está me apoiando. Ele não entende, mas me apoia (risos).
AG: Deixo este espaço livre para os comentários que você gostaria de fazer.
GK: Eu só gostaria de dedicar essa expedição a todos os portadores de depressão. Você não é fraco, a depressão não é frescura. E a dica que eu dou é a seguinte: “Procure a sua válvula de escape” para não perder a guerra para essa doença maldita! Seja forte você é mais forte do que pensa não vai ser fácil, mas desistir jamais!
Mensagem de um grande viajante de VW Fusca pelo mundo
Tenho um bom amigo, Nauro Júnior, que já desbravou toda a América do Sul com seu VW Fusca, “Segundinho” que leva uma carretinha e uma barraca no teto. Ele levou seu VW Fusca para a Europa para a Copa do Mundo de Futebol na Rússia. Ele registrou as suas experiências no livro: “A Vida Cabe em um Fusca”.

Eu pedi ao Nauro que escrevesse uma mensagem para o Guilherme, que reproduzo abaixo:
”Meu amigo: Não existe aventura. Existe projeto e planejamento. Ir de Fusca é uma opção para quem é autêntico e não pensa só em redes sociais. Não pensa em ficar famoso. Qualquer carro é melhor de viajar que um Fusca. Mas não existe melhor professor que o Fusca. Vai com fé. Vai por ti. Vai pelos que você ama. Com as mãos no volante do meu Fusca e com o horizonte no para-brisa me curei de todas as doenças. As físicas e as da alma. Patagônia é só um lugar. E fica pertinho. A grande viagem tem que acontecer dentro de ti.”
Resta desejar ao Guilherme tudo de bom em sua aventura, que tudo se realize em segurança e como ele planejou. Vou ficar “na escuta” acompanhado o seu itinerário seja para onde ele for. Todas as fotos, a não ser as identificadas ao contrário são do Guilherme King.
Fica aí o pedido, para quem puder, além de acompanhar a aventura do Guilherme, também ajudar com uma contribuição via PIX para as despesas.
AG
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