A verdadeira revolução do automóvel veio da informática que passou a gerenciar todos seus mecanismos. Lembrando, além disso, que mais dia, menos dia, o carro será elétrico e autônomo. Mas, diversos dispositivos eletrônicos desenvolvidos para os automóveis se tornaram fonte de aborrecimento para seus donos. E de prejuízo para as fábricas, que acabaram por desativar vários deles.
Joystick da Estrela
O F-200, um carro-conceito apresentado pela Mercedes Benz em 1996, tinha uma alavanca — tipo joystick, aquela alavanquinha de jogos eletrônicos — no console que substituía seus principais comandos: volante, freio e acelerador (foto de abertura). Não foi além do conceito, mas a fábrica aproveitou a ideia para instalar joystick semelhante com quase todos os demais comandos do automóvel. Acionava quase seiscentas funções, mas tão complexa que uma pesquisa da fábrica pouco depois do lançamento revelou que os motoristas não se utilizavam sequer 10% de seu potencial. Logo abandonada diante da comprovada inutilidade.
Comando de freio eletrônico
O de estacionamento veio para ficar. Mas o sistema principal ainda não emplacou. Há novas tentativas, mas quem já tinha tentado, entre 2003 e 2006, foi a Mercedes Benz, nos modelos Classe E, CLS e SL. Teoricamente, uma ótima ideia, pois substitui o circuito hidráulico (com fluido que pode vazar) por impulsos elétricos que acionam um motor em cada roda. Podem ser ajustados isoladamente, distribuir o esforço do pedal de acordo com as necessidades de cada eixo ou roda, e outros controles. Mas falhas forçaram a fábrica a submeter cerca de dois milhões destes modelos a dois recalls. A rigor, na falha do elétrico, entrava automaticamente o emergencial, hidráulico. Mas, enquanto a distância de frenagem aumentava, a confiança dos motoristas diminuía…
Câmbio automatizado
Chamado também de robotizado, nada mais, nada menos que uma caixa manual controlada eletromecanicamente que dispensa pedal de embreagem, que é automática, e a tradicional alavanca de mudanças em “H”, que é semelhante à alavanca seletora dos câmbios automáticos. No sistema mais simples e barato, um microprocessador comanda todo o processo para a troca de marchas. Adotado com vários codinomes no Brasil, acabou aposentado por engasgos, travadas, sacolejos e outros atropelos. Porém, o mais sofisticado, de duas embreagens, é o “estado da arte” dos automáticos, com exceção do caótico PowerShift adotado pela Ford.
Retrovisor por câmera
Espelhos retrovisores externos sempre foram uma pedra no sapato dos designers que tentam carros com silhuetas as mais aerodinâmicas. Um radar em seu lugar foi sopa no mel e a Audi chegou a concretizá-lo nas portas dianteiras. Mas quem achou a sopa amarga foram os motoristas que não se convenceram da praticidade de procurar a imagem externa numa tela embutida na porta.
Waze na favela
Uma genial invenção que eliminou a necessidade de mapas para orientar motoristas. Entretanto, o sistema que indica o roteiro sempre calcula a menor distância entre dois pontos. E desconhece a existência de eventuais regiões perigosas onde podem estar concentrados marginais armados. Já se registraram vários ataques a turistas desavisados que confiaram no caminho indicado pelo software. Mas tramita no Congresso Nacional o recente Projeto de Lei nº 1169/2025 do senador Wilder Morais ((PL-GO) que obriga provedores de aplicativos de navegação a indicar nas suas plataformas áreas de alto risco de crime como destino final ou passagem, podendo a função ser desabilitada pelo usuário.
Cilindros variáveis
No inicio da década de 80, com a eletrônica ainda cambaleante, a GM teve a péssima ideia de adotar no motor V-8 do Cadillac o sistema de desativação de dois ou quatro cilindros. A fábrica o anunciou como o motor “V8-6-4”. Mas os problemas técnicos eram os mais variados e o principal aborrecimento era o sistema não reativar os cilindros desligados, o motor permanecer com apenas quatro e empacar nas subidas… A maioria destes Caddys foi levada para a oficina onde o dono implorava ao mecânico desativar o sistema de desativação…
Suspensão mágica
Perfeita para nossas ruas e estradas, a Bose, empresa famosa por seus sistemas de sonorização, decidiu investir numa suspensão que mantivesse o carro sempre nivelado com o asfalto. Ignorava valas, valetas, buracos, crateras e a[e lombadas. Um radar identificava o desnível e neutralizava o movimento vertical daquela roda. Que passava “voando” pelo buraco, anulava qualquer movimento da carroceria e os ocupantes nada sentiam. Vídeos mostravam isso bem.O sistema funcionou corretamente mas era muito caro e pesado, pois era um motor acoplado a cada amortecedor. A Mercedes Benz e a Ford desenvolveram protótipos com sistemas semelhantes, que nunca foram aplicados em modelos de produção. A BMW também arriscou a mesma solução no i7 e agora, na contramão da história, a chinesa NIO aplica a ideia ocidental em seu suve cupê ET9. A patente estava em mãos de uma startup americana que a tinha comprado da Bose.
Pra quê mesmo?
Primeiro foram as telas multimidia. Algumas horizontais, outras verticais. Foi pouco: surgiram também as que giram e ficam de pé ou deitadas. Pra quê, mesmo?
Veio também o comando de voz. Nada de botão. Mas, o motorista pode estar rouco: veio então o comando por gestos. E o reconhecimento facial. E o digital. Pra quê, mesmo?
E aí, mais um passo em direção ao carro autônomo: o Adas, assistência eletrônica ao motorista. Entre outras, te joga de volta no centro de sua faixa se você não aciona a seta.
No meio de todo este furor eletrônico, a boa notícia: Volkswagen (e outras) estão voltando aos botõezinhos. Já vou poder sintonizar minha rádio preferida….
BF
A coluna ¬Opinião de Boris Feldman” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.
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