Vejo essa questão de maneira bem simples. Há os que compram determinado modelo por apreciar esse bem de consumo durável, curti-lo, ter o prazer da sua posse, dirigi-lo, e há quem utilize todos os meios — legítimos, frise-se — para fazer pleno uso da Lei de Gerson a seu favor. Essa “lei” surgiu depois que o meio de campo e niteroiense Gérson de Oliveira Nunes, campeão mundial em 1970 quando tinha 29 anos, protagonizou um comercial para televisão dos cigarros Vila Rica no qual dizia “Gosto de levar vantagem em tudo, certo? Por isso fumo Vila Rica.”
A força de convencimento do comercial foi atribuída à sua posição no campo, sabidamente a que exige o maior fôlego de todas, e ao fato de Gerson ser fumante.
A vantagem a que ele se refere está no binômio qualidade-preço. Veja:
Há muitos aspectos do “levar vantagem”. Escolher a cor que seja mais fácil de vender é bem conhecido. A pessoa se priva da cor que mais gosta por recear desvalorização. Repare que na paletas de cores dos fabricantes o amarelo praticamente não existe mais. Teriam eles detectado que essa cor não agrada e por esse motivo a suprimiram? Estranhamente, ainda se vê muito carros amarelos, mas antigos. Será que as pessoas esqueceram do sucesso dos Passats amarelos, em especial o TS? Ou dos Opalas? Ou dos Dodge Dart/Charger?
Tive três Passats amarelos em sucessão, LS duas-portas, LS quatro-portas e TS . E um Fusca 1500 básico amarelo para esposa, Dificuldade para vendê-los, zero.
Foram muitos os comentários de leitores sobre a Renault não dispor da cor amarela no Sandero R.S. (depois Renault R.S.). Principalmente depois que havia um no estande da fabricante no Salão do Automóvel de 2018, chamando muita atenção (foto de abertura).
Independente de gosto, o fato inegável é que o amarelo está no grupo das chamadas cores seguras, junto com o branco, o vermelho e o laranja. Mas isso não parece importar para muitos. E como se desconhecessem a importância de ser visto mais facilmente em meio ao trânsito, requisito para sua própria segurança. Num cruzamento de rodovia, tendo o carro uma cor visível ele será avistado bem mais facilmente pelo motorista do que vai efetuar a manobra. E isso pode fazer toda diferença.
São famosos os táxis nova-iorquinos amarelos. Quem ganha são os profissionais que os dirigem, tanto por seus carros serem avistados com facilidade pelos outros motoristas, quanto pelos seus clientes, os passageiros.
Branco, em São Paulo, passou a ser cor rejeitada depois que a prefeita Luiza Erundina (1989-1993) determinou que táxis comuns passassem a ser brancos. Comprar carro dessa cor era perder dinheiro. Só fui ver Honda Civic branco em Brasília alguns anos depois; aqui, nunca. A rejeição ao branco na capital paulista só terminou, e da noite para o dia, quando no Salão de 2010 todos os carros no estande da BMW eram brancos.
Falando de cor — questão de gosto — uma que eu jamais teria num carro meu é a que está na moda, a “cinza-rato”, pela semelhança com a cor do pequeno mamífero roedor. Não por ser feia, o que não é, mas por “sumir” no trânsito e em condições de visibilidade precária, com chuva neblina.
A “Lei de Gerson” foi muito praticada nos anos 1970-1980 quando havia carros fabricados aqui com câmbio automático. Havia o consenso de ser caro para adquirir e reparar, consumir mais combustível e ser pouco confiável, e de desvalorizar mais que o carro de câmbio manual. Quem gostava pensava em ter um, mas se refreava por não “levar vantagem”. Hoje, com o desenvolvimento e aperfeiçoamento dos câmbio automáticos de qualquer tipo — epicíclico, robotizado de dupla embreagem e CVT, o cenário inverteu e o câmbio manual caminha para extinção. É a lei de mercado de mãos dadas com a de Gérson.
Esse assunto é longo e não cabe numa coluna semanal, mas há algo que carece de explicação. Nos anos 1970-1980 câmbio automático era nicho e apesar disso existia. Nenhum fabricante deixou de oferecê-lo em razão de seu baixo volume. Hoje câmbio manual é que tem ares de nicho e ruma para o fim, como eu disse acima. Inclusive, não existem mais nas versões superiores de um mesmo modelo com câmbio manual. Lembrando que se os câmbios automáticos evoluíram, os manuais acompanharam.
Isso em plena era de grande facilidade de produção e seu planejamento não se poder escolher o câmbio como há 55-45 anos, é mesmo um grande mistério.
BS
A coluna “O editor-chefe fala” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.