O que vou lhes contar hoje é uma história mais curta do que as últimas, porém não menos emocionante e inesquecível.
Estava trabalhando no escritório regional da Volkswagen no Rio de Janeiro, e isto foi em 1979 quando meu primeiro filho acabava de completar um ano.
Eu era Chefe Regional de Assistência Técnica e tinha sob minha responsabilidade, um supervisor, e mais sete representantes que visitavam as 77 concessionárias da região. Nossa área de atuação era bem grande, começava na divisa de São Paulo com Rio de Janeiro, no eixo da Via Dutra, e se estendia até o Espírito Santo divisa com o sul da Bahia, na cidade de São Mateus, acho que isto eu já contei, mas é sempre gostoso relembrar os bons tempos.
Na Volkswagen, a Assistência Técnica era a responsável por acompanhar, entre muitos temas técnicos, as condições em que se encontravam as instalações das concessionárias, como ferramental, treinamento, fachada, identificação, pintura, oficina, piso, etc.
Quando se percebia que a capacidade de atendimento a clientes estava prejudicada devido à falta de espaço, conversava-se com os proprietários, também chamados de titulares, e demonstrávamos a necessidade de ampliação para um melhor atendimento e desenvolvimento do negócio como um todo.
Depois do “de acordo” do concessionário solicitávamos ao departamento interno da VW (GPIR – Grupo de Planejamento de Instalação de Revendedores), que tinha a planta original da concessionária, que fizesse um estudo para sua ampliação conforme demonstrava a necessidade do mercado local.
É importante salientar que naquela época as concessionárias eram construídas de acordo com um plano de evolução ao longo do tempo e que planejar um crescimento já estava contido em todos os projetos de novas concessões. A ampliação modular era fácil.
Como responsável pela área, recebi o projeto de ampliação da concessionária de Cabo Frio e a próxima etapa seria levá-lo para o titular, discutir o que havíamos planejado, e depois de ter tirado todas as dúvidas, fazer um planejamento para definição de quando estaríamos com a ampliação terminada, ou seja, o cronograma, o passo a passo.
As atividades no escritório eram muitas, a região, como já disse, era grande, viagens, visitas às concessionárias e ausência de casa com mulher e meu primeiro filho sempre me esperando.
Foi aí que me veio a ideia de fazer um passeio familiar a trabalho ou, como queira, um passeio a trabalho, familiar.
Precisava entregar o projeto de ampliação ao titular da concessionária, discuti-lo e obter o seu de acordo. O que fiz?
Convidei minha mulher para fazermos um passeio no sábado até Cabo Frio, local lindo e sempre comentado e admirado por ela que é carioca. Foi fácil convencê-la, difícil foi falar os motivos deste “passeio” que seria um bate e volta.
Tudo certo, convencida do “passeio”, pegamos a estrada ela, mais meu filho Maurício, em direção a Cabo Frio.
Passamos pela ponte Rio-Niterói, Itaboraí, Rio Bonito, Araruama, São Pedro da Aldeia e depois de rodar aproximadamente 170 quilômetros, chegamos a Cabo Frio.
O titular nos aguardava, fui ao trabalho enquanto minha mulher passeava com nosso filho no carrinho e lhe dava uma merecida refeição.
Nosso trabalho terminou por volta de meio-dia com resultado altamente satisfatório, projeto de ampliação totalmente aprovado e cronograma fixado.
Você pode estar perguntando: e a experiência de caminhoneiro, cadê ela?
Estava por vir. Durante o almoço, o titular conosco, falamos de muitas coisas menos de trabalho e um dos meus comentários foi o de nunca ter dirigido um caminhão.
Quando voltamos à concessionária, o titular me fez uma pergunta:
— Sua esposa dirige?
Respondi que sim, e ele perguntou se ela poderia levar meu carro de serviço até São Pedro da Aldeia. Fiquei sem saber o porquê daquela pergunta, mas a resposta veio em seguida.
— Tá vendo aquele Mercedes 1113 azul do outro lado da rua e carregado com 10 toneladas de sal? Precisa ser levado para São Pedro da Aldeia e se você quer ter a experiência de dirigir um caminhão, vou com você na cabine e sua esposa leva seu carro.
Não sabia realmente o que dizer, só sei que fiquei nervoso e apreensivo com a ideia.
Primeiro tomei uma aula de equipamentos à minha disposição, depois me familiarizei com o volante de direção, que não tinha assistência, mas a sua desmultiplicação a fazia ser leve e de fácil manejo, porém bastante lenta em suas reações.
Tentando sair da “responsa”, disse que minha habilitação B não era própria para caminhões, quando a resposta foi imediata: “Esqueça, aqui não tem controle. Vamos?”
Topei, minha mulher também, e fomos para a estrada. Minha primeira surpresa foi quantas voltas tive que girar o volante para contornar uma rotatória.
A embreagem e o acelerador até que eram confortáveis. O que foi realmente difícil foi controlar o “bichão” dentro da faixa de rolamento, a rodovia era uma pista de mão dupla e a largura do caminhão era para mim o maior problema; a folga na caixa de direção também não colaborava. Um olho na estrada e outro nos espelhos retrovisores observando os limites de faixas, esquerda e acostamento.
Em um determinado momento, depois de termos percorrido uns 15 quilômetros, apareceu uma subida e a necessidade de redução de marcha. Como havia dirigido muito o carro da minha mãe, um Ford inglês conhecido como Prefect (eram os carros das autoescolas em São Paulo na época em que minha mãe tirou sua CNH e meu pai, muito esperto, comprou um carro igual àquele no qual ela tinha aprendido a dirigir).
A mudança de marcha foi feita e de forma tão perfeita que o concessionário me disse: “Você mentiu para mim, você tem experiência em dirigir caminhões!” Aí lhe contei a história do Prefect no qual as reduções de marcha eram feitas por dupla-embreagem, uma pisada para tirar a marcha e outra para engatar a nova marcha, antes um acerto na rotação do motor para evitar arranhadas e trancos.
Chegamos a São Pedro da Aldeia sãos e salvos, caminhão carregado com sal porque o concessionário e seus irmãos tinham salinas na região. Sua casa de fazenda, que conheci, era privilegiada, a vista para frente era só sal e a para trás era só campo, onde ele tinha sua criação de gado Nelore.
Muito simpática e alegre, sua esposa, que eu já conhecia, havia preparado um cafezinho. Para encerrar esta história inesquecível, um fato curioso e motivo de muitas brincadeiras com o casal.
Neste tempo em que estive no escritório do Rio de Janeiro participei de vários lançamentos de novos veículos e uma “coincidência” incrível, a cada lançamento a esposa do concessionário estava grávida de mais um filho — foram quatro seguidos. Tudo começou em 1973 com o Brasília e foi até 1976 com o Passat TS.
RB
Nota – A foto de abertura é meramente ilustrativa, não é a do caminhão que o autor dirigiu.