Um dia meu pai comprou um Uno para ser um táxi. Era julho de 2006, férias da faculdade e trabalhando à noite, quando meu pai precisava de um favor: retirar o carro zero-quilômetro que acabara de comprar.
Eu já era casado, morava em outra casa e tinha o meu carro. Meu pai, motorista de táxi e dono de um Voyage 1995, precisava trocar de carro para continuar trabalhando, afinal o VW já havia chegado ao limite de permanência na praça (10 anos), pelo menos em São Paulo, Capital.
Ele vinha de uma sequência de táxis Volkswagen: Fusca, Passat, Voyage. Sempre versões básicas, para o batente.
Como a grana sempre andava curta para ele, decidiu mudar de marca (para minha surpresa!) e optou por um Fiat, o Uno Mille Fire!
Fomos buscar o carro e, na hora de trazê-lo, a surpresa: pensei que iria voltar dirigindo o Voyage, mas ele insistiu para que eu voltasse com o Uno… Foi a primeira vez que dirigi um carro novo, com plásticos nos bancos… Foi divertido! Andando sem placas (não abusei, juro!), sentindo o carrinho 0-km…puxava bem o esperto motor Fire 1,0 8V. Quase arrumei uma briga de trânsito por levar uma fechada e reclamar… Faz parte.
Depois de entregue, o Uninho foi emplacado e documentado por meu pai, e por um ano ficou rodando na praça, e sendo seu único carro.
O hodômetro marcava 54.000 km quando a doença de meu pai diagnosticada em 2005 começou a se agravar: câncer. O tratamento começou a perder a eficácia e em abril de 2007 ele já não trabalhava mais.
Em maio, o Uno foi lacrado particular para que outro motorista trabalhasse com o alvará. Meu pai faleceu em outubro do mesmo ano, sempre achando que um dia iria retornar ao batente…
O Uno muda de mãos, e não as minhas
Minha mãe assumiu o Uno e fiquei oito anos longe dele. Nunca gostei da postura possessiva dela em relação ao carro, o qual, na morte de meu pai, eu tive que me virar com o financiamento para não deixar o banco tomar.
Não acompanhei muito de perto o “uso” do Uno por ela, sabia apenas que seu irmão (meu tio) mecânico fazia a manutenção. Sem lembrar exatamente o ano em que aconteceu — acho que foi em 2012 —, minha mãe sofreu uma colisão em um cruzamento (não se feriu, só o susto!), onde a lateral traseira esquerda e a roda respectiva foram danificadas. A parte mecânica foi facilmente reparada com a troca da bandeja e da roda; já a funilaria, nem tanto.
Em outra manobra, ela bateu de traseira em um portão, perdendo o para-choque, danificando a tampa e quebrando as lanternas. Caramba!
Chegamos em 2016 e minha mãe decidiu vender o Uno, pois ficou com uma limitação na perna depois de um acidente (não de carro). Fez igual ao Salim na piada do relógio: “Meu filho, o carro está há tantos anos conosco, era de seu pai, possui um valor sentimental enorme… Quer comprar?”
Eu já vinha observando o Uninho empoeirado na garagem por um bom tempo — avaliando os problemas, abrindo o capô para dar uma olhada… Acho que ele ficou mais de um ano parado e desde a morte do meu pai tinha rodado apenas 3.000 km.
De volta às ruas, com muito trabalho
Bem, valor pago, vamos resgatar esse ícone da indústria italiana… Juro que não curtia Unos!
A bateria estava mortinha, então utilizei o carro do meu mecânico para a tradicional “chupeta” e levá-lo para sua nova casa.
Depois de tirar uma tonelada de poeira, troquei a bateria, os fluidos e os filtros para poder rodar mais tranquilo. Fui atrás de um bom funileiro para restaurar a traseira danificada — já tinha comprado as lanternas traseiras.
O serviço ficou nota oito e a tampa traseira foi salva — com um pouco de massa plástica — mas não precisei trocá-la.
Ganhou dois pneus novos — os dianteiros minha mãe tinha colocado antes de seu acidente, e os traseiros eram originais de 2006, bem carequinhas. Como os amortecedores traseiros estavam sem ação, aproveitei e troquei os quatro, além dos batentes.
Feita essa parte, tentei deixá-lo com menos cara de “Unão de firma”. Ganhou filme nos vidros, som Pioneer, alarme com bloqueador, vidros, travas e abertura do porta-malas elétricos. Além de faixas/frisos laterais e calotas escurecidas. Troquei os cintos traseiros fixos por retráteis, por causa da cadeirinha de minha filha.
Os parafusos de roda também foram trocados por estarem enferrujados… Ufa! Deu e está dando muito trabalho deixá-lo em ordem novamente. Fiz duas viagens ao litoral norte como teste e ele foi muito bem.
Chegamos em 2017. Agora tenho outro carro, maior, para viajar e levar a bagagem, carrinho de bebê e demais acessórios… No Uno cabe pouca coisa, então ele se tornou o carro do dia a dia na cidade.
Já tive vontade de vendê-lo pelo tanto de coisas que arrumei (o trabalho que deu!) e pelo tanto de coisas que ainda preciso consertar.
Bem, adoraria ver minha filha, um dia, dirigindo o carro que foi de seu avô… Com o tempo, talvez o Uno se transforme em um clássico! Mas se tudo falhar, eu faço uma preparação para competição com rack no teto, uma escada e um adesivo de firma…
Alexandro Antônio Palma
São Paulo – SP