Sei que é chavão dizer que não se pode generalizar, mas como pessoa lógica que sou também sei que podemos acreditar nas estatísticas e nas Ciências Exatas — desde que corretamente utilizadas e, no caso das primeiras, corretamente apuradas. Dito isto, vou, sim, fazer algumas generalizações já que há generalizações e generalizações.
Descarto sempre aquelas que são fruto de palpites e impressões. Dizer coisas excessivamente genéricas a partir de observações rasas leva a erros. Mais ou menos como você viajar do Brasil para a Rússia e, numa escala em Paris, tomar um café e o garçon dar o troco errado. Tem gente que diria que todo francês é ladrão. Outros que todo garçon rouba no troco. Outros que no aeroporto só tem safado, e por aí vai. Faz sentido? Claro que não. Mesmo as conclusões fruto de observação têm de ter um mínimo de repetição que é, alias, a base da ciência — fazer algo igual várias vezes e chegar ao mesmo resultado.
Geralmente, a memória nos trai. Numa investigação policial, testemunhas têm valor relativo pois suas lembranças são influenciadas por fatores culturais e até mesmo pela memória. Para quem acompanhou o acidente nas obras do metrô da Linha Amarela de São Paulo, nos idos de 2007 quando se abriu um gigantesco buraco que engoliu uma van de transporte de passageiros, vai aí um exemplo. Quando se completou um ano do acidente, um jornal fez uma reportagem sobre o assunto e entre os entrevistados ouviu os moradores do lugar. Uma senhora disse que se lembrava “como se fosse hoje” de um guindaste balançando, à beira da cratera até cair nela. Pois é. Só que nenhum guindaste caiu no buraco. O repórter provavelmente não lembrava disso e nem checou na hora de escrever.
Pessoalmente, teria feito pelo menos isso e teria telefonado para a tal senhora perguntando se ela realmente lembrava disso. Se insistisse que sim, faria a ressalva no texto. Ela pode ter confundido a imagem com a de um filme ou de outro acidente. Mas o fato é que a memória nos prega peças o tempo todo — daí a eu não dar tanta importância a observações baseadas apenas nesse instrumento de tanta precisão chamado “achômetro”.
A inteligência utilizada em investigações usa estatísticas que, por óbvio, acabam gerando algo ligeiramente parecido com uma generalização. Por exemplo, intensifica-se o policiamento nas ruas no bairro A, pois foi lá que houve mais registros de roubo de veículos. Se há mais ocorrências de enchentes num determinado ponto da cidade é lá que devem ser concentradas as ações preventivas. Se há um caso de “serial killer” a polícia traça o perfil dele em função do comportamento e do tipo de crime. Daí ela conclui que pode ser, sei lá, homem de 30 a 40 anos, provavelmente alguma profissão autônoma, com família já formada (casado ou união estável, chamem como preferirem) e por aí vai.
Tudo isso devido a fatores específicos: autônomo consegue ter horários mais flexíveis, por exemplo. E, claro, tem a questão da classe social, raça, etc. É preconceito? Não, trata-se de estatística. É generalização? Novamente não, estatística. É 100% seguro? Não, por isso não se descartam totalmente outros perfis, mas estreita-se o foco das investigações em função das informações colhidas ao longo de anos e anos e de estudos realizados. O mesmo acontece no trânsito.
Semana passada fui fazer compras numa loja de material de construção. Tinha diversas vagas para parar o carro. Escolhi uma na sombra, mas quando vi um dos carros que ficaria ao lado do meu percebi que ele estava cheio de ralados e desisti de parar ali. Fui buscar outro lugar. Preconceito? Não, lógica. Se uma pessoa anda com o carro todo ralado é lícito supor que não vai tomar muito cuidado ao manobrar e poderá amassar o meu. É claro que pode se tratar de um excelente motorista que naquele momento estava dirigindo o carro de um conhecido extremamente desleixado, mas isso seria a exceção e não o que é o esperado.
O mesmo se aplica quando estou transitando. Tenho o hábito de olhar à minha volta. Se tem motorista olhando ou digitando no celular (foto de abertura) faço questão de ficar atrás dele, mas não na mesma faixa pois parto do princípio que poderá frear na última hora por não estar prestando atenção. E não quero estar adiante pelo mesmo motivo, a não ser que seja na estrada e tenha certeza de que conseguirei abrir uma enorme distância do infeliz.
Motorista com braço totalmente pendurado para fora do carro, música alta, veículo rebaixado e faróis azul vela de macumba fico bem, bem longe. Novamente, preconceito? Não, pois parto do princípio que braço para fora vai atrapalhar numa manobra rápida e provavelmente o motorista vai esticar marchas ou, ao trocá-las, vai deixar o volante totalmente sem controle. Música alta além de atrapalhar a concentração impede que se escutem sons como buzinas (você quase fechou alguém por estar no ponto cego do seu carro, por exemplo). Luz azul, além de irregular, faz com que o carro não seja visto adequadamente por outros carros e, dependendo da via, sequer o próprio motorista enxerga o caminho.
E carro rebaixado significa duas coisas: ou o sujeito vai frear ao menor obstáculo e ser extremamente cuidadoso com buracos e lombadas para não prejudicar o possante ou já estará acostumado a bater o assoalho e isso para mim demonstra falta de amor pelo carro — algo imperdoável para uma autoentusiasta como eu, hehehehe.
Da mesma forma, carro antigo ou de modelo simples por si só não me assusta. Se for uma Belina bem conservada, estaciono ao lado tranquilamente. Assim como não é o valor do carro que significa algo. Carro último modelo pode significar que o dono acabou de dar perda total em outro de tão mal que dirige. Por isso presto mais atenção na forma como ele está estacionado. Se bem parado demonstra cuidado com o veículo e com o próximo. Novamente, entre uma velha Belina sem riscos e bem paradinha entre as marcas e um suve 2017 enviesado na diagonal, a Belina será minha vizinha de vaga.
Mas não pensem, caros leitores, que tenho TOC (Transtorno Obsessivo Compulsivo. Tratar-se-á (fazia tempo que não usava ênclises ou mesóclises, então, lá vai uma) muito mais de um caso de prática de direção defensiva. Ou seja, antecipar manobras que outros podem fazer e colocar em risco a si mesmo ou outrem.
É claro que tem generalizações que não tem nenhuma base científica e são, sim, apenas preconceito. Tem muita mulher que dirige bem, sim. Eu sou uma delas. Mas é fato que na maioria dos casos dirigimos menos do que os homens. Mesmo na minha casa, é comum quando saio com meu marido que seja ele quem assume o volante – exceto quando saímos para jantar e combinamos quem vai beber e quem vai dirigir. Geralmente, eu não bebo e dirijo, embora nem sempre. Logo, é lícito supor que homens têm mais traquejo atrás do volante do que mulheres. Mas acho que só isso.
Não acredito que dê para concluir nada além disso e as pesquisas que alegam que mulher dirige melhor do que homem não me convencem. Elas são feitas por seguradoras e levam em consideração apenas prêmios pagos — portanto, não ocorrências abaixo do valor da franquia. Para mim, se alguém não vê uma coluna e rala o carro ou bate num poste porque ao dar ré não olhou não se pode concluir que dirige bem. Apenas que o conserto do carro foi mais barato do que acionar o seguro.
Mudando de assunto: Recentemente levei um dos carros de casa para a revisão. Fiz a básica, pois não havia problemas. Ela inclui checagem de alinhamento e balanceamento. Na hora de retirar o veículo estava tudo certo, disseram. Ótimo. Alguns dias depois achei o carro pesado e fui calibrar os pneus. Baixos os quatro – e bastante. E o estepe? (sim, eu calibro o estepe!) 19 libras!!! Pode isso? Entendo que os pneus podem ter baixado na rodagem, pois se passaram vários dias, mas o estepe? Eles nem olharam… Sei não, entendo que não seja obrigatório, mas se eu tivesse uma concessionária devolveria o veículo com esses detalhes em ordem, até porque não há custo e consomem um tempo irrisório. Questão de imagem.
NG