Aqui na minha coluna eu já tratei de várias cópias como a cópia do Kombi feita pela empresa austríaca Palten¹ e a cópia do VW Fusca feita pela empresa chinesa Ora², mas um caso como o que vou relatar agora é sui generis mesmo. Pois se trata de uma cópia mesmo de VW Fusca feita na Espanha, mais especificamente em Barcelona na década de ’50 do século passado.
Pouco se tem em imagens desta história e a foto de abertura é a única remanescente que mostra um exemplar do Orix 610 visto de três quartos de frente.
Surgimento dos carros Orix
Juan Ramirez Montpeó (mais conhecido como Juan Ramirez) foi um grande mecânico e praticante do esporte motorizado que tinha uma oficina mecânica em Barcelona, onde, além de atender seus clientes, preparava as motocicletas e os carros que dirigia em competições. Entre suas montarias de pedigree estavam um Nacional Pescara de 8 cilindros e um Ricart de 6 cilindros.
Os dois carros de corrida citados eram de fabricação espanhola e os seus registros fotográficos seguem abaixo:
Em 1950, o Juan Ramirez, depois de várias tentativas malsucedidas de instalar um turbocompressor em uma motocicleta Harley Davidson, na tentativa de superar a BMW de um de seus rivais, teve a ideia de construir um motor do tipo BMW, também com dois cilindros opostos, quatro tempos e arrefecido a ar, mas com maior deslocamento e maior potência. Ele começou a trabalhar e, quando o novo motor ficou pronto, ele o testou em bancada e, apesar das falhas que surgiram na instalação de teste, calculou-se que o motor tinha cerca de 20 cv a 6.000 rpm. Este motor tinha um deslocamento de 610 cm³ com dimensões de 72×75 mm.
Com o motor de volta à oficina, surgiu a ideia de acoplá-lo não a uma motocicleta, mas a um carro, uma ideia que amadureceu muito rapidamente e, em poucos meses, o primeiro carro de Juan Ramirez estava pronto. O novo carro foi batizado de Orix.
Não se sabe a razão da escolha deste nome. De um lado havia uma marca de veículos alemã a Oryx Motoren Werke de Reinickendorf, Berlim, e em Barcelona havia dois caminhões desta marca. Disto há uma vertente que acha que Juan Ramirez adotou o nome Orix trocando o y pelo i. Mas de outro lado Orix é o nome de um antílope africano.
O primeiro protótipo era um pequeno conversível de dois lugares com o motor localizado na traseira e com uma linha agradável e bem proporcionada. Em sua primeira participação em um evento esportivo, a subida da colina de Rabassada, realizada em dezembro de 1950, ele alcançou o 6º lugar na classificação geral, além de vencer sua categoria por uma ampla margem, de modo que o Orix obteve grande repercussão na imprensa que o tornou conhecido do público aficionado.
Esse primeiro protótipo (licença número B-81544), que continuou a participar de várias competições durante 1951 e 1952, mais tarde teve sua carroceria substituída por uma com linhas mais retas, de acordo com a moda da época. Tendo em vista o sucesso alcançado e os muitos pedidos que chegaram ao seu construtor, ele considerou seriamente a possibilidade de realizar a fabricação de uma pequena série, para o que, de forma muito pragmática, acordou com seus futuros clientes o financiamento da produção a ser realizada.
A carroceria escolhida para as unidades da primeira série já era fechada, com uma pequena capacidade de assentos 2+2, duas portas e uma linha agradavelmente arredondada, e, é claro, construída inteiramente à mão. Ao longo de 1953, Juan Ramirez construiu e entregou 12 unidades de seu Orix, das quais editou um catálogo descritivo. Em alguns desses carros foram feitas carrocerias especiais, com quatro lugares e, também, coupés com dois lugares.
Em 1953 ocorreu um “Encontro Orix” na Avenida Diagonal de Barcelona:
O “Volkswagen” espanhol
Após o sucesso comercial de seu primeiro modelo e primeira série de fabricação, Juan Ramírez considerou a possibilidade de construir um modelo maior, com quatro lugares, aproveitando as boas características e desempenho de seu motor, que agora fornecia 27 cv a 5500 rpm.
O novo Orix, com linhas muito semelhantes às do primeiro Volkswagen (era uma cópia descarada), foi construído no início de 1954 e apresentado na Feira Comercial de Barcelona em maio de 1954, onde causou grande surpresa.
Não está claro o motivo pelo qual seu construtor o tornou tão semelhante ao modelo alemão. Essa decisão foi a causa de uma série de protestos do construtor alemão, que, no entanto, não foram adiante, pois parece que o Ramirez explicou as importantes diferenças e vantagens de seu projeto (?).
É muito provável que ele pretendesse garantir o sucesso usando uma linha já consolidada, sobre a qual ele considerava ter melhorado desempenho e acabamento. Este era, para todos os efeitos, um Fusca de dois cilindros e um pouco menor.
Se você olhar as fotos, pode até adivinhar o ano do Fusca que Ramirez provavelmente tinha em mãos para copiar: era um 1952. Digo isso porque o Orix “Volkswagen” tinha pequenas aberturas rebatíveis nos painéis laterais dianteiros que estão exatamente na mesma posição e têm exatamente o mesmo formato das aberturas de ventilação do “esfriador de virilha” que a Volkswagen colocou somente nos Fuscas 1952. Este detalhe é mais visível na foto de abertura.
Se olharmos atentamente para o Orix, podemos ver algumas diferenças em relação a um Volkswagen: o para-brisa tem uma inclinação maior para trás, o para-lama traseiro parece ter uma inclinação mais longa, parece haver uma entrada de ar do motor atrás das janelas traseiras, e algumas outras pequenas variações de proporções e detalhes.
Mas nenhuma dessas diferenças muito pequenas parecem ser verdadeiras mudanças deliberadas no design, mas apenas pequenas variações que vêm com a cópia do design de um carro e o ajuste em um chassi de medidas ligeiramente diferentes.
Características técnicas do Orix 610:
Ano | 1952 |
Motor | Orix de 2 cilindros opostos |
Diâmetro / Curso | 72,0 x 75,0 |
Deslocamento | 611 cm³ |
Potência | 27 cv |
Rotações | 5.500 rpm |
Válvulas | suspensas |
Transmissão | Quatro marchas à frente e uma à ré |
Suspensão | Independente |
Rodas | 4,25 (ou 5 em alguns modelos) x 15 |
Velocidade máxima | 115 km/h |
Consumo | 6 litros/100 km |
Ramirez construiu dois protótipos de seu Orix Volkswagen e, em seguida, 14 cópias de produção ao longo de 1954, finalmente parando porque o empreendimento não estava se mostrando lucrativo.
Isso pode não ter sido o que realmente causou o fim do Orix Volkswagen, no entanto. Enquanto ainda construía os Orix Volkswagens, Ramirez foi contactado pelo Ministério da Indústria espanhol sobre a possibilidade de construir uma fábrica no País Basco, mas ele estava empenhado em permanecer em Barcelona, na Catalunha, pelo que rejeitou a oferta.
Logo depois, um grupo de banqueiros da região de Barcelona se interessou em investir no negócio automotivo do Ramirez, então marcaram uma reunião.
Ramirez então conseguiu fazer algo que nunca havia acontecido antes ou desde então na história do automobilismo: Ramirez condenou sua empresa por causa de seu compromisso com o melhor atendimento possível ao cliente.
Quando ele estava saindo da fábrica para se reunir com os banqueiros, um proprietário de um Orix foi até a loja da fábrica, reclamando de um problema com seu carro. Por incrível que pareça, Ramirez ficou para consertar o carro, o que, como em todos os consertos, acabou demorando mais do que ele imaginava, e durante esse tempo os banqueiros se cansaram de esperar e foram embora, sem qualquer possibilidade de acordo!
Portanto, se o diretor da empresa não achasse que consertar o carro de um cliente era mais importante do que ir a uma reunião para garantir o futuro financeiro da empresa, é possível que houvesse todo um universo paralelo de imitações de Fuscas espanhóis zumbindo por aí, de maneira desafiadora e amplamente improvável.
As referências indicadas no início da matéria são:
(¹) – Matéria: “ESTE É O “SÓSIA” DIESEL DA VW KOMBI T1”
(²) – Matéria: “PARECE UM VW FUSCA, MAS NÃO É”
Aqui eu poderia também falar da matéria “A OFICINA DOS SONHOS” onde são fabricados Kombis Corujinha e réplicas de Porsches antigos.
AG
Para esta matéria foram feitas pesquisas nos sites: autopasion18.com, que traz o material original de Manuel Lage Marco, jalopnik.com com o material do Jason Torchinsky, imcdb.org, Wikipedia, e dados do Autor. Informações sobre esta fontes podem ser dadas sob consulta.
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A coluna “Falando de Fusca & Afins” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.