Bem, caros leitores, cá estou eu de volta. Estive um mês viajando pelo Reino Unido inteiro, só meu marido e eu. Foi uma jornada principalmente de carro, mas como fomos às duas ilhas houve ferryboat e, claro, muita, muita caminhada. Alugamos um carro, um suve MG HS que se mostrou muito adequado às nossas necessidades (Foto MG). O devolvemos com 3.619 quilômetros a mais no hodômetro, nada mau, não?. Digo que o modelo foi adequado pois geralmente gosto de alugar camionetas já que prefiro que as malas fiquem totalmente ocultas no porta-malas, mas não tivemos essa opção na locadora. É que costumamos parar muito no caminho e, como boa paulistana paranoica, não gosto de que seja óbvio que somos turistas. Claro que meu carro é sempre o único que não tem nenhum traço disso enquanto nos outros se veem malas, pacotes de comida, garrafas de bebida, mas…
No porta-malas do MG apenas cabiam nossas duas malas médias e alguma coisinha avulsa como uma sacola com frutas e duas garrafinhas de água e mais nada. Ou seja, bem, bem justo, mas apesar da longa viagem e do tempo frio (enfrentamos de 2 a 19 graus e da clássica chuva britânica a um inesperado sol durante quase a viagem toda) saímos e voltamos com pouquíssima bagagem. Estamos nos aperfeiçoando cada vez mais na arte de viajar de maneira leve…
O roteiro, mais uma vez, foi feito por esta escriba com a ajuda de um amigo escocês muito querido, o maravilhoso John Maguire, que havíamos conhecido há alguns anos em outra viagem e com quem, felizmente, mantive contato desde então. Pedir a ajuda dele se comprovou uma excelente ideia em vários aspectos e abordarei alguns nas próximas colunas.
Chegamos a Londres, ficamos uns dias a pé e de transporte público para passear (e muito) por esta incrível e maravilhosa cidade e, no último dia, pegamos o carro. De lá, fomos para o castelo de Windsor para mais um na enorme série de castelos que veríamos nesta viagem e então para uma das visitas mais aguardadas por nós dois, autoentusiastas que somos: o templo da velocidade. Sim, o autódromo de Silverstone. Mas falarei sobre essa visita numa coluna à parte. Convenhamos que merece, não?
Então, de Silverstone pulo diretamente para Nottingham, nossa seguinte parada. De lá, a lindíssima York. Depois a superdoida Liverpool, Stonehenge, Bournemouth, a linda costa de Dorset (foto de abertura) e a charmosíssima Bath. De lá seguimos para o País de Gales, atravessamos para a Irlanda, Irlanda do Norte, novo ferryboat para a Escócia e de volta para o Brasil. Hoje focarei na Inglaterra e deixarei para outras colunas os demais lugares e até mesmo algumas informações mais genéricas para que estas escrevinhações não fiquem mais longas do que já ficaram.
Em Liverpool encontramos personagens bem exóticos (Foto: comic.com)Infelizmente, na correria, não separei exatamente quantos quilômetros dirigimos na Inglaterra. A primeira e óbvia dificuldade é dirigir do lado direito da pista, mas já havíamos feito isso na Nova Zelândia e na África do Sul então não era exatamente novidade. Em um par de horas, ou menos, você se acostuma. Engraçado foi ao voltar a São Paulo ir para o lado errado do carro um par de vezes — felizmente, não para a pista errada.
Ah, e um parêntese: pense numa cidade bastante maluca como Liverpool, num sábado de muitos pubs, happy hours e final de semana e acrescente uma Comic Com. Sim, um daqueles encontros de fãs de filmes e séries baseados em quadrinhos (inicialmente, hoje tem de tudo). Encontramos na rua gente fantasiada (ops, “cosplay”) de elfos, Mulher Maravilha, Homem-Aranha, Arlequina, cavaleiro Jedi… Uma infinidade de personagens. Confesso que quando vimos os primeiros dois personagens de super-heróis na rua achamos meio estranhos, mas com tanta gente diferente naquela cidade, eram só mais duas pessoas ainda um pouco mais diferentes.
Até que começaram a aparecer mais e mais, e todos indo na mesma direção, a do ACC Convention Centre, por coincidência, quase ao lado do nosso destino, que era o The Beatles Story Museum. Foi então que começamos a desconfiar de que havia algo mais estranho e, bazinga! o Google decifrou o enigma. Tenho algumas fotos bem divertidas de personagens que, por sinal, paravam de muito boa vontade para tirar foto com quem pedisse pelas ruas. (foto Comic Com) E, por falar em Beatles, terminamos aquele dia no Cavern Club, dançando e cantando ao som de algumas bandas muito boas de rock inglês e, claro, de uma banda ótima cover dos Beatles, a Beatles Complete. Saí rouca e com pernas e braços doloridos de tanto pular espremida exatamente na frente do palco, bem aos pés do cover do John Lennon. Muito, muito legal.
O trânsito lá
Mas deixemos o iê-iê-iê de lado e voltemos ao trânsito. Os problemas no Reino Unido são mais no dia a dia, e no varejo, especialmente nas medidas, já que o Sistema Imperial não segue nossa lógica. Então, além das jardas, pés e milhas, temos a moeda que não é dividida em centavos, mas em unidades bem estranhas para nós. Por isso viva o cartão de crédito e de débito que eliminaram essa preocupação e, de resto, como o Reino Unido está estupidamente caro para nossa moeda recomendo que não se faça conversão de nenhum tipo para não estragar as férias.
Apenas como parâmetro, deixo aqui duas referências: uma xicara de cafezinho custa, pelo menos, 4 libras esterlinas, o que corresponde a R$ 26. Uma meia “pint” de cerveja, que são uns 350 ml e que é geralmente o mesmo preço de um refrigerante, também custa 4 libras. A “pint” inteira é R$ 45. Está bom para você? Um prato de comida num restaurante médio em torno de 25 libras, ou R$ 160. Um sanduíche na rua, 7 a 11 libras e por aí vai. Ou seja, aquele chavão de “quem converte não se diverte” é mais verdadeiro do que nunca por essas paragens.
Com as milhas nos acostumamos rapidamente, pois nos Estados Unidos é a mesma coisa. Eu sempre multiplico por 1,5 e pronto. Não corro o risco de tomar multa e tenho uma boa noção de a qual distância está meu destino e pelo menos eles usam graus Celsius em vez de Fahrenheit. Aleluia.
As estradas que pegamos na Inglaterra eram quase todas muito boas. Exceto algumas do tipo vicinal, mais no Sul do país, o asfalto era impecável. Nas que não era tão bom, estavam sempre muito acima do que são as nossas e não havia buracos, apenas algum desnível. O mais irritante eram os baixíssimos limites de velocidade e, pior, as constantes mudanças neles. Mesmo assim, nada que se compare com os limites na cidade de São Paulo. Para aqueles que aplaudiram quando no centro velho se reduziu para 30 km por hora e disseram que em Londres também era assim um aviso: sim, é assim, mas lá são 30 milhas por hora (mph), o que dá 48 km/h, OK? Em alguns cruzamentos de estrada na frente de escolas o máximo cai para 20 mph, o que dá 32 km/h, mas apenas na frente das escolas e por alguns metros.
O mais complicado são, como disse, as constantes reduções. Você roda, sei lá, 5 quilômetros numa determinada velocidade e logo baixa para outra. Roda 10 quilômetros assim, sobe para 70 mph (112 km/h) por 3 quilômetros e cai novamente. E ainda tem o raio do radar de “velocidade média” o tempo todo.
O sistema de rodovias inglês é bem lógico e gosto muito das letras e números que eles usam, assim como em outros países. Ele tem uma lógica clara, mas extremamente detalhada e, por isso, complicada de explicar. Ele compreende letras e números. A letra depende do tipo da categoria de estrada e os números vão de um a quatro dígitos. A Inglaterra, Gales e Escócia estão divididas em regiões com números de 1 a 9 e as estradas que os cortam contém esses números. Mas há interposições, então em alguns trechos uma estrada, por exemplo (mas não é verdadeiro, apenas inventado como exemplo aqui) a M1 se soma à A110 e a numeração de ambas de certa forma convive por algum tempo e vira M1/A110. Eu usei sempre o Waze que nos pregou algumas peças, como sempre, mas nada muito terrível. E como estou cada vez mais escolada, já não caio nas pegadinhas dele.
Mas, resumindo, há algumas estradas de três ou quatro faixas em cada sentido com bons trechos de acostamento (que não é algo assim tão comum), mas há muitíssimas estradas de pista simples sem nenhum acostamento, ainda que com trânsito considerável. Vimos de tudo. E, sinceramente, não achei muita lógica nas velocidades máximas. Por exemplo, na estrada que une Londres a Silverstone, a M1, ampla, com quatro faixas em cada sentido, a velocidade máxima era de somente 50 mph (ou 80 km/h) em vários e longos trechos. Ou na estrada entre York e Liverpool, com três ou quatro faixas em cada sentido na maior parte, com canteiro central, extremamente confortável, trafegávamos a intermináveis 50 mph e em algumas partes a meras 40 mph (64 km/h). (foto York a Liverpool) Uma tortura. Em compensação, nas estreitas rodovias do Sul, na região de Dorset, de pista simples, sem acostamento, a máxima permitida era de 50 ou 60 mph (96 km/h) algo que, sinceramente, nem conseguíamos alcançar na maior parte do tempo. (foto estrada precária no Sul da Inglaterra e velocidade máxima de 50 mph.
Aliás, dica de Noratur: numa viagem de carro pelo Reino Unido calcule um tempo muito maior de deslocamento entre as cidades do que você imaginaria apenas em função da distância em quilômetros. As baixas velocidades podem atrapalhar qualquer planejamento, fazer você perder horários, chegar atrasado a lugares e mesmo perder reservar em restaurantes ou outros lugares. Sério. Não imagine que fará 100 quilômetros em uma hora, ou mesmo em 1 hora e 15 minutos.
As estradas têm às vezes um nome adicional, mas sempre junto do número, como a A1 ou Great North Road, que liga Londres a Edimburgo, e os dois constam das placas na estrada. Já as placas com a velocidade máxima são uma raridade. Você depende do Waze, do computador de bordo ou de saber qual é, mesmo. Uma opção é acompanhar o fluxo do trânsito. É incrível como ele é constante. O mesmo acontece quando começa a tal velocidade média e, principalmente, quando ela termina. Automaticamente, todo o grupo de carros começa a acelerar até atingir a mesma velocidade. Aí é só acompanhar os outros. Nós, pelo menos, não tomamos nenhuma multa em toda nossa jornada.
Sempre digo que o problema de dirigir na mão inglesa é quando você não tem uma referência, como um carro à sua frente. Se você segue o fluxo de carros, é fácil. O difícil é quando você para num recuo da estrada para tirar fotos, algo que fizemos muito, pois as paisagens eram lindíssimas, tem de voltar e não há carros na estrada. É quase certo que por alguns segundos você entrará na pista da esquerda. Nós fizemos isso por uma vez, por uns metros. O mesmo para entrar numa rotatória se não houver carros — essa, felizmente, não nos aconteceu. Mas, novamente, o cérebro aceita com facilidade novas programações e não é difícil.
Mais complicado é fazer baliza e, por vezes, manter o alinhamento nas estreitíssimas pistas das estradas secundárias, sem acostamento onde você anda permanentemente quase encostando a lateral do carro na vegetação por falta de referência de onde termina seu carro do lado esquerdo. A tendência é você jogar excessivamente o carro para a direita, e até mesmo encostar no meio fio ou no acostamento. Novamente, baliza é apenas algo que demora um pouco mais, só isso.
(Parte 2 e final na 4ª feira que vem)
NG
A coluna “Visão feminina” é de exclusiva responsabilidade de sua autora.