Durante a viagem com o Mégane R.S. contei para o MAO algumas histórias de aventuras que vivi. Duas delas estão no site, Jabel Haffet e Atolei em Dubai, mas tem uma que ainda não havia virado matéria. É uma historinha tranqüila, mais um causo do PK. Talvez até fora de tópico, mas resolvi contá-la.
Tem uma coisa que aprendi com um grande amigo, o Beto. Uma vez saímos de jipe da sua casa em Alphaville, em São Paulo, meio que sem destino, apenas para darmos uma volta. Como não sabíamos onde ir, assim que avistamos uma montanha ao longe ele a apontou e disse: vamos lá, no topo daquela montanha! Com isso definimos um objetivo para o nosso passeio. Desde então, toda vez que vejo uma montanha ou algo que se destaque na paisagem ao longe, eu lembro do Beto e fico com vontade de ir até lá. Sempre fui assim, insatisfeito com o lugar onde estou e buscando novos objetivos. “Lá” é onde quero estar! É verdade que reclamo disso a mim mesmo, pois não é fácil ser assim. No entanto, ultimamente tenho aprendido que isso é uma das forças que me move.
Pois é! Durante uma viagem à Argentina, no caminho entre Mendoza e a Cordilheira dos Andes, estávamos numa excelente e vazia estrada pavimentada. À nossa direita estava uma paisagem lindíssima com um lago azul turquesa formado por uma represa e umas montanhas ao fundo. Coisa de uns 500 metros de distância da estrada, num nível bem mais baixo. Olhei o lago e decidi que “lá”, na sua margem, é onde eu gostaria de estar.
Então, ao ralar no freio, descobri que o solo era um lodo só. O nível da água havia baixado recentemente e eu estava tentando parar o carro onde antes era… o fundo do lago! A superfície era tão lisa que o carro deslizou como se eu não estivesse aplicando o freio. Fiquei completamente sem ação e torcendo para que parássemos antes de entrar no lago. Não deu! Entramos com carro e tudo na água.
As duas não entenderam absolutamente nada. Por sorte o lago era raso, com o fundo quase plano. A água ficou pouco acima metade da altura das rodas. Elas ficaram assustadas, aliás, assustadíssimas. Mas o papaizão disse: “Estamos numa Hilux 4×4, é só engatar a tração e sair de ré”. Que nada! As quatro rodas patinaram e a picape afundou mais um pouco. Mais uma tentativas e a conclusão foi que era impossível de sair dali sem ajuda
Nessas horas eu acabo me odiando. Que idéia idiota, essa de ir até à margem do lago! A estrada lá em cima estava tão boa, era só continuarmos nela que chegaríamos à Cordilheira ainda de dia e tranqüilos. Atolados no lago! Sem nenhuma alma viva por perto. Sem telefone e sem a menor condição de sair dali sozinhos. Mulher com medo, que conseqüentemente o passou à filha, que chorava. Totalmente sem motivo, é óbvio!
Saí da picape pela caçamba e após consenso decidimos que eu andaria até a estrada para pedir ajuda e elas ficariam no carro. Durante todo esse trajeto eu teria visão total da picape com as duas lá dentro. Tranqüilo!
Mas quando cheguei à estrada não achei uma alma viva e não passou nenhum carro por muitos minutos. Além de tirá-las de lá, eu não queria perder muito tempo para chegar até a Cordilheira. Isso mesmo, o “lá” já tinha mudado…
Não dava para falar com elas. Considerei que, como não havia nenhum ser vivo por perto, elas não estavam em perigo. Eu também tinha certeza que a picape não afundaria mais e que também não seria inundada. Fiz algum gesto para elas, pedi proteção a Deus e segui correndo pela estrada. Naquela época eu tinha boa forma. Coisa de um quilômetro pela frente encontrei umas casas. Bati palmas e nada. Ninguém por perto. Continuei na estrada por mais um quilômetro e após uma curva dei de cara com um vilarejo. E melhor ainda, com um posto policial logo na entrada.
Nesse ponto, antes de entrar no posto policial, pensei em como eu explicaria para os guardas que eu saí da estrada e fui parar dentro do lago. O que será que eles pensariam de mim? Engoli seco, entrei no posto e pedi ajuda. Contei tudo num portunhol lascado e ainda pedi que se apressassem, pois as duas estavam lá, apavoradas. Chegamos no ponto de onde podíamos avistar o carro, mas não tinha estrada para chegar lá. Eles me olharam e eu disse para seguirem no meio do terreno todo acidentado. Também os alertei para não fazerem a mesma besteira que eu e para pararem a picape deles bem antes da margem.
Nessa altura as duas já estavam na caçamba e achando que a picape estava afundando. Quando eu lembro disso, tenho que admitir que não deve ser muito fácil ser minha esposa. Ela é uma pessoa comportada e caseira e ter que me acompanhar nem sempre é uma boa idéia.
Com um cabo de aço amarrado no pára-choque traseiro da minha picape, a outra Hilux a tirou do lago com facilidade. Só que os guardas deram uma errada e laçaram o cabo de aço pelo pára-choque traseiro da minha Hilux, que acabou sendo estragado. Mas na hora eu nem percebi, pois só queria tirá-las do lago em segurança. Depois fomos todos juntos até o posto policial para uma pausa. Os guardas eram gente fina e não disseram uma palavra sobre o acontecimento. Tivemos muita sorte de nada de ruim ter acontecido. E apesar do sufoco todo, esse tipo de aventura marca nossas vidas. São histórias que não poderiam ser vividas se não estivermos dispostos a nos aventurar e sair da mesmice.
Depois de tudo isso seguimos caminho para o terminar o passeio e daí para frente tive que me comportar muito. Já na Cordilheira do Andes, chegamos a uma estradinha que nos levaria até o o Monte Aconcágua. O “lá” estava tão perto! Mas essa estradinha estava cheia de neve e as duas não pestanejaram em negar completamente minha idéia de seguir por ela até o pé da montanha. Tive que enfiar o rabo entre as pernas e me contentar em ver o Aconcágua bem ao longe.
Bem, essa foi a minha versão da história. Qualquer dia a minha esposa conta o lado dela. E quem sabe a filhota também conte como ela encarou a aventura.
PK