A movimentação no automobilismo europeu reflete o gigantismo da F-1 e a agilidade de categorias menores: enquanto a primeira ainda estuda o que poderá acontecer com a temporada 2020, equipes reduzem salários de pilotos e diretores, dispensam alguns e dão férias a muitos, categorias como a F-Renault e a DTM anunciam calendários revistos com início programado para o final de junho e início de julho, respectivamente na Holanda e na Alemanha. Como que a dar sua contribuição aos seus filiados, a Federação Internacional do Automóvel (FIA) postergou o pagamento de taxas de seus filiados e criou uma plataforma de ensino a distância em colaboração com a escola ESADE, de Barcelona, cujo currículo envolve técnicas de comunicação, negócios e planejamento estratégico focados em épocas de crise (foto de abertura)
Ontem dirigentes da FIA e da Liberty Media coordenaram uma teleconferência com os representantes dos 10 times que disputam a F-1 para discutir os rumos da categoria no cenário atual. O panorama é complexo, beira a tristeza: aquelas duas instituições negociam com promotores de corridas possíveis formas de cancelar parte ou toda a temporada e encontrar um meio de garantir algum ingresso financeiro a ambas e, principalmente, às equipes. Um calendário reduzido em número de etapas e na duração dos eventos de três para dois dias é uma das opções em aberto. É bem provável que hoje seja anunciada a extensão do período de férias coletivas, atitude das mais bem-vindas: ainda há vários países europeus sustentando o período de isolamento social e parar suas fábricas significa, além de proteção sanitária, reduzir custos, medicação altamente recomendada no atual clima de incertezas.
Por parte das equipes o troféu da semana, pelo menos por enquanto, vai para Zak Brown, o americano que comanda o renascimento da McLaren. Ontem ele lançou um balão de ensaio para dar força à sua cruzada visando reduzir o teto de gastos das equipes. Dos US$ 150 milhões anuais já parcialmente aceito pelos seus pares e que não inclui os salários com pilotos ou gastos com motores, agora Brown advoga que a quantia-limite de US$ 100 milhões, em iguais condições, é necessária para impedir o desaparecimento de quatro equipes. O valor final deverá ficar no meio termo, confirmando que a atitude de Brown é apenas uma arma de negociação para obter outras vantagens e ganhar peso político junto aos construtores, à FIA e à Liberty Media. Seu histórico profissional revela um executivo extremamente agressivo e sagaz.
Brown não declarou quais seriam os quatro times passíveis de encerrar atividades, mas as apostas são de que Williams, Haas, AlphaTauri (que já se foi alvo de comentários similares nos tempos em que se chamava Toro Rosso) e Alfa Romeo são as mais vulneráveis. O nome desta última entra nessa lista em função do seu histórico: já foi financiada pela Mercedes, comprada pela BMW e administrada por um banco suíço. Declarações recentes de Fréderic Vasseur, o líder dessa escuderia, ao jornal francês L’Equipe, alimentam essa hipótese ao indicar que à sua organização limites mais baixos são atraentes: “Adotar um teto de gastos na casa de US$ 100 milhões anuais é uma proposta justa. Espero que nesta crise a categoria possa ter consciência e garantir o futuro da F-1”.
Mais do que reavaliar os custos financeiros praticados pelas equipes, a mudança trará duas consequências práticas: aumentará a competitividade das equipes menores — já habituadas a sobreviver com orçamentos mais baixos —, e criará um novo mecanismo de busca por soluções que contornem essa limitação. A disseminação de parcerias tecnológicas será inevitável e a primeira a ser explorada: os gastos dessas parcerias, em princípio, não poderiam ser incluídos como orçamento das equipes… Em épocas de vacas magras, McLaren, Williams e Racing Point, nesta ordem, já reduziram seu número de funcionários e o salário dos seus pilotos e diretores. Os pilotos da Ferrari — Sebastian Vettel e Charles Leclerc — devem ser os próximos a anunciar sua adesão à essa nobre causa.
Uma redução mais drástica, significativa e abrangente pode ser o item que permitirá a realização do campeonato de 2020 com um calendário enxuto e a iniciar com o GP da Grã-Bretanha, possivelmente dia 19 de julho. A data já está prevista no calendário original de 2020 e tem como grande trunfo o de ser reservada à única prova disputada desde 1950, quando o Campeonato Mundial foi criado. A proposta mais consistente da FIA e pela Liberty Media para resolver o impasse inclui a realização de um número reduzido de etapas, todas com portões fechados ao público, forma de evitar aglomeração nas arquibancadas e de convidados com acesso ao paddock. Paralelamente, a medida preservaria o faturamento advindo dos direitos de transmissão de TV, um dos mais importantes no fluxo de caixa da categoria. A semana promete muitas novidades.
WG