As importações foram proibidas no Brasil em meados da década de 70. A partir daquele momento a indústria nacional teria que se fortalecer para buscar opções e evoluir em termos de qualidade e até mesmo quantidade de produção.
Falando dos carros, sem a concorrência dos importados, as quatro grandes marcas que já produziam há pelo menos cinco décadas no país tiveram — até 1990 — um mercado bastante vasto e que exigiu criatividade em alguns momentos, mesmo que a tecnologia fosse ficando obsoleta em relação aos modelos de fora.
E já que falei em criatividade hoje o tema é um dos meus preferidos desde que me conheço por gente, folheando revistas de carros com seis ou sete anos de idade: os foras-de-série. Essa designação se tornou algo bem maior do que simplesmente uma definição ou categoria de automóveis. Era um estilo de vida.
Vale ressaltar que nem todas as empresas começaram pós-1976 com a proibição efetiva dos importados. A Puma, por exemplo, minha marca preferida entre elas, tem uma história extremamente rica que começou no interior de São Paulo na década de 60. Rino Malzoni já fazia as pessoas sonharem na época.
Ainda sobre a Puma, em 1970 o pequeno esportivo passou a utilizar o chassi do Karmann-Ghia e mecânica Volkswagen a ar, algo que se mostrou extremamente bem acertado com a proposta. Além disso a facilidade de manutenção e durabilidade do conjunto mostraram seu valor com o passar dos anos e ótima aceitação do público.
Na esteira de seu sucesso comercial e exportação para Europa e Estados Unidos outras marcas surgiram como opções bem interessantes para o mercado nacional. E justamente um verdadeiro celeiro de clássicos é o que trago para você hoje. Essa é uma primeira matéria de uma série de reportagens individuais contando as histórias desses clássicos de fibra, literalmente falando.
Começamos nosso passeio pelo último fora-de-série nacional. O Lobini foi um dos carros mais interessantes que já guiei. Isso porque ele teve ajustes dinâmicos feitos pela Lotus na Inglaterra e seu desenvolvimento foi bastante criterioso. A mecânica VW/Audi deu o toque de esportividade final.
E seguimos andando pelo galpão extremamente bem organizado, onde os carros estão milimétrica e cronologicamente enfileirados. Minha primeira reação ao abrir a porta foi a de que estava em outro país, trazendo paredes decoradas com acessórios, rodas e chão limpo (apesar dos pingos de óleo dos Volkswagens que a gente gosta).
Logo de cara temos os modelos da Puma. O GTE 1973, com as típicas bolhas de acrílico nos faróis, o 1974, último “tubarão” e, ao seu lado, um exemplar do GTS 1976. Nesse ano ele passou a adotar o chassi do Brasília, com maior espaço interno. E também para manutenção no cofre do motor.
Fotos: Renato Bellote
Seguindo a história da marca temos a fase Araucária Veículos, a rara versão P-018 e o AM4, último suspiro com motor a água. E não menos importante os poderosos GTB, das Séries 1 e 2, tendo ao seu lado uma verdadeira mosca branca: o S3, versão que trazia o motor Chevrolet de quatro cilindros.
E foi aí que vieram mais lembranças de infância vendo os Miura. Sem dúvida nenhuma a marca que trouxe maior sofisticação e tecnologia ao segmento. Desde o início, com o Sport combinando chassi e mecânica VW “a ar”, as inovações e itens que chamavam a atenção foram destaques de seus produtos.
Exemplares das três fases da Miura estão presentes. Novamente notem o detalhe cronológico. O MTS, último da primeira geração, trazia o mesmo estilo, porém com motor do Passat TS, algo que apimentou o desempenho.
A segunda fase é conhecida como Targa. E a marca evoluiu bastante com a adoção de chassi tubular, motor na dianteira e um aspecto extremamente bem acertado com o design da época. Quando olhamos modelos como o Pontiac Fiero e Trans Am a ideia fica bem clara.
Nessa época os Miura extrapolaram o bom gosto, com equipamentos nunca vistos em modelos nacionais. Abertura das portas por controle remoto, frigobar, computador de bordo, TV acoplada e um sintetizador de voz que alertava o motorista para algumas funções. Realmente algo único.
A última fase é marcada pela chegada do X8, com um desenho ainda mais envolvente, personalidade de sobra e versões que cativaram o consumidor. Vale ressaltar que eles custavam uma fortuna, mas também traziam algo bastante exclusivo. X11 e Top Sport são ícones da época.
Andando pela coleção ainda podemos ver muita coisa legal. E quando digo isso é que fiquei boquiaberto de ver pessoalmente um acervo tão rico e tão vasto de opções do período. Alguns deles não imaginava olhar e tocar pessoalmente. E ainda mais dirigir, o que teremos em breve.
As opções do mercado de foras-de-série, como dito, eram amplas. E por ali temos duas marcas que sempre chamaram minha atenção: Adamo e Farus. Os Adamo começaram utilizando o chassi Volkswagen e logo criaram algo próprio e extremamente bem feito. Mecânica, acabamento e design bem pensados.
Os modelos da Farus também merecem destaque. Inicialmente criada por imigrantes italianos a marca utilizou elementos da Fiat para coroar seu modelo inicial, o ML 929, com destaque para o chassi em Y~~ e motor entre eixos, com um bom desempenho para os padrões da época.
Por ali ainda temos Bianco, o raríssimo L`Automobile Ventura, Squalo (esse, sinceramente, nunca esperei ver ao vivo) e outros modelos como Cobra da Glaspac, MP Lafer e os clássicos da Gurgel.
Provavelmente esqueci de algo. Mas essa primeira matéria dá uma ideia do panorama geral da coleção. E da quantidade de trabalho — prazeroso — que terei para fazer desvendando e contando essas histórias através de roteiros e matérias individuais. Em breve volto com novidades fora-de-série, com o perdão do trocadilho. Até lá!
GDB