“Câmara pode criar grupo para estudar proposta que reduz velocidade média das vias urbanas”. Esse é o título do comunicado da Agência Câmara de Notícias desta quinta-feira (14).
A proposta esta no Projeto de Lei 2789/23, cujo autor é ninguém menos que o deputado Jilmar Tatto, (PT-SP), secretário municipal de Transportes na gestão Fernando Haddad (2013-2017), copartidário, um dos artífices da redução de velocidade na capital paulista determinada pelo prefeito, caso da foto de abertura.
No PL, o petista sugere reduzir de 80 para 60 km/h a velocidade nas vias urbanas de trânsito rápido e de 60 para 50 km/h nas vias arteriais. O deputado parece esquecer ou finge que esquece ser desnecessária lei para tratar desse assunto, uma vez que a citada redução em São Paulo foi simplesmente um ato do poder executivo através da Secretaria de Transportes e da entidade responsável pelo trânsito na cidade, a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET).
O deputado esquece ou não sabe que o Código de Trânsito Brasileiro é lei federal (nº 9.503 de 23/09/1977) na qual a questão da velocidade é claramente contemplada no art. 61, cujo § 2º reza “O órgão ou entidade de trânsito ou rodoviário com circunscrição sobre a via poderá regulamentar, por meio de sinalização, velocidades superiores ou inferiores àquelas estabelecidas no parágrafo anterior.” Este parágrafo trata dos limite dos limites de velocidade, segundo o tipo de via, quando NÃO existir sinalização regulamentadora.
Portanto, o Congresso Nacional tratará de um assunto que foge da sua alçada e provavelmente aprovará uma uma lei desnecessária — mais uma, a exemplo da “Lei Seca”, que levou à inominável diferenciação entre dirigir sob influência (de álcool) e dirigir embriagado, como informa o Detran de São Paulo nos seus boletins para a imprensa.
A questão da velocidade
É como se alguns, aliás muitos, tivessem tivessem urticária ao pensar em velocidade. Isso começou lá atras, em 1865 na Inglaterra, com a Lei da Bandeira Vermelha, pela qual todo veículo automotor tinha limite de 3,2 km/h nas cidades e 6,4 km/h fora delas, com um tripulante caminhando à frente agitando uma bandeira vermelha. A lei foi revogada em 14 de novembro de 1896 mas seus efeitos permanecem ativos passados 127 anos.
Na audiência pública com as comissões de Saúde e de Viação e Transportes realizada dois dias antes, a representante do Ministério da Saúde, Letícia Cardoso, defendeu a redução da velocidade dando como exemplo a redução do limite em Fortaleza em maio determinada pela prefeitura. “Existe um mito de que, se a gente reduz a velocidade dentro do perímetro urbano, os engarrafamentos aumentam”, disse. Segundo ela, um estudo recente do trânsito em Fortaleza mostra que a readequação — desde quando redução é “readequação”? Puro eufemismo! — de velocidade não impactou no tempo de viagens.
O técnico em Segurança Viária da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas), Victor Pavarino, citou conclusões de conferências internacionais sobre o assunto. “De todos os fatores de risco que a gente tem, de longe a velocidade continua sendo o principal.” Segundo ele, a velocidade perpassa todos os demais fatores de risco, como não usar capacete ou dirigir depois de beber. “Quanto maior a velocidade, tanto maior são as consequências dos demais fatores”, encerra.
Dá impressão que os dois participantes da audiência acham que as velocidades atuais são excessivas, quando absolutamente não são. O caso das pistas expressas das marginais de São Paulo mostrou, que passados dez anos, não aconteceram acidentes causados por quem trafegava à “estonteante” velocidade de 90 km/h.
Como citei aqui em várias oportunidades, duas vias de características semelhantes nos municípios de São Paulo e São Caetano do Sul, as avenidas Tancredo Neves e Goiás, respectivamente, na primeira o limite é 50 km/h e no município vizinho, 60 km/h. O trânsito da av. Goiás é “perigoso” por isso? Nem em sonho.
Velocidade natural
Toda via tem sua velocidade natural, mas é necessário saber dirigir bem para notá-lo, o que provavelmente não é caso de que opina a respeito ou determine limites de velocidade. Por isso é impraticável estabelecer lei nacional que os determine.
Enquanto imprimir velocidade superior à natural traz algum risco, inferior é enfadonho e irritante, por exigir “um olho na via e outro na sinalização de velocidade máxima permitida”, o que se traduz, em última análise, desrespeito ao cidadão-motorista. Seria como limitar a velocidade do caminhar nas calçadas em 2 km/h. Será que alguém se sujeitaria?
Há outra questão relacionada a velocidades inferiores à natural: ser fácil ultrapassar o limite e cometer infração, que com a proliferação dos detectores de velocidade (radar ou laço) o bolso motorista esvazia e o do governo, seja municipal, estadual ou federal, engorda.
BS
A coluna “O editor-chefe fala” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.