É uma maneira estranha de começar uma matéria de um carro que está sendo lançado, concordo com o leitor. Mas acontece que esse título me veio à cabeça enquanto dirigia o JAC T5 nesta sexta-feira no percurso de teste. Este foi do Auto Shopping Aricanduva, na zona leste da capital paulista, onde o veículo foi apresentado numa loja da JAC Motors, à Riviera de São Lourenço, o aprazível bairro-condomínio no município de Bertioga, SP, à beira da rodovia BR-101 que leva ao Rio de Janeiro. O caminho foi por Mogi das Cruzes, de onde uma serra leva ao litoral norte do estado. Pois o título reflete exatamente o estímulo aos meus sentidos ao experimentar bem esse novo chinês, tanto na parte do planalto quanto na serra. Não me lembro nos meus 40 anos testando carros de ter pegado um carro em lançamento e ter a impressão de já conhecê-lo, um déjà vu. Isso realmente me impressionou, comentei isso repetidas vezes com meu companheiro de teste, o nosso Josias Silveira.
É bom que se diga que “chinês” deve ser usado com reservas, pois nesse mundo globalizado as nacionalidades — ou “carronalidades”, como o nosso Juvenal Jorge apropriadamente cunhou — passaram a se mero dado teórico. A indústria automobilística chinesa, como qualquer outra, se vale de cérebros do mundo inteiro, da mesma forma que o avanço americano na conquista espacial se valeu de um cérebro alemão, o de Werner von Braun.
No caso da JAC, o estilo segue o ditado por Pininfarina, enquanto motor usa a experiência e o conhecimento da austríaca AVL, empresa de consultoria técnica e projetos de motores fundada em 1948 pelo prof. dr. Hans List. E como todo carro hoje, os mais diversos sistemas e componentes saem da indústria de autopeças, que inclusive participam do desenvolvimento dos modelos.
O déjá vu, o velho conhecido a que me referi foi justamente a sensação de um suve perfeito nos vários aspectos de um automóvel. A suspensão, por exemplo. Se eu tivesse ao volante de um suve todo empapelado de modo a não ser possível identificá-lo, e dirigindo-o com o necessário vigor de uma avaliação, eu diria que era trabalho do engenheiro Claudio Demaria, diretor de engenharia da Fiat brasileira, atual Fiat Chrysler Automobiles Latin America, que já tive oportunidade de mencionar aqui no AE como o melhor acertador de chassi que já vi.
A maneira com o JAC T5 se aproxima, ataca e sai de uma curva, surpreende. Não afocinha ao frear sob ação dos quatro freios a disco, aponta para a curva com total precisão, contorna-a velozmente com rolagem ínfima, aceita potência nas rodas motrizes dianteiras sem reclamar (e estas não patinam), e parte para outra após a reta. Isso num suve, nunca vi. O melhor, um acerto de suspensão que concilia conforto de rodagem com estabilidade de maneira notável. E não vi o controle de estabilidade e tração intervir nenhuma vez.
Surpresa tive foi ao me abaixar para ver a suspensão traseira: eixo de torção. Confesso, cheguei a imaginar que fosse multibraço. Mas não foi surpresa ver os braços da suspensão dianteira em posição horizontal. Os pneus são chineses GitiComfort 221 v1 205/55R15V e mostram seção transversal sensata, além de terem largo sulco central na banda de rodagem, sabidamente útil para retardar a aquaplanagem o mais possível. Nada indica serem”verdes” e, portanto, nada de ruído de rolagem. O estepe é de mesmos marca, tipo e medida, porém com roda de aço.
Depois, no almoço, Sérgio Habib, o titular da JAC no Brasil, me disse que quem faz o acerto de chassi na China é um japonês perto do seus 70 anos — olha aí a história do cérebro de novo. Esse japonês, que eu gostaria de conhecer um dia, ele sabe mesmo das coisas.
A direção de assistência elétrica é de uma precisão notável seja em relação (não informada), indexação à velocidade e no volante de 370 mm de diâmetro. Ponta-dos-dedos em manobras e firme, e não dura, em alta velocidade. É um extensão do cérebro, a direção se comporta como se imagina.
O câmbio é manual de seis marchas de caráter 5+E, com 6ª de v/1000 41,9 km/h, o que permite cruzar a 120 km/h reais a 2.900 rpm. A velocidade máxima de 194 km/h é atingida em 5ª, porém a 5.300 rpm, rotação abaixo da de potência máxima, que é 6.000 rpm. A aceleração 0-100 km/h declarada é feita em 10,8 segundos.
O comando de câmbio é dos melhores, “98% Wolfsburg”. Para quem faz questão, ou não gosta de pedal de embreagem, a JAC informa a chegada de versão com câmbio automático CVT em agosto.
O coeficiente de arrasto aerodinâmico (Cx) não foi informado, mas usar apenas 29,7 cv para rodar a 120 km/h deixa pressupor boas qualidades aerodinâmicas.
Outro dono da festa é o motor de 1.499 cm³ flex com partida a frio com álcool sem injeção de gasolina. Duplo comando, 4 válvulas por cilindro e variador de fase de admissão, dele saem 125/127 cv (G/A) a 6.000 rpm com corte limpo a 6.250 rpm e 15,5/15,7 m·kgf a 4.000 rpm. Como o veículo pesa apenas 1.210 kg, o motor brilha. É aquele que quando o ponteiro do conta-giros chega à região de 3.500~4.000 rpm mostra garra. Mas não é do tipo abaixo disso é fraco, pelo contrário, o efeito é de baixo para cima, de bom para muito bom e não de ruim para bom, um comportamento que agrada a todo autoentusiasta. Anda-se normalmente em torno de 2.000 rpm mas quando se precisa (ou se quer) o pedal da direita está ali para isso mesmo. O efeito do variador de fase é nítido.
Apesar do curso dos pistões de 84,8 mm — longo, e que também contribui para a potência aparecer já em baixa rotação — a velocidade média do pistão a 6.000 rpm é de 17 m/s, certeza de durabilidade. Para comparação, é curso menor que o do motor VW EA-827 AP800, 86,4 mm. Notáveis também a suavidade do motor e sua sonoridade que empolga sem incomodar. Também para efeito de comparação, o novo tricilíndrico 1,5-L de BMW/MINI, turbo, desenvolve 136 cv. A potência específica desse chinês é elevada, 83,4 cv/litro, mesmo sem injeção direta, e com excelente elasticidade.
Preços e versões
O T5 que acaba de chegar, depois de mostrado no último Salão do Automóvel de São Paulo (2014), onde foi bastante admirado, é vendido em três versões. A de entrada, Pack 1, custa R$ 60.000 (menos os tais 10 reais à “Sears, Roebuck”…), e traz ar-condicionado automático com leitura digital da temperatura, vidros, travas e retrovisores elétrico, alarme periférico, monitor da pressão dos pneus, engates Isofix para dois bancos, sensor de estacionamento, abertura interna do porta-malas e portinhola do bocal do tanque, computador de bordo, ajuste elétrico e acendimento automático dos faróis, banco traseiro bipartido e banco do motorista com ajuste de altura, o mesmo para a ancoragem dos cintos dianteiros.
O intermediário Pack 2 custa R$ 65.000 e vem com os itens do Pack 1 mais rodas de alumínio, faróis e luz traseira de neblina, luzes de uso diurno em LED, estrado de teto, assistente de partida em rampa e controle de estabilidade e tração desligável.
A versão de topo corresponde ao Pack 3 e sai por R$ 69.000, trazendo tudo do Pack 2 mais bancos revestidos de couro, kit multimídia com mirror link em tela tátil de 8” e câmera de ré.
Os cinco lugares de qualquer versão contam com cinto de três pontos e apoio de cabeça, mas notei a falta de saída de ar-condicionado na região do banco traseiro. Em compensação, o “menu” elaborado pelo Sérgio Habib se lembrou da faixa degradê no vidro do para-brisa, que é onde esta também a antena do rádio. Se lembrou também que muitos usam óculos de sol para dirigir e providenciou um porta-óculos onde seria a alça de teto do motorista. E há porta-objetos por tudo que é lugar, inclusive um enorme com tampa que faz o papel de apoio de braço entre os bancos dianteiros.
O volante de direção só tem ajuste de altura, mas encontrei posição de dirigir correta. Todavia, ajuste de distância é sempre desejável. Os pedais são bem posicionados e o punta-tacco é feito sem dificuldade.
Dentro, espaço amplo até para quem está sentado “atrás de mim” e uma cabine suficientemente larga para três passageiros atrás.
O T5 tem entre-eixos de 2.560 mm e comprimento de 4.325 mm, largura de 1.765 mm e altura de 1.625 mm. Para se ter uma ideia, no concorrente Honda HR-V essas medidas são, na ordem, 2.610/4.294/1.772/1.586 mm. O volume do porta-malas é 600 litros, mas o tanque poderia ser maior, é de apenas 45 litros, muito pequeno para quem utilizar álcool.
O consumo informado é Inmetro/PBE. Na cidade, 9,6 km/l e na estrada, 12,2 km/l, com gasolina. Se for álcool, 6,8 km/l cidade e 8,2 km/l, estrada. No percurso de teste o computador de bordo sempre indicou 10 a 10,5 km/l e com ar-condicionado ligado, e testando, o que não é uso normal, fora que era motor 0-km. Aliás, o computador de bordo merecia um comando melhor, são dois pequenos botões na parte inferior do mostrador central entre o conta-giros na esquerda e o velocímetro. Esse dois instrumentos, mesmo sem serem “Wolfsburg”, têm boa legibilidade.
Assim, e em resumo, quem pretender entrar para o admirável mundo novo dos suves tem uma boa e acessível opção no JAC T5, que ainda por cima leva uma garantia contratual de 6 anos. Embora com os problemas conhecidos, a operação da JAC já passou pela prova da responsabilidade e da confiabilidade e o nível de construção do produto já deixou para trás os (pequenos) problemas de cinco anos atrás. Na fábrica em Camaçari, BA, menor que a inicialmente planejada, o T5 será nacionalizado no ano que vem, mesmos passos dos grandes fabricantes alemães Audi/Volkswagen, BMW e Mercedes-Benz, e do inglês Jaguar Land Rover. O fato irrefutável é que a JAC está firme na briga e o T5 reforçou o time.
BS
Veja mais fotos em seguida à ficha técnica
FICHA TÉCNICA JAC T5 Pack 3 | |
MOTOR | |
Tipo | Quatro cilindros em linha, transversal, bloco e cabeçote de alumínio, duplo comando de válvulas, corrente, variador da fase na admissão, 16V, flex |
Diâmetro x curso | 75 x 84,8 mm |
Cilindrada | 1.499cm³ |
Formação de mistura | Injeção no duto |
Potência | 125 cv (G), 127 cv (A); a 6.000 rpm |
Torque | 15,5 m·kgf (G), 15,7 m·kgf (A); a 4.000 rpm |
Corte de rotação | 6.250 rpm (limpo) |
Taxa de compressão | 10,5:1 |
TRANSMISSÃO | |
Câmbio | Transeixo manual de seis marchas, tração dianteira |
Relações das marchas | 1ª 3,769:1; 2ª 2,053:1; 3ª 1,393:1; 4ª 1,031:1; 5ª 0,778:1 6ª 0,681; Ré 3.583:1 |
Relação do diferencial | 4,056:1 |
v/1000 (km/h) | 1ª 7,6; 2ª 13,8; 3ª 20,5; 4ª 27,6; 5ª 36,6; 6ª 41,9 |
SUSPENSÃO | |
Dianteira | Independente, McPherson, mola helicoidal, amortecedor pressurizado e barra estabilizadora, em subchassi |
Traseira | Eixo de torção, mola helicoidal, amortecedor pressurizado e barra estabilizador integrada ao eixo |
DIREÇÃO | |
Tpo | Caixa de pinhão e cremalheira, assistência elétrica indexada à velocidade |
Diâmetro mínimo de curva | n.d. |
FREIOS | |
Dianteiros | A disco ventilado |
Traseiros | A disco |
Controle | ABS, EBD e auxílio à frenagerm |
RODAS E PNEUS | |
Rodas | Alumínio, 6Jx16 |
Pneus | 205/55R16V, inclusive estepe |
CONSTRUÇÃO | |
Tipo | Monobloco em aço, suve, 4 portas, 5 lugares |
AERODINÂMICA | |
Coeficiente aerodinâmico | n.d |
Área frontal | 2,28 m² (calculada) |
DIMENSÕES | |
Comprimento | 4.325 mm |
Largura | 1.756 mm |
Altura | 1.625 mm |
Distância entre eixos | 2.560 mm |
Bitola dianteira/traseira | 1.480/1.475 mm |
Distância mínima do solo | n.d. |
PESO | |
Em ordem de marcha | 1.210 kg |
Carga útil | n.d |
DESEMPENHO (COM GASOLINA OU ÁLCOOL) | |
Velocidade máxima | 194 km/h |
Aceleração 0-100 km/h | 10,8 s |
CAPACIDADES | |
Tanque de combustível | 45 litros |
Porta-malas | 600 litros |
CÁLCULOS DE CÂMBIO | |
v/1000 em 6ª | 41,9 km/h |
Rotação a 120 km/h em 6ª | 2.900 rpm |
Rotação à vel. máx. em 5ª | 5.300 rpm |
Mais fotos: