A última semana de convívio com o Toyota Prius foi marcada pela confirmação da excelência técnica deste que é o primeiro automóvel híbrido a passar pelas minhas mãos, e que superou largamente todas as expectativas.
Como de hábito, antes mesmo de buscar o Prius procurei ler tudo o que havia sido escrito sobre o modelo começando, é claro, com as matérias publicadas aqui mesmo no AE.
Seja no português clássico dos colegas Juvenal Jorge e Bob Sharp, seja em outras mal tratadas línguas, poucas foram as críticas com as quais me deparei e muitos os elogios. “Será mesmo que é tudo isso?”, me perguntei.
Agora, ao cabo da avaliação, respondo: sim, é tudo isso mesmo, e talvez mais um pouco. Quando amigos me perguntam “Que tal o Prius?” minha resposta vem sendo sempre a mesma: “É o seu futuro!”. Invariavelmente recebo de volta um risinho de ironia misturado à uma careta de incompreensão.
São eles céticos, incrédulos ou ambos? Talvez… Eu mesmo era indiferente a esta fórmula híbrida, preferindo imaginar que a melhor solução para substituir os veículos movidos por motores a combustão seriam os elétricos puros. Agora não, sou fanzoca de carteirinha do “mezzo a mezzo eletrogasolínico”. Exagerando, poderia até dizer que acho o Prius perfeito mas não gosto da palavra e tampouco do conceito. Para mim a perfeição não existe.
Quase perfeito, isso ele é. Sinceramente, o que eu mudaria no Prius não é nada que tenha relevância. O que é verdadeiramente importante para mim em um automóvel ele tem, aliás esbanja. Primeiro destes itens, a eficiência.
Não me refiro à eficiência energética, na qual ele evidentemente é craque, mas sim à global, a eficiência do veículo analisado como um todo. Um episódio desta semana confirmou a visão sobre o Prius ser globalmente bom, pois em uma manhã de meio de semana, um compromisso em local distante uma centena de quilômetros de minha casa, me fez usar o Toyota de um modo para o qual ele não nasceu. Atrasado, sai de casa como se não houvesse amanhã, nem radares, nem multas. O bom senso ficou sobre a mesa do café da manhã.
Na sinuosa rodovia, tentando vencer o duelo contra o horário de chegada mostrado no Waze, me deparei com uma inesperada capacidade do Prius de sustentar ritmo forte sem “roer a corda”, sem demonstrar limites de nenhuma entidade. Neutro, preciso, estável, “na mão”, o sedã da Toyota me lembrou dois carros que encararam o Teste de 30 dias e me encantaram quando, por qualquer motivo, foi necessário rodar em ritmo elevado: o Volkswagen Jetta TSI e o Audi A3 sedã.
Ambos crias da mesma escola germânica, onde a valorização do comportamento rodoviário em velocidade elevada está na raiz de seus projetos, confesso que sentir o híbrido japonês à vontade nesse ambiente “Autobahn” foi uma espécie de cerejinha sobre o sorvete, pois no uso civilizado urbano assim como na civilizada viagem familiar que realizei, o Prius ser competente foi como ver um tiroteio em um filme do Stallone, mais do que esperado.
Na sucessão de curvas de alta o híbrido segurou mais do que a onda, segurou o oceano inteiro. Preciso, cirúrgico e inclusive bem disposto, respondendo de maneira razoável ao acelerador. Certamente não retoma com o vigor que os 200 cv do mencionado Jetta TSI oferecem, mas não é frustrante. Porém, mais do que efetividade em termos de potência, o Prius fez ver um acerto de suspensões excelente, e tudo isso aliado a um consumo que, mesmo abusando no pedal da direita, não despencou: no trecho da ida, cerca de 100 quilômetros feitos em pressa máxima, a marca vista foi de 12,8 km/l, o recorde negativo desta avaliação.
Recorde positivo? Teve sim! Nesta mesma semana um trecho de cerca 15 quilômetros percorrido em congestionadas vias paulistanas encharcadas ofereceu gloriosos 23,8 km/l, marca que para ser obtida teve a participação do motor elétrico em 72% do trecho. Registro: uma das graças do convívio com o Prius foi explorar o festival de informações que o computador de bordo oferece, inclusive o simples mas sempre interessante registro que, ao final de cada percurso, ao desligar o carro, confere uma nota à maneira como se dirigiu (sob o ponto de vista da gestão da energia) e dá conselhos tipo “regule melhor o ar-condicionado” ou “procure usar o acelerador de modo mais progressivo” ou coisa que o valha, tudo escrito em inglês na pequena tela incrustada no centro do painel.
Outra bom “tique” que o convívio com o Prius causa é a busca atávica à condução “ECO”: tanto no head-up display (a projeção de dados no para-brisa) quanto em uma das trocentas telas selecionáveis no painel de instrumentos há um gráfico onde é possível verificar, em tempo real, se a condução está premiando a locomoção elétrica, se está havendo regeneração de energia (quando se desacelera e/ou freia) ou se é o desperdício a dominar a tocada.
Acreditem que, com o tempo, o Prius me ensinou a usar o acelerador de maneira mais suave, progressiva, o que contribuiu para marcas ainda melhores e uma autonomia simplesmente incomparável. Durante todo o teste abasteci quatro vezes mas poderia ter feito apenas duas passagens pela bomba nestes pouco mais de 1.600 km rodados.
NA SUSPENTÉCNICA
Eu estava ansioso pelas palavras de Alberto Trivellato, mas ao mesmo tempo receoso: como o homem de oficina, que sempre privilegia aspectos de praticidade em suas análises, reagiria à não indiferente complexidade do Prius e seus dois motores?
Sábio, no passeio que precedeu a observação das entranhas do Prius, Alberto se ateve a analisar o comportamento do Prius apenas sob ponto de vista da suspensão e freios enquanto eu repassava à ele aspectos técnicos e informava sobre as múltiplas possibilidades do “set-up” não só em termos energéticos — os modos ECO, NORMAL e POWER — como as intrincadas possibilidades de informações no painel e na tela da central multimídia.
Não demorou cinco minutos para os elogios ao acerto de suspensões começarem a jorrar, assim como ao sistema de direção, à resposta aos comando e a sempre muito importante ergonomia. O colaborador “se achou” logo no ajuste de banco e volante, pouco deu bola a aspectos estéticos da cabine que imaginei ele não apreciaria (o painel central em vez de diante dos olhos, por exemplo) e buscou irregularidades da pavimentação que exaltassem limites da estrutura do Prius, logo definida por ele como excelente.
“Não torce, não tem cric-cric de acabamento interno e o conforto acústico é excelente”, declarou de cara. Na sequência se manifestou sobre o fato de o motor a combustão “acordar” de maneira mais do que sutil. Estávamos parados em um semáforo, o nível das baterias baixo e o 4-cilindros em linha ligou para oferecer carga à bateria sem que tal ação resultasse em nada além de uma quase que imperceptível vibração seguida de um discreto ruído de motor ligado que, logo logo, desapareceu.
Expliquei a Alberto que o Prius é assim: liga e desliga seu motor a combustão de maneira discretíssima, o que ora tem a ver (a maioria das vezes) com a bateria que aciona o motor elétrico alcançar nível de carga baixo, mas que as vezes liga mesmo com o nível estando alto. A razão? Não sei ao certo, mas ocorreu um par de vezes ao ligar o Prius em manhãs frias.
No trajeto as considerações sobre a excelência da gestão dos motores foi exaltada: para mim (e Alberto Trivellato concordou) o grande diferenciador do Prius não é a ótima performance oferecida pelos motores, mas sim a gestão impecável da central eletrônica que determina quando um, outro ou ambos atuarão e em que percentual. Não se sente a transição, não há incerteza, apenas eficiência máxima. Do mesmo modo o câmbio CVT passa batido, discreto e eficaz. Adequado ao propósito.
De volta a oficina, uma análise mais apurada de aspectos construtivos — regularidade das frestas entre portas, soldas, fixação de componentes e outros detalhes — premia o Toyota com um elogio de um profissional acostumados à fina flor da produção mundial. Como disse no início deste 30 Dias, o Prius não tem a pretensão de ser um “premium”, mas seu padrão construtivo e de acabamento não faz feio diante dos sedãs desta categoria, sempre mais caros do que ele.
Suspenso no elevador, o que se esperava ver por baixo confirma-se: o tratamento aerodinâmico é elaborado. Nada de formas rebuscadas mas sim um assoalho plano, com poucas e essenciais reentrâncias: o ar escoa de maneira fácil por baixo do Prius. Na observação da suspensão dianteira, Alberto nota ser ele um Toyota sem parentesco com seus antepassados. Apesar da suspensão dianteira McPherson, seus componentes em nada se assemelham aos vistos em Corolla, RAV4 ou outros da mesma fabricante. Destaca-se — segundo o colaborador — uma robustez incomum que promete durabilidade superior em partes como bandejas de suspensão, braços de direção, barra estabilizadora e sua ancoragem e todo o subchassi onde a suspensão é fixada. Alberto nota não só o superdimensionamento mas também a opção de distanciar a estrutura do subchassi do monobloco por intermédio de uma espécie de espaçador.
Caminhando em direção à suspensão dianteira, as passagens para dutos e cano de descarga são amplas e praticamente não se percebe onde estão tanque e a grande bateria, que ocupam a região onde está o assento traseiro. Cobertas por superfície plástica, o máximo que se vê é um grosso cabo alaranjado que “caminha” protegido pela parte inferior do carro, supostamente levando e trazendo energia elétrica do motor à bateria e vice-versa. Detalhe: o Prius vendido no Brasil tem bateria de Ni-Mh (níquel metal hidreto), enquanto no Japão e EUA a bateria é de íons de lítio. Diferença? Segundo a Toyota, nenhuma. Justifica a adoção de dois componentes diversos (mas de capacidade análoga) por apenas um só fornecedor não ser capaz de abastecer sua produção. Lendo cá e lá, descobri que em termos práticos nada muda, todavia a bateria de íons de lítio é mais leve, cerca de 16 kg.
De volta à análise de Alberto Trivellato, o colaborador faz notar como a região posterior ao eixo traseiro sobe de maneira acentuada em relação ao plano do entre-eixos, funcionando como um extrator de ar. Sobre a suspensão traseira, mais elogios: os mesmos sinais de robustez incomum e a sofisticação proporcionada pela opção multibraço em vez da mais simples – mas não menos eficaz segundo o colaborador – opção por eixo de torção.
Veja o vídeo na Suspentécnica:
A análise termina quase com aplausos. O experiente colaborador gostou do que sentiu, do que viu e está encantado com o Prius. Ele mesmo é capaz de relevar e entender a opção da Toyota em dar ao seu híbrido um desenho que evidentemente busca diferenciá-lo na paisagem, deixar claro que ele é um carro incomum inclusive na aparência, gostemos dela ou não.
Pragmático como todo dono de oficina deve ser, Alberto Trivellato propõe alguns questionamentos de ordem prática sobre o que deve passar na cabeça de um candidato a dono de Prius. Óbvio é que a manutenção deverá privilegiar as concessionárias tendo em vista a complexidade/singularidade do conjunto propulsor de dois motores, aspecto aliviado pelo baixo custo da manutenção “tudo incluído” e pela garantia de 3 anos (geral) e oito anos para componentes relacionados ao conjunto de propulsão híbrido. Porém, e quanto à funilaria, pergunta o colaborador? Será que uma corriqueira retirada e conserto de um para-lama ou para-choque em um Prius não apresenta problemas por conta da eletrônica avançada? Achamos que não, mas não temos certeza… E quanto a um aspecto muito comum (infelizmente) nos carros desta faixa de mercado, a blindagem? É possível blindar um Prius? Vai saber…
Seja como for — trocar um pneu, uma lâmpada, uma porta — por ser ele um carro tão inovador a melhor opção é usar o serviço autorizado, o que no caso não é problema tendo em vista a boa fama das concessionárias Toyota no Brasil.
Eficiente, econômico, confortável, bem acabado e nem tão caro assim pelo que oferece, o Toyota Prius passa pelo nosso Teste de 30 Dias tirando nota máxima, surpreendendo pela sua modernidade e competência e se demonstrando uma opção excelente por inúmeros motivos, grandes ou pequenos: paga menos IPVA em no estado de São Paulo (50%) assim como está isento do rodízio municipal, consome combustível de maneira parcimoniosa e lhe faz sentir menos malvado com relação ao meio ambiente, desliza nos congestionamentos como nenhum outro sedã de seu porte o faz, silenciosa e confortavelmente, e ao mesmo tempo é espaçoso e oferece lugar mais do que decente para abrigar a bagagem de quatro pessoas. Tem todos os equipamentos de segurança passiva e ativa necessários assim como de infotenimento. Perfeito? Não, não é. Mas está bem perto disso. Pensando bem, nenhum outro carro de sua categoria oferece tanto como ele.
RA
Leia os relatórios anteriores: 1ª semana 2ª semana 3ª semana
TOYOTA PRIUS
Dias: 30
Quilometragem total: 1.691 km
Distância na cidade: 896 km (53%)
Distância na estrada: 795 km (47%)
Consumo médio: 16,3 km/l
Melhor média: 27,0 km/l
Pior média: 12,8 km/l
Tempo ao volante: 77h00′
Média horária: 22,0 km/h
Tempo de uso em EV: 42%
Litros consumidos: 103,97
Custo: R$ 370,46 (média litro R$ 3,56)
Custo km rodado: R$ 0,22
FICHA TÉCNICA TOYOTA PRIUS | |
MOTOR A COMBUSTÃO | |
Denominação | 2ZR-FXE |
Tipo | 4 cilindros em linha, dianteiro transversal, bloco e cabeçote de alumínio, duplo comando de válvulas, 4 válvulas por cilindro, ciclo Atkinson, gasolina |
Instalação | Dianteiro, transversal |
Diâmetro x curso (mm) | 80,5 x 88,3 |
Cilindrada (cm³) | 1.798 |
Aspiração | Natural |
Taxa de compressão (:1) | 13 |
Potência (cv/rpm) | 98/5.200 |
Torque (m·kgf/rpm) | 14,2/3.600 |
Formação de mistura | Injeção multiponto |
MOTOR ELÉTRICO | |
Tipo | Síncrono de ímã permanente |
Potência (cv) | 72 |
Torque (m·kgf) | 16,6 |
Potência máxima combinada (cv) | 123 |
Bateria | Níquel-hidreto metálico (NiMH), 28 módulos |
Tensão máxima (V) | 201,6 |
TRANSMISSÃO | |
Rodas motrizes | Dianteiras |
Câmbio | Automático CVT |
Relações extremas (:1) | n.d |
Relação de diferencial (:1) | 2,834 |
FREIOS | |
De serviço | ABS (obrigatório), distribuição eletrônica das forças de frenagem, assistência a frenagem |
Dianteiro (Ø mm) | Disco ventilado/225 |
Traseiro (Ø mm) | Disco/259 |
SUSPENSÃO | |
Dianteira | McPherson, mola helicoidal, amortecedores pressurizados e barra estabilizadora |
Traseira | Multibraço, mola helicoidal, amortecedor pressurizado e barra estabilizadora |
DIREÇÃO | |
Tipo | Pinhão e cremalheira eletroassistida indexada à velocidade |
Diâmetro mínimo de curva | |
RODAS E PNEUS | |
Rodas | Alumínio 6,5Jx15 |
Pneus | 195/65R15 |
PESOS (kg) | |
Em ordem de marcha | 1.400 |
Carga útil | 380 |
Peso bruto total | 1.780 |
CARROCERIA | |
Tipo | Sedã, monobloco em aço e alumínio, 4 portas, 5 lugares |
DIMENSÕES EXTERNAS (mm) | |
Comprimento | 4.540 |
Largura sem/com espelhos | 1.760/n.d. |
Altura | 1.490 |
Distância entre eixos | 2.700 |
Bitola dianteira/traseira | 1.530/1.545 |
Altura do solo | 136 |
AERODINÂMICA | |
Coeficiente de arrasto (Cx) | 0,24 |
Área frontal calculada (m²) | 2,23 |
Área frontal corrigida (m²) | 0,535 |
CAPACIDADES (L) | |
Porta-malas | 412 (697 com banco rebatido) |
Tanque de combustível | 43 |
DESEMPENHO | |
Velocidade máxima (km/h) | 165 |
Aceleração 0-100 km/h (s) | 11 |
CONSUMO DE COMBUSTÍVEL (INMETRO/PBEV) | |
Cidade (km/l) | 18,9 |
Estrada (km/l) | 17 |
PREÇO (R$) | 126.600 |