O causo que se segue foi enviado por um amigo, Aldo D. Toledo Fusco do CAAT – Clube de Autos Antigos de Taubaté. Ele nos relata os obstáculos que tiveram que ser vencidos para resgatar um histórico VW Fusca Patrulhinha. Mas com muita força de vontade e empenho o resgate foi muito bem-sucedido.
O resgate do VW Fusca Patrulhinha de Taubaté
Por Aldo D. Toledo Fusco
Que dó!
Foi essa minha primeira reação ao ver o Fusca 1977 – 1300 cm³ da Polícia Civil, que por 35 anos serviu à Delegacia de Polícia de Taubaté, apodrecendo no pátio junto com outros carros oficiais. Lembrei-me na hora daquele que foi seu condutor e seu guardião por tanto tempo, o investigador Arnaldo Barbério, figura única, caráter excepcional, funcionário público exemplar, cuja imagem estava tão atrelada a este Fusca que ele virou o “Fusca do Arnaldo”, impossível não associar um ao outro.
A história do Fusca começa em 1977 quando, junto com outras viaturas, ele foi entregue para servir nas delegacias da região do Vale do Paraíba, tendo sido designado para a delegacia de Taubaté. A partir daí começou sua trajetória de serviços, tendo sido usado como viatura de condução de investigadores, serviços burocráticos e até transporte de presos.
Em 2012 ele foi “desativado”, já que a polícia estava recebendo novas viaturas e o velho Fusca não se encaixava no modelo de eficiência que os novos modelos deveriam ter dentro das novas diretrizes estabelecidas pelos órgãos competentes, como mobilidade, acessibilidade e eficiência energética. Por ter só duas portas era difícil o acesso ao banco traseiro e, também, por ser a gasolina, quando todos outros já usavam motor flex ou diesel. Só esqueceram da versatilidade, confiabilidade e baixo custo de manutenção de todo Fusca.
O carro ficou por algum tempo no pátio da delegacia da cidade, abandonado, no tempo ao sabor das intempéries, sendo posteriormente levado para outro local onde ficavam os carros apreendidos ou irregulares, mas sem nenhum cuidado, tendo algumas peças e partes roubadas, além de ter sido todo pichado. E nesse processo de deterioração ficou por três longos anos.
Olhando os detalhes é que o início da depredação se tornava evidente:
Foi um associado do CAAT, Sérgio Garcia, que sabendo da importância do carro, sua história única, sua ligação com Taubaté, acionou a diretoria do CAAT, que prontamente abraçou a causa e iniciou um processo junto aos órgãos do governo estadual para que a “patrulhinha” nos fosse doada, com o compromisso de restaurá-la por completo, servindo como testemunho de época.
Outro associado, Dr. Pedro Campos Neto, delegado de polícia aposentado, nos orientou nos procedimentos para pedir a doação. Primeiro recorremos à Secretaria de Segurança, mostramos nossa intenção, usamos de todos os argumentos, mas a doação nos foi negada, baseada em normas internas da instituição. Não desistimos, o carro tinha que ser nosso.
Batemos então na porta do Governador, através de um deputado da região, que muito solícito se colocou à nossa disposição para intermediar a doação. Infelizmente a resposta foi a mesma, o carro não poderia ser doado, seria leiloado e o montante arrecadado seria encaminhado para o Fundo Social do Palácio do Governo ou algo parecido.
Dias depois foi removido para o pátio do leiloeiro, já bem mais degradado, tendo sido criminosamente pichado:
Começou então uma verdadeira perseguição ao destino do carro para saber para onde iria, qual seria o leiloeiro, qual o dia do leilão, etc.
Até que no dia 8 de dezembro de 2015 fomos avisados pela assessoria daquele deputado que o leilão estava marcado para dali a dois dias num leiloeiro de São Paulo, que o carro seria o lote 595 e com a boa notícia que teria direito a documentação, ao contrário de outros carros que seriam vendidos como sucata. A sorte estava no nosso lado, pensamos, mas não foi bem assim.
Dia 9, véspera do leilão, entramos em contato com o leiloeiro para saber como poderíamos participar e outras informações e soubemos que deveríamos estar cadastrados 48 horas antes do pregão, ou seja, no dia 8, pois sem este cadastro não teríamos como dar os lances. Foi um balde de água fria, pensamos: nadamos tanto para morrer na praia? De jeito algum, começamos a procurar algum conhecido que já fosse cadastrado no leiloeiro para participar do leilão e mais uma vez o Sérgio Garcia, aquele que começou toda a história, nos socorreu. Um amigo dele, Jaime Campos, era cadastrado e se dispôs a nos ajudar.
Achávamos que seria uma arrematação tranquila, afinal quem iria querer um Fusca 1977 que tinha sido da Polícia, além do mais todo detonado, praticamente uma sucata? Mas tinha um “boi na linha” e fomos disputando, lance a lance, até que conseguimos, finalmente, ter a certeza de que a patrulhinha era nossa! O valor inicial era de R$ 800,00, mas acabou sendo arrematado, depois de 20 lances, por R$ 2.900,00. Acabava aí a epopeia da aquisição do carro, estávamos contentes, eufóricos até, mas sabíamos que tínhamos um longo caminho pela frente e que não seria fácil.
Alguns dias depois o carro voltou para Taubaté e quando fomos avaliá-lo, estava pior do que imaginávamos, muito estragado, castigado, vandalizado. Nas fotos abaixo, o Fusca já resgatado, aguardando a documentação e o início de sua restauração:
Primeira coisa a fazer foi lavar e tirar anos de “crosta” que estava incrustada. Depois foi levado para o mecânico para uma revisão total. Paralelo a isso, providenciamos a documentação, deixando tudo em dia.
Saindo do mecânico o Fusca foi para o funileiro, que o desmontou por completo, restaurou o que precisava, eliminou as ferrugens, consertou os amassados, que não eram poucos, ainda bem que eram superficiais.
A etapa seguinte foi a pintura em duas cores seguindo o padrão da frota da Polícia Civil da época (1977).
Depois foi para o eletricista e finalmente para o tapeceiro que refez toda tapeçaria o mais próximo possível do padrão original. Lembram das fotos do interior do carro tiradas no pátio da Polícia Civil de Taubaté? Então comparem com estas do Fusca restaurado:
Vale salientar que desde que o carro chegou, os associados do CAAT ajudaram com a doação de peças, sugestões, palpites, todos imbuídos no mesmo propósito, o de recuperar o Fusca. Outro associado, proprietário de loja de autopeças, forneceu boa parte das peças e acessórios pelo preço de custo. Também através de outro associado conseguimos a sirene original, que havia sido retirada do carro, funcionando perfeitamente.
Um dos primeiros “compromissos oficiais” de nossa Patrulhinha foi participar da inauguração da nova Delegacia de Polícia de Pindamonhangaba, onde ele foi a atração do dia.
Em 2017, após minuciosa avaliação, o Fusca Patrulhinha do CAAT obteve seu “Certificado de Originalidade” tendo recebido as merecidas Placas Pretas, coroando a luta de sua salvação e recuperação. (fotos 11,16)
Todo este processo de compra e recuperação demorou aproximadamente três desgastantes anos, mas valeu a pena. Hoje nosso Fusca exibe sua beleza nos desfiles cívicos, nas exposições e eventos do CAAT, mostrando que a história tem que ser mostrada e valorizada através de fatos e objetos afeitos a ela.
Todo este trabalho teve dois amigos que se destacaram do início ao fim desta epopeia que são o Aldo D. Toledo Fusco e o Arnaldo Barbério.
Aqui cabe o agradecimento ao Aldo que é um leitor do AUTOentusiastas da primeira hora. Foi assim que ele começou a acompanhar a coluna “Falando de Fusca & Afins” fato que acabou resultando em convite para um agradável ciclo de palestras sobre Fusca e Kombi em Taubaté, coisa que até rendeu uma matéria: “Leitura do AUTOentusiastas gera palestra” .
Mas não ficou nisto somente, o AUTOentusiastas foi convidado para participar do Rali do CAAT, que foi a minha primeira experiência neste tipo de competição e que rendeu uma matéria longa, em três partes “O primeiro rali ninguém esquece“.
Eu fiquei admirado de ver o Fusca Patrulhinha do CAAT e um causo sobre ele já estava alinhavado há algum tempo. Graças ao amigo Aldo, a quem eu reitero os meus agradecimentos, está sendo publicada agora.
AG
As fotos desta matéria foram enviadas pelo Aldo D. Toledo Fusco.
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A coluna “Falando de Fusca & Afins” é de exclusiva responsabilidade do seu autor.