A palavra ‘rali’, do inglês ‘rally’ e do francês ‘rallye’, nos remete àquelas competições automobilísticas duríssimas, disputadas em estradas de terra, ou asfaltadas molhadas ou nevadas, geralmente em terreno montanhoso com muitas curvas e o público se acotovelando e correndo risco de morte às margens das vias (foto de abertura). E não estamos errados, esse é rali: é o de velocidade, no qual o fator determinante de vitória é velocidade em trechos fechados ao trânsito, numa corrida contra o relógio.
Já no rali de regularidade o fator determinante de vitória é justamente o que o nome diz, a regularidade Quem for mais regular em trechos pré-determinados em estradas abertas ao trânsito, vence. Isso significa que os tempos para percorrer os trechos levam em conta a velocidade máxima permitida.
Nos dois tipos de rali o carro é “tripulado” por um piloto e um navegador, e ambos podem assumir o volante durante a prova.
Ainda com fator determinante ser velocidade, temos o rali Cross Country, uma prova off-road com suas inerentes dificuldades de percurso, e o rali-reide, de longa duração e extensão como o Rali Dakar e o Rallye dos Sertões;. Tanto o rali de velocidade quanto o rali-reide têm campeonato mundial, o WRC e o W2RC, respectivamente, que acabam gerando imagens de encher os olhos de tão belas.
Quando se trata de velocidade, carros e tripulação são postos à prova, ao contrário dos ralis de regularidade, nos quais a conversa é bem diferente. Começa pelos carros normais do dia a dia, sem necessidade de qualquer preparação. É como viajar de automóvel..
Mas enquanto a emoção do lado de fora é de apenas ver os carros adesivados e numerados desfilando pelas vias, a bordo trava-se uma batalha constante entre piloto e navegador para ficarem dentro do tempo imposto pelos organizadores e a velocidade resultante. É ali que esta a emoção. E para tornar mais difícil a missão dos competidores, o caminho só vai sendo conhecido à medida que a prova vai se desenrolando.
Aqui no AE temos várias matérias sobre rali, desde as dificuldades que é organizar um, relatado pelo Ronaldo Berg, até participações memoráveis de membros e amigos do AE. Basta fazer uma busca para encontrar ótimos relatos.
Regularidade é a chave do sucesso
No rali de regularidade os participantes sabem de antemão apenas o local da largada e o da chegada. Detalhes do percurso são guardado a sete chaves até a noite anterior, quando as planilhas são distribuídas, tanto as impressas como as digitais, o que impossibilita os participantes de poderem fazer um reconhecimento ou treino.
A largada é individual com os carros partindo em intervalos de 1 minuto. Portanto, ao longo da prova só acontecem ultrapassagens se algum dos competidores se atrasar ou se adiantar.
Os percursos escolhidos são por estradas públicas e abertas ao trânsito. Portanto, ao se encontrar trânsito pela frente, esse se torna um agravante para a manutenção da média horária estabelecida. Mas o contrário também acontece: o competidor do rali é quem segura o fluxo dos demais veículos.
Ao longo do percurso as médias horárias são alternadas para cima e para baixo, justamente para trazer maior dificuldade aos competidores. Os trechos de entroncamentos e pedágios são considerados deslocamentos neutros, sem controle de tempo, mas logo na sequência começa outro trecho cronometrado e a atenção ao horário tem que ser total.
Nos primórdios dos ralis de regularidade, ao longo de todo o trajeto haviam Postos de Cronometragem (PC) escondidos para aferir a hora em que cada competidor passava. A evolução chegou aos PCs e hoje são definidos por GPS ao longo do percurso e obviamente não divulgado aos participantes, ou seja, continuam escondidos. Para cada segundo adiantado ou atrasado perde-se pontos, que são computados ao final da prova.
Os carros são equipados com transponder fornecido pelo organizador que registra em tempo real o deslocamento do veículo. Ao final da prova os transponders são recolhidos e seus dados, processados, indicando quanto cada competidor passou adiantado ou atrasado nos PCs. Soma-se os pontos perdidos e tem-se a classificação final.
Mas onde está a emoção do rali de regularidade? Dentro do carro. É nos erros e acertos que piloto e navegador vão identificando. A primeira grande batalha é acertar o caminho a seguir que está mostrado em forma de “tulipas” nas planilhas.
Apesar de o piloto e o navegador não saberem onde estão os PCs, há inúmeras referências para verificação do tempo e consequente velocidade média. Quanto mais próximo do tempo ideal estiver ao passar por essas referências, maior a probabilidade de zerar no PC da sua proximidade. Adiantado ou atrasado? Não importa. O que importa é corrigir a velocidade do carro e buscar o zero na próxima referência. E assim sucessivamente.
Muitas vezes não há tempo para tomar uma água ou uma conversa informal dentro do carro, pois o foco é total no caminho, tempo e velocidade a seguir. O relaxamento acontece nos trechos de descanso ou neutralizado, quando é possível conversar com outros competidores e validar o que passou e o que há pela frente.
A navegação também evoluiu para o digital. Se em um tempo longínquo os navegadores utilizavam máquinas de calcular da Facit, pois eram mecânicas e não precisavam de bateria, hoje os pilotos e navegadores contam com aplicativos para smartphone e em alguns casos é permitido utilizar antena de GPS externa para melhorar a precisão da navegação. E a planilha impressa, essa nunca é deixada de lado, pois é ali que se marcam as observações importantes passadas na reunião com o diretor de prova antes da largada.
Como curiosidade, a foto abaixo mostra o sofisticado equipamento de navegação dos profissionais do rali de velocidade:
Esse conjunto de modernidades de navegação permite que pilotos e navegador de todos os níveis participem dos ralis de regularidade, e o Rally Clássicos São Paulo vem se consolidando como um evento altamente atraente. A divisão dos carros em seis categorias, pela idade dos veículos, e mais uma categoria exclusiva para as duplas experientes, democratizou a competição, colocando todos em condições de igualdade na competição.
E se não levar troféu para casa, pelo menos vai aumentar o número de amigos e pode até conhecer um novo guincheiro.
GB
Nota do autor: o termo ‘navegador’ deixou de existir há muito tempo em favor de copiloto, conforme os regulamentos internacionais.