No meio da preparação de motores, especialmente VW boxer (cilindros horizontais opostos), é relativamente comum se falar em virabrequim roletado devido à sua utilização nos primeiros Porsches 356 A 1500, em 1953.
O nome virabrequim vem do francês vilebrequin, palavra que seria corruptela de virebrequin, ferramenta em forma de manivela, com uma broca na ponta, para abrir furos. Quem conhece marcenaria certamente sabe o que é uma pua.
O virabrequim é uma manivela que é movimentada pela biela, esta recebendo o movimento linear do pistão e transformando-o em movimento circular por meio do virabrequi9m. Como o virabrequim transmite torque ele é tecnicamente uma árvore e não um eixo (peça em torno do qual algo gira). Por isso o virabrequim de motor monocilindro é uma árvore de manivela e os de dois cilindros ou mais serem uma árvore de manivelas (crankshaft em inglês)
Na foto acima veem-se quatro manivelas por se tratar de um motor de quatro cilindros. Além das quatro manivelas há os cinco mancais de apoio nos quais o virabrequim gira. Como boa prática de engenharia de motores, o número de mancais de apoio deve ser número de cilindros +1 para evitar flexão do virabrequim. Num seis-cilindros em linha, por exemplo, sete mancais de apoio, caso do motor do Opala — o antigo, do Veraneio, tinha só quatro.
O virabrequim ou árvore de manivelas é fabricado em ferro fundido nodular ou, para máxima resistência, em aço forjado.
O virabrequim e a biela formam o chamado sistema biela-manivela, por isso a biela é um item de fundamental importância. Ela consiste de uma haste com um furo em cada extremidade. O furo maior, chamado cabeça. fica em baixo e menor, em cima..
Note que a cabeça da biela é dividida, pode ser aberta de modo a ser possível montá-la no colo da manivela. É aqui que começa, de fato, essa história de virabrequim roletado.
O motor 1500 do Porsche 356 A
O começo da produção da Porsche foi muito difícil. Ela precisou recorrer a Heinz Nordhoff, contratado pelas forças de ocupação inglesas em janeiro de 1948 para dirigir a Volkswagen, para que lhe fornecesse motor, transeixo e eixo dianteiro completo do Volkswagen para aplicar no Porsche, maneira de viabilizar a produção do primeiro carro de produção com emblema Porsche, o 356/2. Nordhoff o atendeu prontamente.
A “fábrica” o operava precariamente numa velha serraria em Gmünd, na Áustria, para onde Ferdinand Porsche, sua família e funcionários da firma de Projetos e Construção de Veículos de Porsche foram ao deixarem Stuttgart, no outono de 1944 para ficarem a salvo dos bombardeios dos aliados por ser Stuttgart uma cidade eminentemente industrial e, portanto, alvo militar,
O motor VW era de 1.131 cm³ (75 x 64 mm), o que o deixava sem chance na classe1.300-1.500 cm³ das corridas e ralis. Ferry tratou então de reduzir a cilindrada para 1,086 cm³ (73.5 x 64 mm). O motor recebeu dois carburadores 32, taxa de compressão de 7:1 e desenvolvia 40 cv a 4.000 rpm. A Porsche recomentava mistura de gasolina com 20% a 40% benzeno dada a baixa octanagem da gasolina de então.
Mas ainda era potência insuficiente para um carro esporte. Ferry mandou sua engenharia de motores elevar a cilindrada para 1.286 cm³ (80 x 64 mm). Junto com o maior diâmetro dos cilindros, estes eram de alumínio com as paredes revestidas de cromo, fornecidos pela Mahle, em vez de ferro fundido. Cada cilindro passou a pesar 720 gramas contra 2 kg antes, além de melhorar o arrefecimento. A potência subiu para 44 cv a 4.200 rpm e isso com gasolina apenas, já que a taxa de compressão baixara para 6,5:1.
Ferry decidiu que o 356 A teria que ter motor de 1.500 cm³, mas sabia que não seria possível devido a falta de espaço para o curso dos pistões 10 mm maior, calculado para ser de 74 mm. Afinal, o motor ainda era basicamente Volkswagen. O que impedia o aumento de curso era a cabeça das bielas que não passaria pela carcaça.
A solução veio da firma Albert Hirth AG, que produzia o virabrequim roletado do motor V-16 do monoposto de Grand Prix Auto Union P-Wagen nos anos 1930. A cabeça da biela deste motor era pequena justamente por ser inteiriça, não ter capa removível nem seus parafusos de fixação. Por isso só podia ser montada no virabrequim que consistia de peças individuais montadas em prensa. O “roletado” refere-se unicamente à gaiola com roletes entre a cabeça da biela e o seu respectivo moente, em vez de nele montada com os tradicionais casquilhos, como nas duas metades da carcaça do motor.
A Hirth fez o virabrequim roletado para a Porsche, mostrado na foto de abertura e repetida abaixo.
A Porsche nunca clamou aumento de desempenho devido ao virabrequim roletado, apenas “que o motor girava mais livremente”, O motor de 1.488 cm³ (80 x 74 mm) entregava 60 cv a 5.000 rpm.
Como curiosidade, o virabrequim do motor de três cilindros 2-tempos do DKW-Vemag era roletado, com a diferença de os quatro manais de apoio serem rolamentos de esferas.
BS