Em meados de agosto último recebi o telefonema de um amigo de longa data, José Ricardo de Oliveira, mais conhecido como “Zé” Ricardo. Dono da ZR Soluções Automotivas, ele me fez um convite irrecusável: assistir à apresentação do seu novo trabalho, uma réplica do famoso carro de arrancada americano, o EMPI Inch Pincher Too. Dias depois veio o convite, enviado somente a uma seleta lista de convidados.
O nome do evento bem definia a sua clientela: “Old School VW Meeting” (Reunião VW da Turma Antiga) que reuniu um pessoal apaixonado pelos VW “dos velhos tempos”. Muitos trouxeram suas joias que encheram a rua lateral da praça Benedito Calixto, no bairro paulistano de Pinheiros, numa manhã gelada de agosto. Mas o frio não congelou o ânimo dos presentes.
Mas vou deixar o José Ricardo contar a história desta réplica e da festa. Desse ponto em diante a palavra está com ele.
Como comecei a construir réplicas
Sempre gostei muito de pesquisar o que cada carro representou para cada um dos universos automobilísticos. A paixão pelos VW de competição sempre foi maior e notei que os carros se perdiam com o decorrer do tempo. Depois de uma longa pesquisa e constatando que um dado exemplar original não existia mais, eu iniciava um estudo sobre o modelo e partia para uma recriação, sempre de carros emblemáticos. Foi assim que tudo, essa saga,, começou
Fitti-Volks 1600
Conforme a imprensa da época: foi em 1968, para uma prova do Campeonato Brasileiro de Viaturas de Turismo – Divisão 3, que Amador Pedro preparou seu primeiro Super-Fusca, que seria pilotado por Emerson e Wilson Fittipaldi Jr. Dotado de um motor 1600 (os Fittipaldis comercializavam um jogo de cilindros, pistões e anéis de 85,5 mm para elevar a cilindrada do motor 1300), o carrinho foi a sensação da prova realizada no então Autódromo Internacional do Rio de Janeiro, em Jacarepaguá. Nos treinos de classificação, ele mostrou sua valentia, fazendo melhor tempo do que os carrões da época — Alfa Romeo e Simca. Durante a corrida, foi o carro n.º 87. de Emerson e Wilsinho, que conseguiu um fato realmente espetacular: bater o recorde do circuito carioca, que, até aquele dia, pertencia a um Alfa Romeo GTA importado por Piero Gancia.
Em 2001 terminei uma recriação do Fitti-Volks exatamente como ele era e, de quebra, os irmãos Fittipaldi autografaram o carro atestando a fidelidade aos detalhes do projeto.
Mais fotos da réplica que eu fiz deste carro:
O Brasília 17 de Ingo Hoffmann
Pesquisando no livro “Ingo”, de Tiago Mendonça, o Brasília, que seria preparado para correr na categoria Divisão 3, foi solicitado pelo Ingo Hoffmann a seu patrocinador Creditum, seguindo o conselho do preparador Gilberto “Giba” Magalhães, que, na época foi contratado com exclusividade para atendê-lo. Giba mudou o ponto de fixação do motor para deixar o Brasília mais baixo, instalou um câmbio Hewland de cinco marchas de Fórmula 3 — em posição invertida, para viabilizar a utilização — e em todo o processo contou com o apoio direto do engenheiro Ricardo Divila, que na época estava desenhando o primeiro carro de Fórmula 1 da Equipe Fittipaldi.
Para a pintura do carro o Ingo lançou mão de seu amigo Sid Mosca, que depois fez carreira pintando capacetes para vários corredores brasileiros e estrangeiros. Embora não houvesse nenhuma associação comercial, Ingo pediu as cores patrocinadas na época pela Gulf Oil, uma petrolífera americana. Um exemplo dos carros patrocinados por esta petrolífera foi o Ford GT40, bicho-papão das 24 Horas de Le Mans de 1966 a 1969, com pintura azul claro e uma faixa longitudinal laranja, passando por capô,, teto e terminando na traseira. Mas o Sid Mosca partiu destas instruções e transformou o carro numa obra de arte!
Em seguida, em 2004, recriei o lendário Brasília 17 do Ingo Hoffmann, que acompanhou grande parte do processo juntamente com o Icônico Sid Mosca que havia pintado o carro original em 1974.
Dia da apresentação: eu sabia que o Ingo Hoffmann estaria em Interlagos para um treino da Stock Car e levei o carro de surpresa, juntamente com a TV Globo, para registrar o momento.
Fiz um pedido pessoal ao Sid Mosca para que me cedesse o capacete original com o qual o Ingo corria na época, já que muitos pilotos doavam seus capacetes para o acervo do Sid depois de expirada a sua validade.
Com o Brasília pronto, e o capacete da época no teto do carro lá estávamos nós em Interlagos na área dos boxes:
O Ingo, ao ver aquele carro, ficou com lágrimas nos olhos e disse: “Este foi o carro mais importante da minha carreira!”
Na ocasião, Ingo lembrou do câmbio invertido que a Brasília tinha e disse: “Eu tinha que fazer um exercício de memorização das marchas antes das corridas. Como o câmbio era invertido a 1ª marcha engatava no lugar de uma 5a marcha de um câmbio normal e a 5a marcha no lugar 1ª do VW”.
Mais fotos desta réplica:
A vez do EMPI Inch Pincher Too
Desde os 12 anos de idade eu “babava” nas revistas VW Trends, Volksworld e Hot VW’s com as matérias antigas sobre o mais icônico VW Fusca de arrancada dos Estados Unidos. Eu pensava comigo mesmo: “um dia vou fazer uma recriação deste carro”, e, depois de alguns anos não é que eu fiz?
Na época, tudo o que os apreciadores de VW customizados queriam era ter era uma peça EMPI em sua prateleira, o que era bem difícil naqueles tempos. EMPI já era uma grife muito admirada no Brasil naqueles anos.
Passado algum tempo, pensando em como fazer a réplica, cheguei à conclusão que deveria fazer um tributo ao carro de uma forma mais prática, e que criasse os mesmos efeitos de uma pintura convencional nos dias de hoje. Neste ponto eu decidi adesivar.
Agora era procurar um parceiro para mergulhar comigo nesta tarefa. Escolhi o André Takeda da Restaurakar, representante EMPI no Brasil. Ele me incentivou, apoiou e dividiu todos os momentos da montagem do carro. Ele foi o parceiro certo para este projeto.
O André e eu falarmos muito por telefone, ele fez visitas comigo para acompanharmos juntos a definição da instalação dos adesivos e dos acessórios. Nós nos emocionamos juntos do começo ao fim dos trabalhos só em imaginar que teríamos um EMPI Inch Pincher Too no Brasil.
Achei a L.A Custom, empresa de São Paulo especializada em diversos tipos de adesivações, com reconhecida excelência na finalização dos trabalhos e que tinha materiais nobres para fazer o projeto. Até aí, tudo certo! Mãos à obra.
Em outubro de 2021 eu comprei um Fusca 1969 branco para poder usar como base para os adesivos, desmontei algumas partes do carro e partimos para a instalação dos adesivos.
Como conheço muito bem os detalhes da carroceria do Fusca se tornou mais fácil de, com base nas fotos do EMPI Inch Pincher Too de época, definir as proporções para a adesivação de nossa réplica. Foram feitas várias visitas durante a instalação da adesivação, e tínhamos alinhavado que, qualquer que fosse a dúvida, eu gostaria de estar por perto para tomar a decisão.
As imagens necessárias para criar a adesivação foram tiradas da internet, mas sempre com muita atenção para a época de publicação das fotos para que conseguíssemos tirar referências corretas do carro, já que a esta altura já havia várias outras réplicas e nós queríamos nos fixar na versão original do EMPI Inch Pincher Too. Foi uma pesquisa bastante difícil.
O trabalho completo para a realização desta réplica foi de 11 meses. Abaixo um vídeo (02:00) com as fotos da sequência da adesivação, mostrando os detalhes deste complexo trabalho:
As empresas envolvidas na realização deste projeto foram: L.A Custom Adesivos, Restaurakar, Auto Elétrico Eletrotec, High Clean estética Automotiva, Ngarage Veículos Clássicos, Giba Escapes, Tapeçaria Moura, Vidraçaria Alcir e Atlas Acessórios.
A foto de abertura mostra a réplica pronta e abaixo a réplica vista do outro lado:
Festa de lançamento do EMPI Inch Pincher Too
Antes do evento havia uma grande Incerteza quanto ao tempo. Eu tinha certeza de que o frio viria, a possibilidade de chuva me preocupou muito, mas o Papai do Céu trouxe o Sol… Ele adora o EMPI Inch Pincher Too!!
Um grande amigo, o Caio Sá, prontamente cedeu o espaço para abrigar o EMPI Inch Pincher Too e outros carros representativos para formatarmos um evento com carros diferenciados ao redor da Praça Benedito Calixto e ainda, de quebra, comemorar o aniversário de dois grandes amigos: Maurício Marx e Eduardo Ohara.
Formatado o evento, parti para convidar alguns amigos/parceiros e agregar vários grupos em uma só festividade. Vieram o Jairo – F2J, Affonso Kherlakian- High Clean, Marcelo Bola – VW & Cia. Além destes eu tinha convidado algumas pessoas mais, que prontamente aceitaram meu convite.
Um momento especial e muito emocionante foi a chegada do VW 1957 do Sérgio Eduardo Fontana que me serviu de inspiração para vários de meus projetos, e naquele momento, me vi com 16 anos quando conheci o carro recém-restaurado em 1986. Era uma época na qual não tínhamos acesso aos refinados acessórios Porsche ou EMPI, e este carro ainda faz brilhar os olhos de quem o vê passar pelas ruas hoje em dia. Há vinte anos que este carro não aparecia em evento algum e eu tive o privilégio de tê-lo neste! Deu até um nó na garganta.
Além do carro do Sérgio, outros fizeram parte da “equipe de frente” e ocuparam seu espaço no recinto do evento, confiram abaixo (Fotos de Alexander Gromow):
Vários colecionadores e precursores do mundo VW no Brasil estiveram presentes. Foi uma delícia rever todos em um só evento
Sinto que realizei um sonho meu e de muitas outras pessoas. Digo que o EMPI Inch Pincher Too não é meu…é nosso!
Pessoas no dia do lançamento vieram falar comigo dizendo que tinham miniaturas, revistas, desenhos do carro e percebi que quando falavam seus olhos brilhavam como os meus.
A EMPI está muito presente no mundo VW e há alguns anos no Brasil, espero que aproveitem este tributo que foi feito com muito carinho e dedicação.
Permita me apresentar
Sou apaixonado por Volkswagen desde criança, meu avô me ensinou a dirigir num Fusca 1976 marrom Caravela, mas o que gostava mesmo era dos mais antigos.
Tive vários VW inclusive alguns dos anos 50.
Hoje enfrento o final de restauração de um VW Cabriolé 1960 e trabalho com o que gosto: carros antigos! Em 1993 percebi que várias pessoas gostariam de ter um VW Fusca antigo, mas não sabiam onde comprar um e muito menos como e onde consertar ou restaurá-los, decidi ajudar alguns destes amigos.
Depois de algum tempo esta atividade se tornou meu trabalho E isto é fácil? Não, não é! Mas eu consegui credibilidade através dos serviços que prestei e principalmente, através da indicação dos meus clientes que me referenciam com opiniões muito positivas.
Tenho muito orgulho da minha ocupação pois em nenhum momento imaginei que conseguiria ter meu ganha-pão no mundo dos carros antigos.
Não parei por aí…
Notei que os eventos de automóveis antigos não tinham alguém especializado em logística deste setor. Comecei a ficar conhecido e respeitado pelo empenho em resolver logísticas complexas e layouts criativos para os mais emblemáticos eventos do país.
Desde 2015 coordeno uma equipe de manutenção, preservação e restauração do acervo do Museu do Automóvel da Fundação Lia Maria Aguiar, em Campos do Jordão, SP.
Mesmo com vários dias atribulados não deixo de usar meus carros antigos para me locomover e me divertir com meus dois filhos, Guilherme e Mariana, e minha esposa que admira meu carinho e dedicação em cuidar e preservar os automóveis, em especial os antigos.
José Ricardo de Oliveira
Este foi um belo evento que reuniu muito amigos que eu não via há muito tempo. Foi como uma alegre volta ao passado, só que muitos já com cabelos brancos…
Dou meus parabéns ao José Ricardo por mais esta réplica e pelo evento tão agradável, apesar do frio que estava fazendo naquela manhã de domingo de agosto. E para finalizar ai vai uma autofotografia minha com o José Ricardo para comemorar a nossa amizade:
AG
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