Melhor notícia para os donos de automóveis não poderia haver, o uso do extintor deixar de ser obrigatório mediante resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) nº 556, datada de 17/09 último. Mas lendo a peça legal (não é lei mas tem força de por se referir tão-somente ao Código de Trânsito Brasileiro, este sim lei, a de nº 9.503 de 23/09/97) tive decepções que, mais uma vez, mostra como estamos carentes de capacidade intelectual no nosso país, combinada com má fé das autoridades constituídas.
Quando um livro escolar de Português diz ser aceitável dizer “Nós pega o peixe”, por ser linguagem popular, livro autorizado pelo Ministro da Educação (?), hoje prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, petista (só podia…), esse processo de emburrecimento da população torna-se um círculo vicioso.
Começa pelo resumo da resolução, que diz:
“Torna facultativo o uso do extintor de incêndio para os automóveis, utilitários, camionetas, camionetes e triciclos de cabine fechada.”
Primeiro, é desnecessário dizer que algo é facultativo. Segundo, como resumo, bastaria dizer “Dispõe sobre o extintor de incêndio em veículos automotores, que deixa de ser equipamento obrigatório em casos específicos.” Terceiro, não se trata de usar o extintor, mas de tê-lo no veículo. Usar extintor é extingüir fogo.
Aí começa o festival de besteiras, já no Art. 1º da resolução:
“Art. 1º Alterar o art. 1º da Resolução CONTRAN nº 157, de 22 de abril de 2004, que passa a vigorar com a seguinte redação:
Art. 1º Esta norma torna facultativo o uso do extintor de incêndio, para automóveis, utilitários, camionetas, caminhonetes e triciclos de cabine fechada, do tipo e capacidade constantes da tabela 2 do Anexo desta Resolução, instalado na parte dianteira do habitáculo do veículo, ao alcance do condutor.
§ 1º Os proprietários dos veículos descritos no caput poderão optar pelo uso do extintor de incêndio.
§ 2º Os fabricantes e importadores dos veículos descritos nos caput deverão disponibilizar local adequado para a instalação do suporte para o extintor de incêndio, na forma da legislação vigente.
§ 3º Os proprietários de veículos que optarem por utilizar o extintor de incêndio deverão seguir as normas dispostas nesta Resolução.
Percebeu, leitor? É facultativo, mas se o dono do carro decidir ter extintor no carro terá de instalá-lo onde a resolução manda. Existe burrice maior? Qual o problema de guardar o extintor no porta-malas? Será que a nossa “intelectualidade” acha que se trata de questão de vida ou morte?
Já contei aqui, meu pai gostava de ter extintor no carro, então o levava no porta-malas. Algumas vezes até ajudou pessoas.
O § 1º prossegue com a burra expressão ‘uso do extintor’. Portar é diferente de usar. Mas “nós pega o peixe” é o mesmo que “nós pegamos o peixe”, não é?
O § 2º, então, é de matar. Mesmo que o fabricante, aqui ou no exterior, não queira prever local para o extintor (por não se os ter nos carros que rodam no Primeiro Mundo), tem prover local para algo que não é obrigatório. É demais.
Cada fabricante que aja individualmente e preveja esse local para atender o seu cliente. Não tem que ser obrigada coisa alguma. Nessa linha de raciocínio toda fábrica deveria prover local para instalar lança e esfera de reboque, que não são obrigatórios, e capacidade de tração, caso o cliente deseje ou precise rebocar alguma coisa. Igual.
O § 3º é para exonerar o presidente do Contran e mandar prendê-lo. Como pode alguém permitir uma asneira dessa? Extintor não é mais obrigatório!!!
O Art. 2º da resolução nº 556, no meu entender, é o mais grave, pois denota nítido acerto com a indústria de extintores, o que se configura como crime. Como algo que não é obrigatório pode ficar sujeito a procedimentos de durabilidade e substituição? Opa, olha a indústria da multa pondo suas manguinhas de fora aí e caixa registradora dos fabricantes de extintores emitindo o doce som do plim-plim!
A roubalheira não pára por aí. O art. 3º da resolução nº 556 diz no § 3º que “A partir de 1º de outubro de 2015, os proprietários de automóveis, utilitários, camionetas (N.d.E: peruas), caminhonetes (N.d.E.: picapes) e triciclos de cabine fechada, que optarem pela utilização (N.d.E.: de novo a besteira de usar, utilizar o extintor) do extintor de incêndio, deverão utilizar extintores de incêndio com carga de pó ABC.”
O meu raciocínio cartesiano é: “Se ter extintor no carro é não obrigatório, uso até extintor a urina se quiser”. Brincadeira à parte, o Contran está obrigando a se ter determinado tipo de extintor mesmo quando este não é obrigatório. Cheira ou não a caixinha, obrigado?
Isso sem contar a farra de fabricantes e varejistas de extintores praticando a inquestionável extorsão em vista da entrada em vigor da obrigatoriedade do tipo ABC. Alguém precisa ser indiciado por esse crime contra a economia popular.
São fatos como esse que desanimam. A autoridade, que devia dar o exemplo de normatizar corretamente, o faz de maneira torta e equivocada. Como a presidente da nação, que vem dizendo a semana toda na mídia que impeachment é golpe, na tentativa de conseguir simpatia e oposição dos “bolsistas-de-qualquer-coisa” a um ato perfeitamente normal nos regimes democráticos. Onde está o Ministério Público Federal? Onde estava o MPF quando o molusco nove-dedos, presidente, disse publicamente em dezembro de 2007 que quem era contra a CPMF era sonegador? Ali já deveria ter sido impedido de continuar no cargo por falta de decoro.
A coisa está mesmo feia, muito feia.
BS
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