Os motores de corrida são os responsáveis pela maior parte do desenvolvimento de engenharia automobilística que se vê em competições. Hoje em dia a aerodinâmica também é um destaque e requer um conhecimento gigantesco para se ter bons resultados, mas quando falamos em motores temos que lembrar que por si só são como criaturas completas com vida própria. Eles respiram, se alimentam, fazem grandes esforços e aquecem, e se não forem bem cuidados, vão ter problemas e acabar com qualquer esperança de uma equipe inteira.
Ao longo dos anos, a disputa entre motores grandes e pequenos marcou gerações de pilotos e carros, como a briga entre Davi e Golias. Motores grandes são pesados mas tendem a durar mais, pois são mais resistentes e trabalham com mais folga. Podem gerar mais potência, mas o peso extra e tamanho ocupado são sempre dificuldades que os projetistas precisam equilibrar com o resto do carro. Os motores menores economizam peso e espaço no carro, mas para terem potência equivalente, são bem mais solicitados, precisam de refinamento e sofisticação e sofrem mais.
Há vários caminhos a seguir, sem uma regra entre qual opção é melhor, tudo depende do projeto e do equilíbrio com o carro como um todo. Um exemplo é a história do Jaguar V12 Grupo-C que, mesmo antiquado se comparado com o então moderno V-6 turbo, se destacou e venceu Le Mans.
Os pequenos motores atraem olhares justamente pelo refinamento e pela “ousadia” de disputar de igual para igual com motores até quatro ou cinco vezes maiores. E, como a história mostra, nem sempre o maiores vencem.
Aqui escolhemos dez motores de corrida com cilindrada até 1 litro que tiveram importância na história do automobilismo. Em alguns casos demos uma pequena arredondada nos que passaram um pouco dos 1.000 cm³, mas tudo bem, é por uma boa causa histórica.
MG 6-cilindros “K” superalimentado
A Morris Garages é famosa pelos seus carros esporte de pequeno porte, como o MG TC e o MG TD, conhecido no Brasil pelos mais velhos e também pela simpática réplica feita pela Lafer, o MP. Os modelos ingleses representavam de forma bem objetiva a forma de como os carros esporte tinham que ser: pequenos, leves e ágeis.
Nos anos 1930, a MG já disputava campeonatos pela Europa de forma competitiva, mostrando que seus produtos eram capazes de brigar com os rivais de qualquer lugar. Os carros eram vendidos para competidores independentes que se inscreviam em provas de subida de montanha, de rali, de longa duração e até de velocidade.
Os modelos da família K foram bem-sucedidos na década de 30, com um modelo em especial, o K3. Equipado com um motor de seis cilindros e apenas 1 litro, o K3 conseguiu vencer na categoria até 1.100 cm³ na Mille Miglia de 1933 e também na sua categoria em Le Mans em 1934, sendo o quatro colocado na classificação geral. O italiano Tazio Nuvolari venceu o Tourist Trophy inglês de 1933 pilotando um K3.
O motor era moderno para a época, com comando no cabeçote, que era de fluxo cruzado, carburadores SU e compressor Powerplus, que ficava montado na frente do motor, abaixo do radiador. Este compressor era composto de lâminas internas que giravam como a roda de um antigo barco a vapor “empurrando” a água para trás, mas no caso, empurrava o ar para dentro do motor. O bloco do motor era de ferro fundido, resistente para suportar as cargas geradas pela potência perto dos 132 cv conseguidas pelo compressor.
O motor K foi usado também em carros de recorde de velocidade, um deles chegando a mais de 325 km/h numa Autobahn em 1939, pilotado por Goldie Gardner.
Porsche boxer 4-cilindros
A genialidade de Ferdinand Porsche está escrita para sempre na história do automóvel, não somente pela fábrica que leva seu nome, mas por todos os trabalhos que fez desde os maiores carros de corrida do começo do século, até a criação do Volkswagen.
A longa e vitoriosa história da Porsche nas pistas começou em 1948 com um pequeno motor de quatro cilindros contrapostos de pouco mais de 1 litro (1.086 cm³), praticamente igual ao dos VW da época, com carcaça de magnésio e os cilindros em ferro fundido aletado. Montado no primeiro chassi da Porsche, conhecido apenas como 356/1, tinha o motor central-traseiro o sobrinho de Ferdinand Porsche chamado Herbert Kaes correu e venceu a primeira corrida na Áustria depois da Segunda Guerra Mundial.
O sucesso da Porsche nas pistas foi reconhecido na 24 Horas de Le Mans em 1951, quando o primeiro Porsche correu na tradicional prova de longa duração. O pequeno 356 SL de alumínio equipado com o motor de 1.086 cm³ montado na traseira venceu sua corrida de estreia na categoria até 1.100 cm³. O arrefecimento a ar não era novidade, mas era bem explorada no 356, de comando na carcaça e o acionamento das válvulas por varetas e balancins (pushrod).
Na época haviam diversos competidores com mais experiência na categoria e mesmo assim o 356 SL conseguiu se destacar e vencer os rivais. A potência do motor era algo em torno 60 cv, bem mais que os convencionais 25 cv do irmão VW de 1.131 cm³. No ano seguinte, novamente o 356 SL vence na categoria e consegue ser o 11º colocado na classificação geral, mostrando ao mundo que veio para ficar.
Com o sucesso do carro e do motor, ambos muito resistentes, as variações surgiram ao longo dos anos, como o 550 Spyder e seu motor de 1,5 litro (1.488 cm³) e como dizem, o resto é história.
Panhard Boxer 2-cilindros
A francesa Panhard é uma das marcas mais inovadoras da história do automóvel, com suas atividades iniciada ainda no século 19. Até mesmo o conceito de arquitetura veicular moderna veio dela, chamado Sistema Panhard, onde o carro tinha um motor dianteiro longitudinal, transmissão acoplada ao motor, cardã e tração traseira, conceito que foi unânime durante décadas.
Como não poderia ser diferente, a Panhard entrou no mundo das competições e trouxe suas inovações para as pistas. Uma delas foi o motor de dois cilindros contrapostos e 745 cm³ de cilindrada que competiu nos anos 1950 e 1960, especialmente em Le Mans, como equipe e também como fornecedor de motor para os carros DB, de Charles Deutsch e Charles Bonnet.
O pequeno boxer competia contra outros carros na categoria até 750 cm³ e posteriormente até 1.200 cm³, mas sua construção peculiar e soluções pouco convencionais chamavam a atenção. A eficiência era o foco da Panhard, assim tudo o que fosse possível ser feito para ser mais eficiente era aplicado nos carros de corrida. O mesmo valia para os carros da DB.
Bons resultados cercaram os motores da Panhard, principalmente com a DB, como um décimo lugar na classificação geral em 1954. O mais curioso e arrojado modelo foi o Panhard CD LM64. Era carro feito sobre um chassi do Panhard CD modificado por Deutsch e com uma carroceria aerodinâmica de alta eficiência e baixíssimo arrasto.
Na época em que o LM64 foi criado, não era mais permitido carros com motores de cilindrada inferior a 1.000 cm³ em Le Mans por conta de segurança (a diferença de velocidade para os carros mais rápidos era muito grande). A solução foi utilizar o boxer de dois cilindros aumentado para 850 cm³ e dotado de compressor. Quando um motor era superalimentado, sua cilindrada era multiplicada por um fator de 1,4 para estabelecer uma equivalência com os motores aspirados para fins de enquadramento nas classes de cilindrada. Assim, o LM64 seria equivalente a um motor 1.187 cm³ e competiria na classe até 1.200 cm³.
Os dois carros inscritos não terminaram a corrida, mas conseguiram chamar a atenção de todos, pois mesmo com um motor de apenas 83 cv conseguia chegar a 230 km/h. Um verdadeiro guerreiro em meio aos gigantes de seu tempo.
Climax FWA 1956
A empresa inglesa Coventry Climax existe desde o começo do século passado, fornecendo motores para diversas aplicações, desde uso militar até o automobilístico. Já nos anos 1950, a empresa criou o motor FW (Feather Weight, ou Peso Pena) para uso em bombas d’água portáteis para o corpo de bombeiros do Reino Unido.
O pequeno motor de quatro cilindros em linha feito em alumínio e com comando no cabeçote logo chamou a atenção das equipes de corrida por conta do baixo peso. John Cooper, Colin Chapman e Cyril Kieft mostraram grande interesse no FW, o que fez a Coventry avaliar a opção de usar este motor em um carro de corrida. A versão FWA (Feather Weight for Automotive, ou Peso Pena Automobilístico) foi criada adaptando o FW para uso em carros de corrida.
Como o FW foi criado para ser um motor de uso quase estacionário e em situações críticas, o projeto contemplava que ele deveria suportar horas de uso no limite com aceleração máxima. Esta premissa já garantia um ótimo fator de durabilidade, que é primordial para um bom motor de corrida.
Na 24 Horas de Le Mans de 1954, um dos carros da equipe de Kieft foi equipado com o novo FWA de 1.098 cm³. Foi a primeira aparição do Climax FWA nas pistas mas não foi muito bem sucedida, pois o motor quebrou. Nos anos seguintes, equipes como a Cooper e Lotus usaram o FWA em seus carros, com um bom resultado na corrida de 1956 onde o Lotus XI chegou em sétimo lugar na classificação geral e venceu a categoria para carros com motor até 1.100 cm³, e ainda o carro da Cooper chegou em oitavo na geral e segundo na categoria. Era a comprovação de que o Peso Pena de alumínio era ótimo para competições.
O FWA evoluiu para variações de maior cilindrada, sendo a base para diversos motores da Climax usados em muitos carros e categorias diferentes, até na F-2 e depois na F-1. Foi um marco do automobilismo inglês.
Morris Série A 1964
A Morris, fábrica inglesa de longa tradição, ficou conhecida mundialmente pelo seu modelo Mini. Compacto, prático e simpático, o pequeno Mini era um sucesso tanto no mundo automobilístico quanto cultural. Era o Fusca do Reino Unido.
Criado por Alec Issigonis, o Mini tinha a missão de ser o carro popular da BMC (British Motor Corporation), empresa que nasceu da junção da Morris com a Austin. Com seu pequeno motor dianteiro transversal (chamado Série A) e tração dianteira, o espaço da cabine poderia ser bem aproveitado para bagagem e os ocupantes, além de ser barato de fabricar e econômico para os usuários.
As versões mais potentes vieram da parceria da Morris com a Cooper, uma das equipes de corrida mais conhecidas da Inglaterra. John Cooper viu o potencial do pequeno Mini nas competições, por ser bem pequeno e leve, teria boa vantagem sobre os carros maiores. Assim nasceu o Mini Cooper, com suspensão revisada e motor preparado.
O pequeno 4-cilindros tinha um curso dos pistões maior, que elevava a cilindrada de 845 para 997 cm³ e recebia carburação dupla SU, comando e escapamento retrabalhados para chegar a 70 cv. O motor tinha um diâmetro dos cilindros de 70,6 mm e 68,26 mm de curso. O comando era no bloco com acionamento por varetas.
O grande sucesso do Mini Cooper viria no Rali de Monte Carlo de 1964, quando o pequeno Cooper S de apenas 1.071 cm³ e 75 cv venceria a prova, desbancando carros bem mais potentes. O feito se repetiu em 1965 e 1967, e só não foi também em 1966 porque o Mini vencedor foi desclassificado por causa dos faróis auxiliares de longo alcance não estarem com as capas obrigatórias nos trechos não cronometrados.
O Série A perdurou por toda a vida do Mini original e ainda foi usado em muitas outras aplicações na Austin e MG.
Renault Gordini 1,0 L
A francesa Renault é uma das pioneiras marcas na fabricação de automóveis desde o fim do século 19 e acumula um histórico de conquistas considerável no automobilismo. Um dos maiores sucessos da empresa veio da parceria com a também francesa Gordini, liderada pelo seu fundador, Amédée Gordini, nos anos 1960, quando os pequenos motores de quatro cilindros em linha rivalizavam com os concorrentes ingleses e italianos na Europa em vários cenários.
Utilizando inicialmente como base o motor Sierra, também conhecido como Cléon-Fonte (nome veio da fábrica de Cléon e Fonte, que significa ferro fundido, material do bloco) de 1-litro, equipado com cabeçote de alumínio e comando lateral, a Gordini retrabalhou o cabeçote para ter uma boa câmara de combustão hemisférica, novo comando, ajuste de anéis e taxa de compressão para que o pequeno motor chegasse a 95 cv com 956 cm³. Este motor foi usado em carros como o R5 e no famoso R8, e também nos primeiros Alpines A110, sucessor do Alpine A108 que foi fabricado no Brasil como Willys Interlagos.
Carros pequenos e leves fizeram proveito do motor Gordini em diversas categorias, desde o rali, com vitórias em provas importantes como o Tour de Corse na França e até as provas de carros de turismo. O motor foi fornecido até para equipes terceiras, como a René Bonnet, que tinha seu chassi próprio e comprava motores Gordini para competir.
Um dos grandes sucessos foram as participações nas 24 Horas de Le Mans nos anos 1960 com os modelos Alpine M63, M64 e M65, quando conseguiram vencer na classe até 1.100 cm³ por alguns anos e também conquistar o chamado Índice de Performance, que premiava o carro mais eficiente na corrida. Infelizmente na corrida de 1963, o brasileiro Christian Heins faleceu em um acidente enquanto liderava a categoria, a bordo de um Alpine M63. O pequeno motor evoluiu e teve sua cilindrada aumentada até chegar a 1.397 cm³.
DKW-Vemag 3-cilindros
A Vemag S.A. Veículos e Máquinas Agrícolas, empresa representante da DKW no Brasil, é uma verdadeira lenda no automobilismo brasileiro. Com uma verdadeira equipe de fábrica, a Vemag e seu departamento de competição, liderado por Jorge Lettry, fizeram fama e tiveram muito sucesso nos anos 1960. Lettry contava com o engenheiro Otto Kuetner para o desenvolvimento dos motores e com o mecânico-chefe e meu grande amigo Miguel Crispim, para o acerto dos carros para pista.
O motor dois-tempos de três cilindros da DKW foi preparado para competição na fábrica para aplicação nos sedãs DKW e depois nos GT Malzonis.
O motor de três cilindros era um desenho de 1939, tinha 896 cm³, e estava previsto para estrear no DKW no Salão de Berlim de 1940. Com a eclosão da Segunda Guerra Mundial em 3 de setembro de 1939, a produção da indústria automobilística se voltou ao empenho de guerra e ao término boa parte da indústria ficou na zona de ocupação soviética. A Auto Union, que tinha as marcas Audi, DKW, Horch e Wanderer, desapareceu. Um nova Auto Union foi formada em 1949, modelos desenhados antes da guerra foram relançados, mas o motor de três cilindros só surgiu em 1953. Em 1958 passou a 981 cm³ com aumento do diâmetro dos cilindros de 71 para 74 mm.
Com bloco de ferro fundido e cabeçote de alumínio, desenvolvia 44 cv a 4.500 rpm e 8,5 m·kgf a 2.250 rpm. Tinha apenas sete peças móveis: virabrequim, três bielas e três pistões. Sua ignição era sui generis, individual por cilindros, com três platinados e três bobinas. Tinha um carburador Solex de 40 mm.
O desenvolvimento para competição na Vemag foi grande e com o carburador original modificado chegava a 75~78 cv. As mudanças consistiram, basicamente, em alterar os tempos de admissão e escapamento por retrabalho nas janelas do bloco, elevar bastante a taxa de compressão e aplicar um escapamento calculado reter a mistura ar-combustível numa faixa de rotação mais alta, de onde vinha a potência.
Outro estágio de preparação era aplicar três carburadores horizontais, o Weber DCOE 45 ou o Solex 44 PHH (eliminando um dos corpos de um deles para ficar carburação individual). E havia o motor de 1.089 cm³, pelo aumento do diâmetro dos cilindros para 78 mm. Esse foi o mais potente de todos, 105 cv a 6.800 rpm e 11,7 m·kgf a 5.500 rpm.
Eram motores críticos, requeriam óleo de base vegetal — óleo de rícino, o de maior oleosidade até então — o Castro R40. O ponto nevrálgico eram os pistões devido à elevada carga térmica, pois era uma combustão por cilindro a cada volta do virabrequim — a cada duas nos motores quatro-tempos.
O berro desse motores nas pistas era algo admirável, do qual muitos têm saudade.
No final de sua existência, o departamento de competições da Vemag criou um carro de recorde de velocidade, ao qual deu o nome de “Carcará”, que consistia de uma carroceria aerodinâmica sobre um chassi de Fórmula Júnior, com esse motor de 1.089 cm³ em posição central-traseira. No final de junho de 1966 atingiu a velocidade média de 212,903 km/h num trecho reto da rodovia Rio-Santos, em Jacarepaguá, no Rio de Janeiro, hoje a populosa avenida das Américas.
Fiat-Abarth Bialbero
O austríaco mais italiano que passou pelo mundo do automobilismo, Carlo Abarth, foi o grande nome que empurrou para o sucesso a maior parte dos carros de corrida da Itália desde os anos 1950. Lancias, Fiats, Simcas e até Porsches foram preparados pela Abarth, além de seus carros próprios fabricados.
Talvez um de seus maiores projetos foram os motores feitos para a Fiat com base no bloco tipo “D” de quatro cilindros em ferro fundido e comando no bloco. Diversas versões vieram da Abarth, desde as 500 cm³ até os 1.000 cm³. Com estes motores os pequenos Fiat disputaram (e venceram) muitos campeonatos de turismo na Itália e na Europa.
O engenheiro italiano Gioacchino Colombo, pai do motor “Colombo” V-12 da Ferrari, projetou um cabeçote hemisférico em alumínio de duplo comando para os Abarths. Estes eram chamados de Bialbero (biárvore), palavra que representa o “duplo comando” para os italianos. Para se ter uma ideia de como estes motores eram especiais, o pequeno 750 cm³ gerava 85 cv perto de 8.000 rpm.
Os Fiat 600 modificados pela Abarth eram exatamente como esperamos que seja um carro italiano preparado. Chamativo e diferente. A tampa traseira que cobria o motor nem fechava.
Pessoalmente acho o uso destes motores Abarth na busca por recordes de velocidade uma de suas aplicações mais nobres. Juntamente com a Pininfarina, a Abarth produziu alguns modelos streamline (carrocerias especiais para alta velocidade) equipados com seus os pequenos motores 500, 750 e 1000.
Um dos carros mais famosos foi o apelidado de La Principessa (A Princesa em italiano) de 1960. Com o motor de 982 cm³, cabeçote duplo comando “Colombo” e 112 cv de potência, chegou aos 220 km/h.
Mazda 10A (1968)
Quando Felix Wankel criou o conceito do motor com pistão rotativo nos anos 1920, não poderia imaginar que um dia uma legião de fãs seguiria de coração uma fábrica japonesa de automóveis com modelos equipados com sua criação. Não imaginaria também que seria o motor que estava no único carro japonês a vencer a 24 Horas de Le Mans.
O começo da saga da Mazda nas competições com o motor Wankel começou no fim dos anos 1960, quando o pequeno Cosmo disputaria a temida 84 Horas de Nürburgring que já contamos aqui no AE no passado. O pequeno motor 10A de dois rotores e 982 cm³ era capaz de gerar perto dos 150 cv, mas limitado a 135 cv para a maratona de 84 horas. Conseguiu chegar em quarto lugar, um sucesso incrível para a Mazda e para o motor Wankel.
A trajetória em Le Mans começou em 1970, quando a equipe belga Levi’s International Racing, patrocinada pela marca de calças jeans, correu com um Chevron B16 equipado com o 10A Wankel preparados para chegar a 200 cv. Foi um carro de destaque no grid, pois era uma tecnologia nova em Le Mans, mas infelizmente o motor não aguentou e quebrou no começo da corrida.
De qualquer forma, o Wankel mostrou-se competitivo e capaz de gerar potência suficiente para brigar com os motores a pistão de movimento recíproco. Era uma questão de tempo para que a durabilidade fosse trabalhada e o Wankel pudesse disputar vitórias. Em Le Mans, este tempo demorou exatos 21 anos, quando o 787B venceu em 1991 e fez história, tanto para o motor como para a marca, a única japonesa a vencer até hoje.
Ducati Desmosedici
Acredito que nos dias atuais, os motores mais sofisticados que ainda não passaram pelo processo de “hibridização” são os das motos de corrida. Eles ainda resistem bravamente como puras unidades de combustão interna.
A Moto GP, principal categoria das motovelocidade, passou por algumas fases onde as especificações dos motores mudaram. Nos anos 1980 e 1990, as motos mais rápidas corriam com motores de até 500 cm³, depois passaram para 990 cm³, voltaram para 800 cm³ e hoje estão nos 1.000 cm³, unicamente com ciclo Otto, de quatro tempos.
A Ducati, empresa italiana muito tradicional, competiu por muito tempo até uma parada nos anos 1970 , voltando à ativa em 2002. A tecnologia de seu motor atual, o Desmosedici GP17, carrega o legado histórico da marca, o sistema desmodrômico de comando de válvulas.
Criado no começo do século 20, os motores equipados com este sistema não utilizam molas para fazer o retorno das válvulas do cabeçote para a posição fechada. A atuação é puramente mecânica, com um sistema de braços que puxam as válvulas para cima, como se fosse um outro comando trabalhando ao contrário. Isso permite que as válvulas sigam sempre o movimento definido pelo perfil do comando, sem a chamada flutuação, que é o efeito da mola não conseguir trazer a válvula de volta com a velocidade necessária, nas rotações mais altas.
Hoje o motor da Ducati de corrida é um V-4 a 90° de 1.000 cm³, duplo comando desmodrômico de dezesseis válvulas, capaz de gerar aproximadamente 265 cv a 18.000 rpm.
A Honda e a Yamaha tiveram mais vitórias e campeonatos conquistados na disputa do mundial de motovelocidade, utilizando tecnologias diferentes como atuação pneumática de válvulas similar à usada na F-1, mas cito a Ducati como referência.
MB