Bajas, e suas cópias, são comuns em qualquer lugar onde apaixonados por off-road e pilotos de deserto se reúnem hoje em dia. Mas nem sempre foi assim. A criação do primeiro exemplar surgiu meio por de necessidade, como vamos ver nesta história.
Em 1967, Gary Emory queria construir um buggy Meyers Manx, mas não conseguiu reunir dinheiro para um kit. Gary era gerente assistente de peças da Chick Iverson, concessionária Volkswagen em Newport Beach, Califórnia. Ele tinha acesso a peças e informações para construir um buggy, mas também tinha esposa e duas filhas pequenas, então o desembolso inicial de dinheiro para construir um buggy estava fora de questão.
Para superar o problema, Gary trocou uma Suzuki de 80 cm³ por um VW Fusca 1957 maltratado com teto solar e construiu seu próprio carro para andar nas dunas seguindo um projeto original. Ele teve uma ajuda de primeiríssima em seu projeto porque seu pai, Neil, era gerente da oficina e seu irmão Don era encarregado de oficina de pintura — ambos, também na Iverson’s.
A história de personalização de carros da família Emory abrange três gerações, começando com Neil Emory então na Valley Custom Shop, de Burbank, CA em 1948. A Valley Custom Shop criou alguns dos carros mais venerados da época por causa do senso de proporção e modificação de bom gosto, dando aos carros americanos customizados o brilho de que necessitavam desesperadamente.
Até o SoCal Streamliner, que bateu recordes de velocidade em terra em Bonneville, teve sua carroceria estilizada e fabricada pela Valley Custom Shop.
O Fusca 57 foi completamente desmontado e decapado até o metal. O interior foi depenado. Os vidros e seus mecanismos de elevação foram removidos. A “Ted’s Aircraft Interiors” de Santa Ana, CA, fez a tapeçaria revestindo os bancos originais com vinil preto e construindo janelas laterais de vinil transparente fixadas à carroceria por travas com borboletas (como em capotas de jipes). Elas se encaixavam nas portas nas molduras que envolviam os vidros para cobrir as janelas que ficaram abertas devido ao fato de os vidros terem sido removidos. Isso economizou algum peso e permite uma experiência ao ar livre, se desejado.
Enquanto isso, papai Neil estava trabalhando nos para-lamas, capô e tampa traseira.
A frente do Fusca foi cortada e os para-lamas foram recortados acompanhando o estilo. Como altas velocidades não faziam parte dos planos e com a gasolina custando 30 centavos de dólar o galão (3,785 litros), a aerodinâmica não foi considerada no planejamento da frente do “Fusca Baja”. O que foi considerado foi a diminuição de peso, um avanço mínimo do bico da carroceria, restando material suficiente para manter a sujeira levantada pelo carro do lado de fora.
Depois de atacar as extremidades dianteira e traseira (os estribos foram eliminados também), dois para-lamas dianteiros foram retrabalhados para se tornarem para-lamas traseiros. Um dianteiro direito foi usado na traseira esquerda e um dianteiro esquerdo na traseira direita. Isso permitiu um para-lama resultante mais largo para liberar espaço para os pneus grandes que Gary queria instalar e permitiu uma melhor combinação de estilo entre os para-lamas dianteiro e traseiro.
O cordão que aparece nas bordas externas de todos os quatro para-lamas foi fabricado usando-se dois arames de 5/32 de polegada justapostos que foram soldados às bordas dos para-lamas e esmerilhados para fornecer uma superfície acabada. Um pouco de estanho na carroceria foi usado para suavizar tudo. Além do valor estético, o arame acrescentou resistência e rigidez aos para-lamas.
Como o carro era para ser usado para passeios familiares no deserto, a confiabilidade completa era uma das principais considerações. O motor era normal, mas consistia em uma carcaça de 1500 com cilindros e pistões de 1600, e cabeçotes de entrada única. As principais alterações são os coletores de escapamento e as duas ponteiras diretas, sem silenciador, inclinadas para cima.
A maior distância ao solo foi obtida cortando os suportes das barras de torção dianteiras e girando-os de forma que os braços arrastados pendessem em um ângulo, em vez de na horizontal. Na parte traseira foi instalada uma transmissão de uma VW Kombi ano 1967 com seu conjunto de caixas de redução nas rodas. Os pneus Gated XT Commando — 7,35-15 dianteiros, 10.00-15 traseiros — foram montados em rodas de liga leve Ansen Sprint (na verdade, foi o primeiro conjunto de rodas desta série vindo da empresa de Ansen).
Depois que Gary e Neil fizeram seu trabalho, o irmão Don pintou de amarelo cromado (chrome yellow em inglês— uma tonalidade muito em voga nos anos 60). Uma homenagem à habilidade de pintor do Don é saber que o carro ainda possuía em 1981 a pintura original na carroceria e apenas os quatro para-lamas foram repintados, lembrando que o carro foi montado em 1967.
Quando o carro foi concluído, atraiu mais atenção do que qualquer um dos Emory’s esperava. A agência de publicidade da Volkswagen, a Doyle Dane Bernbach (DDB), o usou em um anúncio da Volkswagen intitulado “Nada é sagrado”? O anúncio apareceu na Time, na Life e em outdoors:
A coluna de texto da esquerda diz o seguinte:
Aqui estamos escravizando há 25 anos, melhorando as entranhas do Volkswagen e deixando o exterior cuidar de si mesmo.
Tornou-se um clássico em seu próprio tempo.
E agora- boom! As pessoas estão tentando nos mostrar como deve ser feito.
“Por quê?”, Perguntamos.
“Desse modo vai ficar tão bom quanto realmente é.”
OK, talvez eles tenham razão.
Depois desta introdução um tanto animista — quem tem entranhas é um ser vivo, que dá o contexto em si do uso da imagem deste Baja, a propaganda segue com detalhes técnicos do Fusca.
Desde 1967, o carro teve dois motores, uma dianteira diferente, e recebeu um novo sistema de escapamento. Também teve um novo proprietário, ou melhor, proprietária. Não muito tempo depois de o carro ser concluído, a filha de Gary, Shelly, então com oito anos, disse ao pai que o queria. Gary disse que tudo bem e que quando ela tivesse idade suficiente, poderia ficar com ele.
Bem… Shelly cresceu, se casou, teve um filho, e lembrou ao pai que ele lhe havia prometido o carro. Dito e feito. Rick e Shelly Lugo são os novos proprietários do Baja Beetle Bug original.
Depois deste “Baja Bug” inicial, ainda feito totalmente em chapa, surgiram muitos kits em compósito reforçado com fibra de vidro para a conversão de Fuscas em Bajas e as coisas foram evoluindo. E Fuscas ainda participam de competições off-road na Baja Califórnia, isto em várias categorias. Algumas bem restritivas com poucas modificações aceitas e outras meio malucas em um estilo “força livre”.
Eu escrevi uma matéria sobre a participação de Fuscas nestas corridas: FUSCA 1970 NA 50ª BAJA 1000 . Mas existem, no outro extremo, Fuscas como o “Baja Bandito” equipado com um suporte na traseira que aloja um motor Honda J35a V-6 VTEC com uma caixa de câmbio Mendola 4-marchas, como mostra a foto abaixo:
Para os que ficaram com curiosidade para ver como este furioso descendente do modesto Fusca Baja do Gary anda ai vai um vídeo (01:38):
Aqui no Brasil tivemos várias empresas que forneciam kits de conversão para Baja, uma delas do amigo Carlos Menon, já falecido, que afirmava ter convertido mais do 8.000 Fuscas para Baja.
A sugestão para tratar deste assunto foi do amigo Fernando Fuhrken, a quem agradeço também pelo aporte de material.
AG
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