Apesar de ambos serem produzidos por indústrias oriundas dos EUA, no caso General Motors e Ford, Opala e Maverick travaram boas lutas nos anos 1970. O interessante é que, apesar da origem americana de suas indústrias, os dois carros pertenciam a escolas completamente distintas: O Opala era oriundo da alemã Opel e, portanto, tinha conceitos europeus, enquanto o Maverick era um produto tipicamente da terra de Tio Sam, desde concepção até mecânica. Por aí, podemos ver que a guerra mercadológica existente entre esses dois produtos mostrou a preferência do consumidor brasileiro por qual escola se identificava mais.
O Opala, lançado no Brasil no Salão de 1968, era o Opel Rekord, C que, aqui foi produzido na versão sedã de quatro portas. Nosso Opala cupê chegaria apenas em setembro de 1971. Ao contrário do Rekord original alemão, que possuía um pequeno e fracote motor 1,7 de 75 cv, a versão, criada pela GM do Brasil, mesclava a mecânica utilizada pelo Chevrolet Impala nos EUA Isso significava motores de 4 ou 6 cilindros em linha — o 2500 e o 3800 —, alimentados por um carburador de corpo simples no início, sendo que o seis- cilindros passou de 3.8 para 4.1 litros (de 230 para 250 polegadas cúbicas) em 1970, ano da chegada da versão SS. de quatro portas, motor 4,1-litros (4100) concomitante com a introdução do câmbio de quatro marchas com alavanca no assoalho, até então exclusivamente de três marchas com alavanca na coluna de direção em todos os Opalas.
Opala unia o elogiado estilo europeu com a robustez da mecânica americana. Aqui, na foto, a versão esportiva SS (Foto: Heitor Hui/Quatro Rodas)Curiosamente, o Opala era uma miscelânea em termos de medidas. A carroceria monobloco herdada da Alemanha, juntamente com suspensão e sistema de direção, era toda no padrão métrico, enquanto motor, câmbio, cardã e eixo traseiro, emprestados do americano Chevrolet Impala tinha todas as suas medidas em polegadas., Isso exigia que o mecânico que fosse mexer num Opala precisaria contar com jogos de ferramenta distintos, um em milímetros,, outro em polegadas de acordo com o que ele fosse consertar. O padrão métrico em todo o veículo só seria adotado mais tarde, no ano-modelo 1975.
Esse detalhe à parte, o Opala, nome que alguns dizem ser uma referência a uma pedra semipreciosa aqui do Brasil e outros associam a uma fusão de Opel e Impala, tinha seus méritos. Com suspensão dianteira de braços superpostos — inferior simples com tensor de localização e superior triangular — e molas helicoidais, tinha uma direção com caixa setor e sem-fim com esferas recirculantes, bastante precisa, e contribuía também para a boa dinâmica a suspensão traseira que, apesar do eixo rígido, tinha molas helicoidais com quatro barras de localização longitudinal (duas superiores e duas inferiores) e uma de localização transversal (barra Panhard).
Nos primórdios do Opala, existia até mesmo uma lenda: a de que a dinâmica do carro melhorava quando se colocava um saco de areia no porta-malas, que, nesse caso, “assentava” mais a traseira, não deixando que o veículo balançasse muito. Na realidade, em meados dos anos 70, depois de seguidos ajustes nas molas, amortecedores e barras antirrolagem, essa característica da traseira instável foi desaparecendo. Com o passar dos anos, o Chevrolet foi se tornando mais estável e comportado ao volante.
Já mais próximo dos anos 1980, quando já utilizava a versão esportiva do seis cilindros, a famosa 250-S, o Opala já era bem mais equilibrado do que as primeiras versões lá de 1968. Sem contar que o banco dianteiro inteiriço dava lugar para bancos individuais, com a alavanca de câmbio já no assoalho. Era algo bem mais evoluído e moderno.
O Maverick já era um projeto mais novo: chegou em 1969 nos EUA e em junho de 1973 no Brasil. Nas terras de Tio Sam, ele era uma opção mais em conta do Mustang, e era o carro de entrada da Ford por lá. Apesar da sua vida difícil nos EUA, onde não foi tão bem aceito, o “Mavericão” acabou sendo uma boa opção para concorrer com o Opala por aqui, que, àquela altura não tinha rivais diretos.
Só que o Ford tinha alguns problemas em sua versão cupê de lançamento: o entre-eixos demasiadamente curto (2.616 mm) limitava muito o espaço do banco traseiro, que quase inexistia. Sem contar que a suspensão traseira era a clássica e simples Hotchkiss de eixo rígido com feixes de molas longitudinais, insuficientes para manter o eixo perfeitamente localizado lateralmente, inadequada para curvas feitas em alta velocidade. Além disso, seu fraco e antigo motor de seis cilindros em linha de 3.016 cm³ (112 cv potência bruta) era oriundo dos Jeep Willys do final dos anos 1950 e depois do Aero-Willys Itamaraty, com as válvulas de admissão no cabeçote e as de escapamento ainda no bloco. Era uma construção que não se via mais fazia tempo.
O motor tinha taxa de compressão (7,7:1) limitada por causa das grandes câmaras de combustão e baixo rendimento termodinâmico, o que resultava em alto consumo de combustível e pouca potência e torque. Ou seja, consumia muito e andava pouco. Esse baixo desempenho do motor de seis cilindros fez com que a Ford acelerasse o projeto do 2,3-litros de quatro cilindros com comando de válvulas no cabeçote (99 cv potência líquida), esse sim moderno e eficiente, enquanto alguns consumidores preferiam as versões V-8 5-litros (135 cv potência líquida) que, apesar de mais caras, proporcionavam desempenho nitidamente superior.
Vale lembrar que os Maverick quatro-portas, lançados alguns meses depois do cupê, ainda em 1973, tinha distância entre eixos maior (2.667 mm), com espaço no banco traseiro bem maior e adequado. Com isso, os Maverick de quatro portas ficaram com aparência desproporcional se comparados aos 2-portas, que eram bem mais elegantes e desenho atraente.
Nas versões esportivas, Opala SS e Maverick GT, as brigas eram ferozes nas pistas, principalmente nas provas de longa duração, quando o motor V-8 de configuração quadrijet (180 cv potência líquida) consumia mais, obrigando mais paradas para reabastecimento, enquanto os Opala 250-S (seis em linha, 153 cv potência líquida) consumiam menos. Por isso, quanto mais voltas, melhores os resultados para o Chevrolet.
Em contrapartida, em provas mais curtas, de três ou seis horas, os Maverick V-8 eram muito mais velozes que os Opala, e era difícil de batê-los. Mesmo com os seguidos problemas de freio traseiro e suspensão traseira simplória, o Ford saía na frente com seu potente V-8, deixando para trás os Opala 250-S, que tinham 27 cv a menos de potência máxima.
Vale esclarecer que o regulamento técnico da época autorizava a troca da caixa de direção por outra de mesmo tipo, do que a Ford se aproveitava para utilizar a caixa de direção com assistência hidráulica (com esta removida), bem ,menos desmultiplicada do que a normal sem assistência. Esta era inviável para uso em pista pelo grande número de voltas do volante entre batentes, quase 6 voltas. que com a troca caía para pouco mais de 3.
Mas, como méritos do Chevrolet, além das suspensões mais equilibradas, com molas helicoidais nos dois eixos, tinha um melhor equilíbrio da carroceria, exigindo menos dos seus pilotos. Como a voz do povo é a voz de Deus, como dizem, presume-se que quem ganha é quem ficou mais tempo no mercado, com maior aclamação do consumidor e melhor “conjunto da obra”. Nesse caso, uma vitória indiscutível para o Opala, oferecido ao consumidor por nada menos que 24 anos (saiu de linha apenas em 1992), enquanto o Maverick não chegou a ficar por seis anos consecutivos no nosso mercado. Mas lá nos anos 1970, foi uma briga parelha de verdadeiros titãs.
DM
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